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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

E brincar?

Publicado na edição de hoje, 28 de abril, do Diário de Aveiro.

Entre a Proa e a Ré

E brincar?

Tem sido recorrente o debate em Aveiro (mesmo que inconsequente) sobre questões relacionadas com urbanismo (ou urbanidades), espaço público, regeneração urbana e dos centros, e mais recentemente sobre mobilidade ou paisagismo e botânica (dendrologia) principalmente quando se discutiu a queda ou abate de várias árvores no concelho. Sobre urbanismo, espaço público, regeneração urbana e do centro da cidade, há matéria em debate que transborda: pontes pedonais, parque da sustentabilidade, arranjo do Alboi, a Rua Direita, o projecto para a Avenida, a revitalização das praças como a do Marquês de Pombal ou a de Melo Freitas, entre outros. Em relação à mobilidade temos as discussões em torno de planos e políticas, dos vários modos de deslocação (automóvel, transporte público, ciclável ou pedonal), a regulação do trânsito e o seu excesso no centro urbano, a ligação da avenida das Agras, os pórticos na A25 e A17 que circundam e isolam a cidade, e mais recentemente toda a polémica relacionada com a regulação e oferta de estacionamento. No que diz respeito à vertente paisagística, depois da rearborização da Avenida e após a tempestade de janeiro último, foram diversas as abordagens públicas sobre as quedas das árvores, a sua substituição, a necessidade ou não de abates, o estado arbóreo do Parque da Cidade, a replantação ou a criação e espaços verdes. Não nos podemos queixar de não termos o que e com quem discutir uma parte significativa da vida da cidade e do concelho. No entanto, salvo uma ou outra rara excepção, tem faltado em Aveiro o debate, e já agora a preocupação, sobre outra realidade social e urbana (de urbanidade): parques infantis. Só assim de relance, sem precisar de recorrer a um grande esforço de memória, perderam-se os do Alboi, Museu Sta. Joana (ou de Aveiro), Parque Infante D. Pedro (onde, para além do parque infantil, poderíamos juntar o circuito de manutenção) e mais recentemente na urbanização da Forca, a título de exemplo.

São inúmeras as questões que se levantam ao nível da qualidade de vida, da saúde e da sociabilização no que se refere às crianças e aos adolescentes: obesidade, destreza, agilidade, isolamento social, aprendizagem, sociabilidade. Ao contrário do que possa parecer, pelo facto das famílias e dos cidadãos terem hoje uma vida demasiadamente agitada e confinada a rotinas, a sociedade é menos urbana, no sentido em que, dispondo de melhores e mais meios, não usufrui dos mesmos, concretamente os espaços de lazer. Mas a própria cidade ao alterar o paradigma das suas urbanidades (espaços públicos, vizinhança, sentido de bairro, a rua, o trânsito) deixou de criar condições para que as crianças usufruam da rua, de actividade física, de autonomia, da descoberta lúdica do jogo, da agilidade, da imaginação. Não basta uns metros quadrados de relva. Não basta para o desenvolvimento mais completo da criança o simples prazer de correr.

Não podemos criticar o aumento da violência entre pares, da problemática crescente do bullying escolar, da indiferença, do isolamento social, da falta de solidariedade, e depois obrigarmos as crianças e os adolescentes a crescerem entre as quatro paredes dos seus quartos, dentro de uma playstation, de um portátil ou de um tablet. E isto não é apenas uma responsabilidade parental ou familiar. É, também, uma questão social, da responsabilidade da sociedade e das cidades: devolver as crianças à rua e aos jardins. E quem diz os parques infantis diz mais. Aprendi, felizmente, a andar de bicicleta, sozinho, na rua onde cresci e no Parque Infante D. Pedro (até proibirem, criminosamente, o acesso de bicicletas àquele espaço). Hoje, face ao trânsito, à insegurança e à ausência de espaço, as crianças têm dificuldade em aprender a andar de bicicleta e a dar-lhe o devido valor (quantos não se recordarão da sua “primeira” bicicleta e do que significou recebê-la como prenda).

Infelizmente, Aveiro cresceu em betão e foi perdendo o sentido da urbanidade e do desenvolvimento social.

Cavaco Silva igual a Cavaco Silva (II)

Só agora mesmo dei de caras com esta informação publicado no Expresso do dia 17 de abril (há cerca de uma semana), com o título «Cavaco defende que Justiça deve evitar que tempos de crise se convertam em "tempos de cólera"».

Em breves palavras o Presidente da República (à data em visita oficial à Colômbia) expressava a sua esperança em que a Justiça não se alheasse da realidade económica e social que Portugal atravessa.

Como a informação complementar, quer por parte de Cavaco Silva, quer pelo jornal, não vai para além destas afirmações, só me resta dar o benefício da dúvida.

E a dúvida é bem simples: para quem solicitou um parecer de inconstitucionalidade de alguns artigos do OE2013 (e viu três deles confirmados pelo Tribunal Constitucional); depois do resultado daquele órgão supremo da justiça portuguesa não só foi inconsequente com a sua posição como, no recente discurso nas comemorações do 39º aniversário do 25 abril de 74, desresponsabilizou o governo, desvalorizou a democracia e em vez de unir, desuniu.

Espero que estas afirmações não sejam um sublinhar das posições do Governo em relação ao papel e decisão do Tribunal Constitucional. porque então, pioro que o seu discurso, é mesmo o seu ausente sentido de Estado.

Cavaco Silva igual a si mesmo

Muitos esperavam com alguma ansiedade e curiosidade o discurso de Cavaco Silva nas comemorações do 39º aniversário do 25 abril de 74.

Após os acontecimentos dos últimos dias parecia surgir, pelo menos aparentemente, quer uma eventual mudança de rumo do governo (mesmo que ligeira e conjuntural), quer um solidificar consensos entre PS e o executivo de Passo Coelho. Algo que, mesmo no exagerado isolamento e recato dos jardins de Belém, Cavaco Silva vinha apelando e promovendo.

