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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Amar a Ria

Publicado na edição de hoje (01.02.07) do Diário de Aveiro.

Post-its e Retratos
A Ria entre o Mar e Serra...

O que torna este património histórico e ambiental, esta identidade cultural e etnográfica e as realidades sociais locais tão especiais?! Porque esta é, excepcionalmente, uma região de exuberantes contrastes.
Entre o Mar e a Serra, a Ria oferece quilómetros e quilómetros de água a perder de vista, entre Vagos e Ovar, passando por Ílhavo, Aveiro, Estarreja e Murtosa. De braço dado com o Mar e até aos primeiros contornos da serra, a Ria de Aveiro oferece-nos uma tela de imensos tons de azul, onde se misturam os “montes” de sal, as velas, o colorido e o pitoresco dos painéis dos moliceiros, as pastagens e os campos agrícolas.
A par deste realidade paisagística, a fazer lembrar qualquer uma das obras primas de Van Gogh ou Velázquez, a Ria de Aveiro devolve-nos uma riqueza ambiental que produz um ecossistema de uma heterogeneidade própria, rico em fauna e flora marinha, numa floresta de pinheiros mansos resinosos, em contornos de imensos bancos de areias e em zonas lagunares arborizados que constituem perfeitos habitats para uma diversidade de aves, das quais se destacam várias raças de patos, as garças e as gaivotas.
E esta Ria dá-nos o espaço e o tempo para vivermos muitos momentos de experiências únicas e invulgares.
A sua íntima ligação com o mar criou uma realidade histórica, cultural e social muito própria de gentes ribeirinhas que encontraram na pesca, no sal e no moliço, no comércio, na azulejaria e na cerâmica, numa gastronomia especial e num sistema agrário e rural sustentados nos imensos areais, nas pastagens, no gado e na produção leiteira, a sua verdadeira identidade regional.
Proporcionando momentos únicos de desporto e lazer aquáticos, a Ria de Aveiro contempla toda uma história e cultura reflectidos numa identidade e património que se podem encontrar nas Casa Típicas da Costa Nova do Prado, no velejar dos Moliceiros desde as costas gafanhoas até às vareiras, na riqueza patrimonial da Arte Nova e da cerâmica em Aveiro, do Museu Marítimo em Ílhavo, da arte piscatória e do moliço em Estarreja e Ovar. A par do Sal, toda uma diversidade agrária, desde Vagos até Ovar contorna um espaço lagunar único.
Mas como o “coração” não vive só da vista, também uma cultura gastronómica por excelência reflecte esta paisagem ribeirinha: os peixes (as caldeiradas de enguias e os mariscos, por exemplo), a doçaria (da qual se destaca o Ovo Mole e o Pão de Ló de Ovar) e fruto das moagens da farinha nos moinhos de água os famosos pães de Ilhavo, de Canelas e de Pardilhó.
Mas esta riqueza natural está protegida? Está valorizada?
Para além da vertente turística, a Ria de Aveiro tem aspectos mais abrangentes, como os aspectos ambientais, a qualidade de vida, a identidade cultural e histórica das localidades ribeirinhas, o próprio desenvolvimento económico e social.
Face a estas realidades e à realidade natural da sua existência porque é a Ria de Aveiro tão desvalorizada e tão esquecida?
Porque não serve para congregar esforços e vontades comuns que tornem a nossa região uma referência turística, cultural, económica e social deste país, cada vez mais carenciado de valores comunitários e desenvolvimentos estruturados e sustentados?
Os projectos existentes, por mais vontades e esforços reconhecidos que envolvam, são acções pontuais, desagregadas de um contexto real que é a extensão da Ria e as suas realidades.
Politicamente, com tantas “guerras” burocráticas e institucionais, a Ria aguarda um “veredito” de adopção que a torne um património real, dignificado, explorado e central para o crescimento e renascimento da região de Aveiro.
Haja vontades. Haja a coragem de assumir esta riqueza.
Esta Ria de Aveiro é rica em arte, cultura, história, paisagem e potencialidades económicas.
Se quem a envolve não cuidar dela, não a sobrevalorizar, não hão-de ser aqueles que estão longe desta vivência que terão o dever de a estimar e desenvolver.
Cabe às entidades regionais e locais, às gentes ribeirinhas amar a Ria.
Antes que a Ria “seque” de tanto esperar.