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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

A malta é bué jovem, pá.

Publicado na edição de hoje (15.05.2008) do Diário de Aveiro.

Crónicas dos Arcos
A malta é bué jovem, pá.


O Presidente da República reuniu, na passada segunda-feira, com algumas organizações políticas de jovens (os chamados “jotas”) com o propósito de analisar o afastamento dos jovens em relação à vida (militância e empenho) partidária e às “cousas” políticas. Digo algumas, porque de fora ficou, por exemplo, o Bloco de Esquerda.
Independentemente das razões de sentimento de exclusão (diga-se de passagem que, em outros momentos - por exemplo, na tomada de posse do Presidente da República - o mesmo BE também se auto-excluiu ou, se quisermos, “excluiu” o próprio Presidente da República… coerências!), há, no entanto, um pormenor com o qual tenho que concordar com os “bloquistas”: para quê uma estrutura “jota” no interior dos partidos políticos, se a questão da política é, hoje, uma realidade global e abrangente, nos mais diversos sectores sociais, económicos e culturais?
O problema do emprego é estruturante; o problema do trabalho precário (embora mais incidente nos “jovens”) é generalizado; os custos com a habitação, tanto se colocam no caso dos arrendamentos, como nos elevados encargos com o crédito; o endividamento familiar tem implicações com todas as idades; a saúde, o ambiente e a segurança são realidades que tocam e respeitam a todos.
Para além disso, há, em determinadas particularidades (como por exemplo o ensino - e, mesmo este, já com algumas excepções), a existência de organismos e associações próprias: as associações de estudantes, as academias e as federações.
Até porque este conceito de ser ou não ser jovem, é uma invenção social e política recente (meados do século XX). Anteriormente, ou se era menor ou maior (sénior = senhor) de idade. No entanto, fruto da evolução(?) das sociedades, do aumento da competição social, da primazia do individual sobre o colectivo, foi criada a necessidade de “premiar a experiência da vida” (como se não andássemos sempre a aprender ou como se, pelo simples facto de se ser mais velho, isso justifique - por si só - o que quer que seja). E assim, se tornou também justificável que, pela nova ordem social da vida, os mais “jovens” tenham sempre que esperar pelos lugares que os “adultos” (menos jovens) forem deixando vagos. É por isso que na sociedade portuguesa não existe uma referência de relevo (em distintas áreas) sem se ter atingido uma “determinada” idade (vejam-se algumas argumentações - idade - na “luta” interna do PSD - entre Manuela Ferreira Leite e Pedro Passos Coelho).
E é, assim, neste sentido que a acção do Presidente da República está invertida. O problema do afastamento em relação à política, não é dos jovens. É de todos os cidadãos (ou da sua maioria) que há muito deixam de confiar nela (são os casos de corrupção, dos jogos de interesses, da credibilidade das palavras e das acções, do absentismo parlamentar, etc.). E isto não é exclusivo de uma idade específica (aliás o estudo da Universidade Católica revela os mesmos sintomas em cidadãos acima dos 60 anos). É um problema ético, deontológico e de responsabilidade social da própria classe política.
Até porque, ao contrário da imagem que se tem tentado transmitir, os tais ditos “jovens” têm sabido criar mecanismos de intervenção e posicionamento social: são as empresas inovadoras; são as expressões culturais e, nomeadamente, o considerável aumento da sua participação em acções de solidariedade e de voluntariado. E isto é participação cívica e social. O que já não vai acontecendo em camadas etárias que deveriam ter mais responsabilidades.
E mesmo a falta de conhecimentos sobre algumas realidades histórico-políticas, como o 25 de Abril, não deve ser imputado aos jovens. Quem dos “adultos” tem referências ao Maio de 68, à Instauração da República ou a outros marcos da história portuguesa, senão por aquilo que se viu obrigado a aprender no ensino? Quem, vivendo em plena república, tem a noção do que era vive num regime monárquico?
E alguém já questionou se têm existido mecanismos e estratégias para que a história não se vá apagando, pelo tempo, da memória colectiva dos portugueses (sejam eles novos ou velhos)?
Como é possível mentalizar e sensibilizar os jovens para uma realidade que não viveram, se o poder político nem a nossa língua (uma das mais relevantes identidades de um povo) sabe preservar e promover?
E já agora, para terminar e sustentando que os jovens não estão assim tão longe da realidade social e política (têm é a liberdade e o direito de escolheram outras opções), é possível, a partir de segunda-feira e até ao dia 11 de Junho, assistir a uma exposição de exemplares censurados na imprensa, antes do 25 de Abril, todos os dias da semana, no ISCIA.
Porque afinal há quem tenha curiosidade e vontade de aprender e conhecer.Assim progride a nação. Assim cresce uma sociedade preocupada.

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