Até que, sem razão aparente, tudo desmoronou (até os cravos durante o discurso) com a intervenção na Assembleia da República do representante máximo da nação. Ou melhor, corrigindo. Com uma razão aparente: finalmente, Cavaco Silva tem o seu governo de iniciativa presidencial.

É que após as incoerências demonstradas entre a sua posição em relação ao Orçamento do estado de 2012 e o de 2013, entre a cobardia política ao reforçar o seu apoio ao Governo após o chumbo do Tribunal Constitucional (curiosamente a três dos artigos que lhe suscitaram críticas e dúvidas), entre o alheamento do estado da nação, Cavaco Silva demonstrou a razão porque não é, e muito dificilmente alguma vez o terá sido, o presidente dos portugueses (mesmo daqueles que não o elegeram).

Esperava-se uma intervenção que espelhasse a realidade do país, que acalentasse os portugueses, que perspectivasse alguma esperança num futuro menos doloroso para o país e que projectasse reais condições para um consenso político-partidário, pelo menos, entre os partidos do “chamado arco do poder”. Mas a verdade é que a deslocação à América do Sul não trouxe ao Presidente da República mais clarividência, nem perspicácia política e, muito menos, o necessário sentido de Estado.

O discurso de Cavaco Silva não podia ser mais inconsistente, incoerente e surreal. Começa logo por, incompreensivelmente, continuar a notar-se uma obstinação pelo “fantasma” de Sócrates. Basta repararmos no quarto e quintos períodos da sua intervenção: “Dentro de dias completam-se dois anos sobre a data em que o Governo português, perante a iminência de colapso do financiamento do Estado e da economia, se viu na contingência de reconhecer o inadiável. O Governo de então teve de solicitar o auxílio externo da Comissão Europeia, do Fundo Monetário Internacional e do Banco Central Europeu, instituições perante as quais se comprometeu através de um exigente programa de assistência financeira que contou com o apoio de um amplo espetro partidário”.

Ao longo do seu discurso Cavaco Silva vai dando “uma no cravo e outra na ferradura” de forma inqualificavelmente contraditória: temos o sucesso e impacto das exportações no equilíbrio das contas externas mas que afinal são à custa da redução das importações (pela ausência produtiva interna); temos uma banca mais sólida (através da injecção dos “impostos” dos portugueses no sistema) mas que a sua maior solidez significa uma incapacidade de financiamento da economia; entre outros. Mas o mais relevante e, simultaneamente, preocupante e grave foi a forma como Cavaco Silva discorreu sobre o impacto da governação do executivo de Passos Coelho e o que é a democracia e o papel das instituições democráticas. Não faz sentido que o Presidente da República depois de sublinhar o esforço e os sacrifícios a que os cidadãos, as famílias e as empresas têm sido sujeitos, depois de criticar as políticas de austeridade que têm sido implementadas e os seus impactos sociais (por exemplo, o excessivo número de desempregados), económicos (recessão) e financeiros (aumento do défice e da dívida pública), apenas tenha uma palavra de desresponsabilização do governo, de crítica para com a oposição, de condenar aqueles que, legitimamente, procuram o exercício normal da democracia, mesmo que isso possa levar a (normais) processos eleitorais. Um discurso criticável a todos os níveis, longe do papel de um presidente dos portugueses, que reforçou a sua intenção de levar este governo até ao fim da sua legislatura, mesmo contra tudo e contra todos. Curioso foi a ausência total do discurso da referência ao Tribunal Constitucional.

À noção da “fadiga da austeridade” e “à incerteza sobre se os sacrifícios feitos são suficientes e, mais do que isso, se estão a valer a pena” (fruto da actuação deste Governo) Cavaco Silva contrapõe com críticas ao legítimo direito do exercício da democracia assente no valor da crítica e do direito ao voto. Ao facto do país ser ver condicionado e conformado com a exigência de implementação de “medidas que violam regras básicas de equidade, regras que constituem alicerces das sociedades democráticas contemporâneas, ameaçando a coesão e a paz social, perturbaram a estabilidade das democracias constitucionais” Cavaco Silva ainda acha que Portugal deve “contribuir para a construção de uma Europa mais solidária, mais justa e mais unida”.

Não foi para isto que se ergueram os cravos na madrugada de 25 de abril de 1974 ou que se promoveu o 25 de novembro de 1975. Entre a “Trova do vento que passa” (na abertura) e a “Grândola” (no encerramento), passando pelo Hino Nacional, Cavaco Silva denegriu as comemorações do 39º aniversário da revolução de abril de 74 com uma evidente falta de cultura democrática.

Nota final: Seguro não esteve nada bem (melhor esteve a sua bancada e o seu partido). É no momento, com a capacidade e perspicácia política necessária a alguém que anseia chegar a chefe de um governo, que se devem tomar as posições (seja para elogiar, seja para criticar). É de uma ingenuidade política inexplicável que António José Seguro não expresse uma palavra em relação ao discurso de Cavaco Silva, resguardando-se para os holofotes do Congresso, principalmente face à parcialidade da intervenção e às críticas dirigidas à oposição.

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Discurso do Presidente da República na 39ª Sessão Comemorativa do 25 de Abril

As reacções

Carlos Zorrinho (PS): «Cavaco apadrinhou política de austeridade do Governo»

Nuno Magalhães (CDS): «Foi um discurso com elevado sentido de responsabilidade»

Luís Montenegro (PSD): «Presidente da República fez um discurso corajoso»

Jerónimo de Sousa (PCP): «Discurso de Cavaco parecia do primeiro-ministro»

João Semedo (BE): «Foi um discurso inacreditável, que até os cravos caíram»


Governar ‘gota-a-gota’

Publicado na edição de hoje, 25 de abril, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Governar ‘gota-a-gota’

