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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Quem "tevê"...

Publicado na edição de hoje, 12 de dezembro, no Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Quem “tevê”…

Desde o passado mês de novembro que está oficialmente anunciado o final, em dezembro deste ano, do programa diário da RTP2, “Diário da Câmara Clara”.

Desde maio de 2006, há seis anos, que o programa destacava, analisava, reflectia, criava massa crítica sobre a cultura. Permitam-me a correcção… sobre a CULTURA. Sim… “em grande”: literatura/escrita, música, arquitectura, artes plásticas, design, cinema e teatro, mas também a história, a ciência e a inovação. Tudo o que é ideia e arte marcou presença nas edições do programa.

Sem me debruçar, por enquanto, sobre as tormentas que assolam a televisão pública (e o respectivo grupo), seja ao nível da sua estrutura, seja quanto ao seu futuro e sustentabilidade, seja ao nível da sua gestão interna (não só jornalística), a verdade é que muita coisa não vai bem no reino da “caixa mágica”.

Primeiro porque a magia vai sendo cada vez menor e mais fugaz. Há cada vez mais novos desafios comunicacionais de dimensão global e de maior interactividade.

Segundo, são igualmente cada vez mais pressionantes os novos desafios que se colocam à informação, seja pela sua natureza, missão ou sustentabilidade (sim… não é possível fazer jornalismo sem dinheiro).

Por último, a televisão, com maior responsabilidade para a que tem, por natureza, a obrigação da prestação de serviço público, tende preocupantemente a cair na rede da imbecibilidade, do vazio de valores, da “aculturação”, da ficção e no mercantilismo da realidade, na projecção do facilitismo e da “glória efémera”. E isto desvirtua projectos, quebra consistências, aniquila a criação de massa crítica nas comunidades e nos cidadãos.

É certo que nada, nem ninguém, é insubstituível, independentemente do valor profissional que a jornalista Paula Moura Pinheiro (com a devida extensão à sua equipa) tem e sempre demonstrou ter. Inclusive na “hora da despedida” (entenda-se o comunicado a anunciar o fim do programa no final de dezembro de 2012), nem o facto de o programa sofrer qualquer tipo de quebra de qualidade (já agora chama-se a atenção para a edição do próximo dia 16 de dezembro). No entanto, usar, exclusivamente, razões económicas para se terminar com um dos melhores espaços televisivos nacionais (por exemplo, a par com o Sociedade Civil, também na RTP2) é sintomático do valor que hoje se atribui à informação, à programação e à comunicação.

Quando se retomou a discussão da viabilidade da RTP (porque o processo não é, de facto, novo) por mais que uma vez aqui, neste espaço, defendi que o Governo e a Administração tinham uma solução para a redução de custos no canal público: para tal bastava juntar o que de melhor tem a programação da RTP2 com o que de melhor tem a informação na RTP Inf num único canal. O difícil seria, eventualmente, escolher, porque qualidade não falta nas duas grelhas, deixando a RTP1 para a exclusividade da programação generalista.

Mas as várias Administrações e este Governo insistem que a vida e a sociedade gira em torno de folhas de excel, de cálculo financeiro. Infelizmente não percebem que há realidades sociais que não têm preço.

O saber, o valor, a crítica, a qualidade, a cultura e a arte, são valores que não têm preço pela importância e relevância que têm na construção do espaço público e do desenvolvimento das comunidades.

Se a RTP2 pode substituir o “Diário da Câmara Clara”, a jornalista Paula Moura Pinheiro e a sua equipa? Pode… mas não será a mesma coisa.

Nem tudo o que é legítimo é inquestionável.