Escrever no dia em que Portugal, há 39 anos, soube (re)conquistar o sentido da liberdade provoca um misto de regozijo mas simultaneamente de alguma apreensão pela forma como essa mesma liberdade vai perdendo significado, responsabilidade e consistência. Algo que, comparativamente, é a imagem do Governo. O sentido (significado) do esforço que tem disso exigido aos portugueses continua longe dos resultados previstos: os défices têm sido necessariamente corrigidos (com os constantes alargamentos dos prazos de maturidade, sem renegociação do memorando e com um segundo resgate sempre presente no horizonte) como resultado de medidas apenas assentes na austeridade e pelas constantes falhas previsionais; o desemprego sobe constantemente; a dívida ultrapassa os 123% do PIB. A responsabilidade que não é assumida pelos erros de governação e pelas promessas eleitorais desvirtuadas e não cumpridas. Não basta sacudir a “água do capote” com o passado, com o desmoronar da Europa e da Zona Euro, com os mercados e a instabilidade económica internacional. A única via seguida até agora (a da austeridade “para além da Troika”) deixa os portugueses menos confiantes, mais preocupados com o futuro e mais pobres, com o país a não encontrar mecanismos de desenvolvimento e em não conseguir superar a crise (antes pelo contrário, ela tem vindo a agravar-se). A inconsistência na governação, dos projectos políticos, na ausência de reformas estruturais (incluindo a do Estado), na forma como governa o país a “conta gotas”. Ontem um projecto (que raramente concretiza), hoje uma medida avulsa num determinado sector, amanhã a necessidade de repensar tudo em função das exigências dos nossos credores (Troika), da Europa, do Tribunal Constitucional e dos falhanços das previsões. Face à factualidade de um Orçamento do Estado inconstitucionalmente elaborado (do ponto de vista político), face ao valor da derrapagem orçamental de 2012 com implicações directas na execução de 2013, o Governo reuniu cerca de 12 horas, em Conselho de Ministros, apenas para chegar à conclusão que precisa de cortar na despesa do Estado um valor que rondará os 800 milhões de euros. De que forma? Ainda por esclarecer os impactos práticos que esses cortes terão, apesar de uma presença extraordinária da Troika no país e apesar do Primeiro-ministro vir afirmar que não haverá mais austeridade, embora fosse importante explicar a Passos Coelho que cortes são austeridade. Mas ao fim de dois anos, depois do “abalo político” provocado pelo chumbo do orçamento, pela excessiva austeridade, pelos fracassos já referidos dos resultados, o Governo “acorda” finalmente para o que deveria ter sido, a par com o equilíbrio das contas públicas, a sua maior preocupação: a economia. Mais sete horas de Conselho extraordinário para ser apresentado o “Plano de Crescimento”. Finalmente… só que, apesar do valor das propostas, o plano não traz praticamente nada de novo. Os oito principais eixos apresentados (qualificação e formação; reforço da linhas de crédito para as PME exportadoras, esquecendo o mercado interno completamente destruído; aposta na reindustrialização, depois de ter falhado na agricultura e pescas; responsabilização da Caixa Geral de Depósitos no programa, esquecendo toda a banca onde o Estado já injectou muito dinheiro, sem contrapartidas; a desburocratização dos procedimentos, não assumindo, por exemplo, o Simplex mas travestindo-o de nova roupagem; aposta nas plataformas logísticas nacionais com o regresso ao projecto da rede ferroviária, entre outros), não são novidade e estiveram, desde a apresentação em outubro de 2012 do plano “Competitividade, Emprego e Investimento” (praticamente igual ao agora apresentado), numa gaveta até o Ministro Álvaro dos Santos Pereira dar o “grito do Ipiranga”. Nem mesmo o tão badalado Banco do Fomento que já não é novidade. No entanto, a incerteza mantém-se porque, apesar das medidas apresentadas, muita coisa ficou por esclarecer, por concretizar, por demonstrar os seus reais impactos. Por exemplo, nada foi adiantado quanto à urgente revisão da carga fiscal do sector empresarial, nem quanto às condições das linhas de crédito. Tal como em outras situações (demasiadas) é tudo muito vago, pouco claro e concreto. Esperemos pela definição das medidas, pela sua quantificação e impactos.

Liberdade...

É muito isto, ao fim de 39 anos...

A liberdade basta-lhe ser por si mesma, não é de esquerda nem de direita, e nem precisa de ter dono, nem de pai nem de mãe. Basta que exista e continue a existir, basta que seja, cada vez mais, a relíquia mais sagrada do património da humanidade.

(Pedro Guimarães, no facebook)

E a propósito (entre outros) um dos principais "Rostos"...

Quando o telefone toca... quem sabe?!

Entre as várias sucessivas e constantes remodelações governamentais registam-se alguns, até então, críticos deste Governo, em alguns casos com mais ou menos sarcasmo, mas curiosamente incisivos.
Por exemplo, corre nas redes sociais este post do recentemente empossado (ontem, dia 22) Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Fernando Manuel Almeida Alexandre: "Boa Viagem"(datado de 9 de abril de 2013).
Já para não falar em tudo o que se passou e foi dito em relação a Passos Coelho aquando das eleições regionais nos Açores, pela agora (também empossada ontem) Secretária de Estado da Defesa, Berta Cabral, então candidata ao governo açoriano derrotada no processo eleitoral.
Apesar disso, parece ser mais relevante as escolhas governamentais pelas críticas ao Acórdão do Tribunal Constitucional sobre o Orçamento de Estado de 2013 do que, propriamente, o espírito mais ou menos crítico em relação à actuação do Governo. Ou então uma clara forma de "silenciar" vozes críticas (só falta abrir "espaço" governamental para Manuela Ferreira Leite, Santana Lopes, Marcelo Rebelo de Sousa e - pasme-se - Pacheco Pereira). Mas a verdade é que quem tem feito algum "ruído crítico" tem sido bafejado pela sorte.
Face ao que tem sido, publicamente, a minha posição em relação a este Governo (que nada tem a ver com o PSD ou com a social-democracia, bem pelo contrário) estou fortemente inclinado a tomar uma decisão pessoal: o melhor é manter o telemóvel sempre ligado.
Quem sabe...

Fim do Pórtico? Ilusão...

Publicado na edição de hoje, 17 de abril, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Fim do Pórtico? Ilusão...

Desde que foram implementados sistemas de portagens (pórticos) nas ex-SCUT que tem sido largamente discutida a existência do chamado “Pórtico do Estádio”, no acesso da A25 a Aveiro/Praias. Discussão que tem sido transversal à comunidade aveirense, aos partidos políticos, à autarquia aveirense (e vizinhas) e fortemente debatido na Assembleia Municipal de Aveiro. Aliás, ainda neste âmbito foram algumas as promessas eleitorais nas legislativas de 2011 no sentido de corrigir esta incompreensível realidade.

Na sexta-feira passada, dia 12 de abril, foram aprovados, na Assembleia da república, dois projectos de resolução ao Governo. Um da iniciativa do Bloco de Esquerda que, no seu primeiro ponto, propôs a abolição do “Pórtico do Estádio” e o outro, de iniciativa conjunta do PSD e do CDS, que propõe não a eliminação daquele pórtico mas sim a sua relocalização. Curiosamente, as propostas não só não tiveram qualquer subscrição por parte do PS como mereceram os votos contra da bancada socialista (excepção feita para três deputados). Algo que não coincide, de todo, com a posição do PS de Aveiro e do seu grupo da Assembleia Municipal de Aveiro. No entanto, há aqui uma decisão parlamentar que se sobrepõe e que vai originar uma posição do Governo que correrá o risco de não ser coincidente com as deliberações da Assembleia da República. É que num caso foi deliberado a remoção do “Pórtico do Estádio”, a outra decisão solicita ao Governo a deslocalização do equipamento.

Deste modo, não será difícil responder à questão que o jornalista do Diário de Aveiro, Rui Cunha, levanta no título “O princípio do fim do pórtico do estádio?” (edição de sexta-feira, 12 de abril).

A resposta afigura-se simples, por um erro político e de mobilidade crasso cometido. Não vai ser o fim do pórtico, antes pelo contrário. Primeiro, pela ambiguidade e contradição das decisões do Parlamento. Uma proposta prevê o fim do pórtico, enquanto a outra solicita a sua deslocação para outro local. Segundo, porque o que deveria estar em causa, com base na argumentação de mobilidade, acessibilidade, economia e justiça social, não é apenas o “Pórtico do Estádio”, mas sim três pórticos: Angeja e Estádio (A25) e Oliveirinha (A17). Enquanto estes três condenáveis, inqualificáveis e injustificáveis pórticos persistirem Aveiro e os aveirenses continuarão a ser vítimas de uma injustiça e um atentado social e económico sem precedentes.

O que está em causa não pode ser o acesso a um estádio e a jogos de futebol de 15 em 15 dias ou a três meses de praia. Tem a ver com a ligação entre três zonas industriais (Cacia, Taboeira e Mamodeiro) ou a circulação periférica à cidade Aveiro. Ou ainda o facto desta parte da A25 ter sido construída sobre o antigo IP5, mais que pago ao longo da sua existência. São argumentos do ponto de vista económico, social, de acessibilidade e mobilidade urbanas: prejudica quem se desloca para e dentro da malha urbana de Aveiro; são as repercussões negativas no crescimento e desenvolvimento económico da região (concretamente com as três zonas industriais e o acesso ao Porto de Aveiro, sem penalizar a EN 109 e principalmente a Vila de Cacia). Mas estes princípios deveriam ter igual peso também em relação aos pórticos situados em Angeja (saída da A1 e A29) e o do nó de Oliveirinha (A17) que condicionam e desvirtuam o princípio da malha urbana, das circulares externas às zonas urbanas. E esse é o erro. Mesmo sendo favorável ao princípio do “utilizador-pagador” há claras e óbvias excepções onde não se deve aplicar a regra, valorizando a mobilidade, a acessibilidade o desenvolvimento económico e social de uma região e realidades com especificidades geográficas marcantes.

Enquanto esta não for a “luta” política dos aveirenses, as instituições e dos partidos, enquanto não for, claramente, vincada esta realidade da circulação externa a Aveiro, entre Angeja e o nó de Mamodeiro, não é pelo “Pórtico do estádio” que a cidade sofrerá um forte estrangulamento económico e social. Não se pode olhar para a floresta e ver apenas uma árvore.

Falta governamental justificada

Pelo que consta parece ter existido uma razão atendível para que Paulo Portas, ministro de Estado, ministro dos negócios estrangeiros e líder do partido da coligação governamental - CDS, tenha faltado à tomada de posse dos dois novos ministros e dos quatro novos secretários de Estado, neste sábado passado. Isto tudo apesar do "recado" enviado por Pedro Passos Coelho.

A justificação dada residiu no facto do ministro Paulo Portas estar "demasiadamente afastado de Lisboa" para poder estar presente na cerimónia da tomada de posse dos novos membros do Governo. Ora bem... é certo que não temos TGV em Portugal. Mas o país é perfeitamente dotado de auto-estradas, de carros do Estado velozes, de um território que não tem mais que cerca de 650 quilómetros de comprimento. Por outro lado, desconhece-se a ausência de Paulo Portas do país.

Mas a justificação é mais que óbvia: longe vão os tempos cor-de-rosa da ida aos mercados, regressaram os tempos cinzentos da TSU (Setembro de 2012) dos dois Orçamentos do Estado que trouxeram mais austeridade. Resultado: Paulo Portas amuou.

Amuou porque nesta remodelação do Governo não foram contemplados quaisquer membros do CDS, principalmente o lugar de ministro da Economia tão desejado pelo CDS ou o facto de ser escolhido Miguel Maduro para ministro.-adjunto com uma das áreas mais vitais para o desenvolvimento do país: a gestão dos recursos financeiros europeus do QREN. Já que em relação a Vítor Gaspar restam meros bitaites avulsos.

Mais um abanão na coligação governamental, sustentado nas posições do conselho nacional dos centristas e no "piscar de olho" ao PS, sempre à espera do CDS se segurar ao poder, venha ele com a moleta social-democrata ou do socialista.

A semana em resumo... (14-04-2013)

Publicado na edição de hoje, 14 de abril, do Diário de Aveiro.

Entre a Proa e a Ré

A semana em resumo…

Ainda o Tribunal Constitucional. Na sequência dos impactos políticos do recente Acórdão do TC (a que não são alheios, também, os de natureza económica) continua a ser inquietante a impunidade e a desresponsabilização políticas do Presidente da República em todo este processo. Incoerentemente, para não perder relevância política para os partidos da oposição, ao contrário do que tinha feito em relação ao Orçamento para 2012, decidiu solicitar ao TC que se pronunciasse sobre algumas normas orçamentais para 2013; imprudentemente, preferiu uma fiscalização sucessiva ao OE2013 em vez da preventiva; inconsequente, ao colocar em causa políticas orçamentais do Governo e a constatar que o TC lhe deu razão, não só permanece impávido e sereno (não assumindo as suas responsabilidades), como ainda, publica e institucionalmente, é o próprio quem garante a continuidade do Governo, apesar de todos os erros políticos e constitucionais; de novo incoerentemente, em 2011, face ao chumbo do PEC VI e a um “amuo” institucional (a quebra foi, como se sabe, bilateral) levou o país a eleições antecipadas.

A “despachar”. Esta semana, o país entrou em ebulição, em algum desespero até, por força da decisão de Vítor Gaspar de "congelar" novas despesas públicas. Ou seja, despesas não orçamentadas. Foram inúmeros (até demasiados) os que vieram imediatamente a terreiro bradar aos sete ventos: o governo congelou o país, o governo paralisou o país, as instituições vão deixar de funcionar, vai faltar o papel higiénico, a esfregona ou as esferográficas. Agora se percebe (uma das razões, claro) porque é que a despesa pública é o que é em Portugal e porque é que estamos neste buraco cada vez mais fundo. Já em circunstâncias normais, muito mais em situações de crise como a que vivemos, só merece ser criticado o facto de ser permitida a realização de despesa que não foi, simplesmente, orçamentada (salvo óbvias excepções)! Era preciso haver um despacho a condicionar (ou a proibir) este simples acto de gestão? Não fosse o Acórdão do Tribunal Constitucional e um ministro "vingativo" que, “enraivecido” pelo normal decurso da democracia num Estado de Direito, despachasse sobre o óbvio: rigor e disciplina orçamentais, teríamos papel higiénico às paletes, esferográficas de todas as cores e feitios e muito ambientador para purificar e aromatizar o ar da Função Pública.

Remodelação ou substituição? Não coloco em causa as competências e aptidões (mesmo as políticas) das novas nomeações, concretamente as de Luís Nobre Guedes (que a 9 de abril referi como a normal substituição de Miguel Relvas), do novo ministro-Adjunto e do Desenvolvimento Regional e, muito menos, a do novo Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Emídio Guerreiro (privando-me aqui de tecer comentários pela incapacidade de distanciamento face à relação de amizade que nos une). Só que quando se fala em remodelação governamental não colhe a simples substituição de cargos. Se politicamente o Governo ficou fragilizado no seu pilar político-partidário sem Miguel Relvas, simultaneamente, ficou refém de toda a tecnocracia e o experimentalismo académico (muito ao gosto desta Troika) de Vítor Gaspar, não sendo previsível qualquer alteração ao comportamento e às acções deste Executivo face à forma de encarar e combater a crise. Portanto, nada muda. Por outro lado, com a importância dedicada ao Desenvolvimento Regional e às exigências de uma eficaz gestão dos fundos comunitários, gerando um novo ministério e um novo ministro (bastante ligado à área), o Governo dá um colossal passo à rectaguarda em relação à excessiva dimensão e eficácia do superministério da economia e do seu titular, Álvaro Santos Pereira.

Autárquicas 2013 – Aveiro. Depois de muita tempestade e tormenta o PSD-Aveiro tem o seu candidato às eleições autárquicas deste ano: Ribau Esteves. Experiência autárquica acumulada, acção e palco político de vários anos à frente da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro, ex-secretário geral do PSD, entre outros. É o melhor candidato? Virtudes e defeitos todos temos por força da nossa condição humana. Mas há um 'handicap' importante e que, por coerência com o que sempre escrevi (independentemente dos nomes e partidos), não poderia deixar de sublinhar. Por força da lei da limitação de mandatos, poderá Ribau Esteves ser candidato? No decurso de um Conselho Nacional do PSD era bom que os conselheiros social-democratas se auto-criticassem pela forma infantil e displicente com que conduziram todo o processo destas próximas eleições, com os resultados que poderão ainda surgir até setembro/outubro deste ano e que eram, totalmente, escusados e evitáveis. Para os que deram a cara pelas comunidades, os candidatos, as concelhias, o partido e a democracia.

Acertar no Euromi... upsss. Remodelação.

Praticamente o pleno... se fosse no euromilhões teria, garantidamente 5 números e 1 estrela (pelo menos).

A verdade é que a propósito do texto "Remodelação Constitucional" (postado a 9 de abril, para que não restem dúvidas) referi dois aspectos agora confirmados nesta "suposta" remodelação governamental:
1. A escolha de Luis Marques Guedes para o lugar de Miguel Relvas (Assuntos Parlamentares).

2. A continuidade de Álvaro Santos Pereira no ministério da Economia.

Quanto ao primeiro afigura-se uma escolha óbvia e sensata. No entanto, volto a reforçar o que na altura referi. Politicamente o Governo ficou sem o seu pilar. Poder-se-á criticar a vertente política do Governo mas Miguel Relvas era de facto a face política deste Executivo, reduzido agora ao palco mediático (e imprevisível) de Paulo Portas ou à tecnocracia académica e experimentalista de Vítor Gaspar. Apesar de muitas vozes que davam quase como certa a "subida" ao Governo de Luís Montenegro, esta seria uma solução algo descabida já que o PSD ficaria a braços com o problema da liderança da bancada parlamentar.

Embora a escolha de Luís Maduro como ministro-adjunto (uma parte das funções de Relvas, por exemplo a comunicação social e as autarquias) e do Desenvolvimento Regional (pasta bastante relevante e importante para os próximos anos, já que irá gerir os fundos comunitários, tão importantes para o desenvolvimento do país, a que não será alheia a sua experiência europeia) venha, na questão Regional, retirar algumas competências ao superministério de Santos Pereira (comprovando-se, agora, o excesso de funções e áreas sob a mesma alçada ministerial), a verdade é que o ministro da Economia mantém-se em funções.

E era expectável que assim fosse. Aliás, nem se percebe todo o nervosismo da oposição em relação à remodelação do Governo, concretamente em relação à substituição de Miguel Relvas.
A única forma de remodelar profundamente o Governo seria retirar toda a ideologia académica e experimentalista alicerçada na austeridade custe o que custar. Princípio defendido com unhas e dentes por Vítor Gaspar e pela Troika.

Enquanto isso não acontecer, enquanto isso não for previsível, qualquer alteração à orgânica do Governo terá efeitos prático nulos.

Dá-me um despacho e dir-te-ei de que país és

Portugal entrou em ebulição, em algum desespero até, por força da decisão ministerial de Vítor Gaspar de "congelar" as novas despesas públicas. Ou seja, despesas não orçamentadas. (ver despacho)

São inúmeras (acho que até demasiadas) as vozes que vieram imediatamente a terreiro bradar aos sete ventos: o governo congelou o país, o governo paralisou o país, as instituições vão deixar de funcionar, vai faltar o papel higiénico, a esfregona ou esferográficas. Ou seja... a Administração Pública (o Estado) vai parar e vai ficar a cheirar mal.

O curioso (estranhamente curioso, para não dizer preocupante) é que ninguém (ou muito poucos, vá) teve a lucidez de reflectir sobre o despacho de Vítor Gaspar.

A - o despacho refere-se a "novos compromissos", ou seja, a despesas não orçamentadas.

B - o segundo considerando do despacho tem como "alvo" o Acórdão do Tribunal Constitucional sobre o OE2013.

Ora bem...

Agora se percebe (uma das razões, claro) porque é que a despesa pública é o que é em Portugal e porque é que estamos neste buraco cada vez mais fundo. Já em circunstâncias normais só merece ser criticado, muito mais em situações de crise como a que vivemos: como é possível que não se condene o simples facto de ser permitida a realização de despesa (salvo óbvias excepções) que não foi, simplesmente, orçamentada?! Era preciso haver um despacho a condicionar (ou a proibir) este simples acto de gestão?

Por último, não fosse o Acórdão do Tribunal Constitucional e estaríamos perante um despesismos do Estado e das Instituições Públicas porque não havia um ministro "vingativo" que, enraivecido pelo normal decurso da democracia num Estado de Direito, despachasse sobre o óbvio: rigor e disciplina orçamentais.

Não fosse isso e teríamos papel higiénico às paletes, esferográficas de todas as cores e feitios e muito ambientador para purificar e aromatizar o ar.

Pieguices constitucionais.

Publicado na edição de hoje, 10 de abril, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Pieguices constitucionais.

O Primeiro-ministro, há bem pouco tempo, criticava a atitude dos portugueses perante a crise e as dificuldades, acusando-os de “piegas”. Mas o feitiço virou-se contra o feiticeiro e, face ao chumbo pelo Tribunal Constitucional de quatro normas, das nove analisadas, contidas no Orçamento do Estado para 2013 (OE2013), a declaração que proferiu ao país no final da tarde de domingo, foi de uma pieguice nunca vista, para quem sempre afirmou que as dificuldades se enfrentam com rigor, determinação e confiança. Será que Passos Coelho também perdeu “força anímica” (à semelhança do ex-ministro Miguel Relvas)?

A “não” independência do Tribunal Constitucional (TC). A separação de poderes num Estado de Direito é fundamental para a sobrevivência da democracia. Daí que o TC não tenha qualquer obrigação de estar condicionado a qualquer poder ou condição, ao contrário do que defendia Passos Coelho ao querer “colar” o TC ao memorando da Troika. O TC é o órgão que representa um dos quatro pilares da soberania portuguesa (para além do Presidente da República, Assembleia da República, Governo), independente, autónomo dos demais poderes do Estado, tendo como função primordial ser o garante da Constituição e zelar pelos direitos fundamentais dos cidadãos. No caso concreto, o TC limitou-se, pura e simplesmente, a fazer prevalecer a sua função e missão.

A instrumentalização política. Têm sido algumas as vozes que criticam o excessivo peso ideológico no Acórdão proferido e que determinou a inconstitucionalidade de quatro artigos constantes no OE2013. Basta olharmos para o preâmbulo da Constituição para percebermos a carga ideológica que a mesma comporta. E importa ressalvar que o TC apenas é o garante do cumprimento da Constituição, sendo que a mesma é aprovada ou revista pela Assembleia da República. Por outro lado, se olharmos para as votações dos Juízes é importante notar que dos oito que votaram pela inconstitucionalidade dos artigos 29º, 31º e 77º, dois foram indicados pelo PSD e um pelo CDS. Sendo que no caso do artigo 117º (pedido parecer pelo PCP e BE) apenas o Juiz independente e um indicado pelo PSD votaram a favor da constitucionalidade da norma.

O impacto governativo da decisão. Sendo certo que o TC apenas se deve preocupar com o cumprimento da Constituição e do exercício das funções do Estado, a decisão jurídica tem implicações políticas directas. Ou pelo menos deveria ter, pela insistência do Governo nos erros, apesar do aviso em 2012. Além disso, tudo teria sido mais facilitado para o país se Cavaco Silva tivesse optado pelo pedido de fiscalização preventiva e, por outro lado, face às conclusões do TC não se percebe que o Presidente da República tenha continuado a dar o seu “aval político” a um Governo que errou constitucionalmente e que tem falhado sucessivamente no cumprimento dos objectivos de recuperação das contas públicas. A questão é saber (nota-se um claro recuo discursivo de António José Seguro, após a pressão externa) se o PS é, de facto e no concreto, capaz de ser alternativa a este Governo e enfrentar o “poder” da Troika, e se quer mesmo ira eleições e arriscar um governo minoritário.

O impacto político e social. A decisão jurídica sobre opções políticas de natura económica tem, obviamente, um valor. E esse valor ronda os 1,2 mil milhões de euros. A acrescentar às dificuldades no cumprimento das metas, às derrapagens orçamentais, ao combate do desemprego e à estagnação da economia (tudo antes do acórdão, tal como já era sabido do atraso da próxima tranche da Troika e que não está relacionado com a decisão do TC - isso é um embuste). Sendo certo que Passos Coelho não anunciou aumento de impostos (embora vá haver correcção fiscal para a função pública por força do aumento dos meses tributáveis de 13 para 14), os cortes na educação, saúde, segurança social (pelo menos, embora seja expectável o recurso a mais privatizações) vão significar um maior esforço dos cidadãos nas suas despesas mensais, face ao que é o valor da massa salarial (rendimentos) actual. O que se esperará igualmente é que o Governo insista no erro de transformar meros cortes e engenharia financeira e orçamental numa clara reforma das Funções do Estado. Cortar os tão badalados quatro mil milhões de euros não é o mesmo que refundar (concorde-se ou não) as cinco verdadeiras funções do Estado (tal como refere o Prof. Doutor Marques-Mendes, da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, “Sobre o Papel do Estado”): soberania, reguladora, seguradora, produtora e distributiva. Sem se debater isto (altere-se ou não) não haverá estruturação das contas públicas, nem desenvolvimento para o país.

Remodelação Constitucional

A propósito do chumbo do Tribunal Constitucional a quatro artigos do OE2013 (antevendo o artigo de amanhã, no Diário de Aveiro) continuam a ser enumerados os mais díspares comentários, críticas, aprovações e, obviamente, os tradicionais "bitaites".

A verdade é que o impacto das erradas políticas que têm sido seguidas, mesmo sem o Acórdão do TC, não eram garantia (como nunca o foram até à data) de que não seriam precisas mais medidas de austeridade, mais carga fiscal, mais cortes, já que o OE2013 entrou neste ano já com a incerteza do seu cumprimento (e a consequente previsão de um Orçamento Rectificativo). Para além disso, já era por demais sabido que a próxima tranche (resultante da sétima avaliação da Troika) só chegaria em Maio. Por outro lado, desde 2011, após a assinatura do memorando e após as eleições, este Governo já negociou com a Troika duas alterações às metas do défice, os prazos de maturidade dos juros (esperando-se um novo período de mais sete anos, juntamente com a Irlanda).

Por isso, colocar na decisão do TC a responsabilidade de toda as falhas nas previsões, de todos os impactos negativos da austeridade e das consequências sociais e económicas das políticas implementadas, é, no mínimo, um embuste e uma total falta de ética política.

Não é pela situação de emergência ou de crise que a Constituição fica suspensa e permite o livre arbítrio de qualquer acção governativa. Antes pelo contrário, deve ser nestas alturas que Governo, Assembleia da República, Presidente da República e, pela sua missão, o Tribunal Constitucional devem ter particular atenção ao zelo constitucional.

A solução avançada pelo Governo para fazer face aos "custos constitucionais" do acórdão do TC (por volta dos 1,2 mil milhões de euros) passa por cortes nas despesas do Estado, em alternativa a um aumento de impostos. No entanto, não se pense que, face ao que tem sido a governação de Passos Coelho\Gaspar e Relvas (até à semana passada) isto não signifique mais sacrifícios. Serão mais os despedimentos, acelerados os processos de mobilidade na função público, menos apoios sociais na saúde, na educação, na justiça e na segurança-social. No fundo, menos Estado, menos investimento, menos economia.

É por isso, com alguma estranheza que há brados, louvores e cânticos de aleluia a uma possível (ou prevista) remodelação do Governo.

Mas qual remodelação? A do Primeiro-ministro? A do ministro das Finanças? Se não, remodelar para quê? Só para contentar a opinião pública ou o partido da coligação, CDS?

Escrevi neste domingo, na crónica do Diário de Aveiro - "Entre a Proa e a Ré" ("A narrativa da falha anímica") que o Governo tinha perdido, com a demissão de Relvas, a sua vertente política, ficando refém da vertente tecnocrata (teórica e experimentalista) sob a batuta de Vítor Gaspar.
Ao ler a informação veiculada pelo Expresso (edição online) - "Passos e Portas preparam remodelação alargada" não me restam dúvidas em relação ao que afirmei. Para além da não necessária, nem óbvia, substituição de Miguel Relvas (podia perfeitamente ser assegurada a função pelo porta-voz do Conselho de Ministros, Luís Marques Guedes) o semanário avança com a hipótese do ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira deixar vaga a cadeira do superministério. Não consigo perceber o que isso possa alterar o que tem sido o caminho traçado por Passos\Gaspar\Troika, a não ser uma eventual maior permissividade face às pressões lobistas, nomeadamente na banca, energia, transportes e obras públicas.

A narrativa da falha anímica

Publicado na edição de hoje, 7 de abril, do Diário de Aveiro.

Entre a Proa e a Ré

A narrativa da falha anímica

A demissão de um ministro só me parece concebível quando estão em causa duas vertentes: um consequente avolumar de erros políticos de governação ministerial ou um conflito entre a estratégia do governo e a actuação do ministro; ou alguma acção passível de processo criminal. Curiosamente, o país, na quinta-feira, foi “abalado” (entre “urras” e “comoções”) pela surpresa do pedido de demissão do ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas. E surpresa por dois motivos distintos. Primeiro, porque Miguel Relvas era o rosto e o pilar políticos deste Governo. Foi o responsável pela ascensão ao poder partidário e governativo de Pedro Passos Coelho, pela forma como desenhou toda a estratégia para o confronto interno com o peso dos históricos do PSD que permitiu a Passos Coelho ganhar a liderança do partido e, também, pela forma como planeou, durante dois anos, o combate eleitoral entre a sua “criação” e José Sócrates, nas legislativas de 2011. Temos pois, como resultado imediato, um governo que se vê privado do seu alicerce político, reduzindo um espaço que fica apenas preenchido pelo líder do elo mais fraco da coligação, o CDS/Paulo Portas (com toda a instabilidade que isso possa gerar), deixando ainda Passos Coelho sem o seu braço-direito, a sua muleta, o seu mentor. Por outro lado, o actual governo fica refém da vertente técnica (tecnocrata) da sua gestão, e logo nas mãos de um independente: Vítor Gaspar. Mas o mais curioso é que o segundo aspecto traz-nos a verdadeira surpresa da decisão. É que Miguel Relvas não se demite por erros de governação, por razões políticas ou até mesmo por questões criminais (embora o motivo não tenha sido, nem por ele, nem pelo governo, verdadeiramente clarificado: apenas uma insustentável referência à “falta de condições anímicas”). Não está em causa o grave atentado ao direito da personalidade cometido contra a ex-jornalista do Público, Maria José Oliveira; não está em causa o caso do cancelamento e censura do programa da Antena 1, “Este Tempo” do jornalista Pedro Rosa Mendes, aquando da realização do Prós & Contras em directo de Angola; não está em causa o processo das escutas e do SIED envolvendo Silva Carvalho; não está em causa o deplorável processo de privatização da RTP; não está em causa um suspeito envolvimento no processo de saneamento do ex-director de informação da RTP, Nuno Santos; não está em causa toda a polémica e ataque ao Poder Local com a reforma administrativa territorial autárquica (agregação das freguesias); não está em causa a não clarificação da lei que limita os mandatos autárquicos e todas as trapalhadas que daí têm resultado; não está em causa a nova lei das autarquias e das comunidades intermunicipais; não está em causa, sequer, o facto do ex-ministro não saber cantar a “Grândola”. Apesar de não explicado, é implícito que Miguel Relvas “cai” da cadeira do poder porque corre o risco de deixar de ser “dr.”, no seguimento da polémica com a sua suposta licenciatura (curiosamente, um conjunto de factos ocorridos ainda antes de ser ministro e que lhe imputam responsabilidade ética ao próprio, mas eventuais consequências criminais à Universidade Lusófona). Miguel Relvas sai do governo porque um “não-assunto”, como à data denominou Passos Coelho, passou a ser “assunto de Estado”. Miguel Relvas sai do Governo com um impacto político por razões não políticas e que nada têm a ver com os apontados (e resumidos) casos de má governação. Miguel Relvas sai do governo porque o país (ou grande parte da sua sociedade) ainda vive embrenhado num medieval, fedorento e balofo complexo de superioridade de posição social sustentada num canudo académico (muito longe da “descomplexidade social” de várias sociedades europeias, como são exemplo a Sra. Merkel ou o Sr. Hollande). Infelizmente, Miguel Relvas não sai do governo porque “animicamente” nunca deveria ter entrado ou pelos seus inúmeros e graves erros de estratégia e governação política.

Por isso, não posso deixar de sublinhar (e subscrever) o excelente e soberbo parágrafo com que a Fernanda Câncio termina a sua crónica de sexta-feira, no Diário de Notícias: “Sai como entrou e esteve: sem dimensão nem sentido de Estado, respirando impunidade e descaramento. (…). Antes não saísse de todo: era mais honesto”. O Governo perdeu o tino…

Obviamente… “chumbe-se”!

(crédito da foto, via Diário de Notícias: Orlando Almeida / Global Imagens)

Enquanto se aguardam as decisões políticas do governo (ou, a melhor alternativa, eleições antecipadas) que deverão surgir do Conselho de Ministros Extraordinário, agendado para hoje, á tarde, para fazer face ao considerável chumbo do Tribunal Constitucional a algumas normas do Orçamento do Estado para 2013, e se aproveita para ler 299 páginas (?), relembremos o que esteve em causa com a deliberação de ontem e que deve ter tirado o sono, pelo menos a Passos Coelho, a Vítor Gaspar e a Paulo Portas.

1. O acordão jurídico de um conjunto de decisões políticas com impacto financeiro vale cerca de 1,3 mil milhões de euros.

2. Mesmo tendo em conta a separação de poderes inerentes ao um estado de Direito e Democrático, não vale a pena esconder que a posição tomada pelo Tribunal Constitucional tem forte impacto político. Uma clara vitória da oposição, fragilizando o Governo e todas as políticas que têm vindo a ser seguidas para o cumprimento das metas previstas no memorando de ajuda externa. O Governo, mais uma vez, a todos os níveis (económico, social e político) falhou redondamente. E, como muito bem diz Pedro Santos Guerreiro, vêm aí mais impostos (o país pegou fogo como Nero a Roma)

3. Mas há, em primeira instância, alguém que também tem e deve assumir as suas responsabilidades políticas e, qui ça, renunciar ao seu cargo: o Presidente da República. Primeiro pela incoerência da posição assumida face ao OE2012 e a este OE2013. Depois, mesmo antes de ser conhecida a posição definitiva do Tribunal Constitucional veio publicamente “segurar” a cadeira do poder do actual governo ao afastar a eventualidade de eleições antecipadas (por força da demissão ou queda do Governo). Mas principalmente, porque quando eram inúmeras as vozes (partidárias ou não) na sociedade a defender uma fiscalização preventiva ao OE2013 (mesmo correndo o inconsequente risco de “vivermos” dois ou três meses sem Orçamento – em duodécimos), teimosamente, Cavaco Silva deixou resvalar a situação para esta fiscalização sucessiva.


As quatro inconstitucionalidades (artigos 29º, 31ª, 77º e 117º do OE2013 – fonte: Público):

Artigo 29º - Suspensão subsídio de férias a funcionários públicos

Em 2012, o Governo suspendeu o pagamento dos subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores do Estado. Este ano repôs o subsídio de Natal, manteve o corte no subsídio de férias, algo que o Tribunal constitucional, à semelhança do que tinha feito no ano passado, considera que fere o princípio da igualdade de tratamento. A fiscalização foi pedida pelo Presidente da República e PS.

Artigo 31º - Contratos de docência e Investigação (parcial)

O artigo 31º do OE, que agora foi considerado inconstitucional, servia, entre outras coisas, para alargar a quem recebia vencimentos por exercer actividades de docência ou de investigação “financiados por entidades privadas, pelo Programa Quadro de Investigação & Desenvolvimento da União Europeia ou por instituições estrangeiras ou internacionais”, os cortes previstos no subsídio de férias da função pública, “exclusivamente na parte financiada por fundos nacionais do Orçamento do Estado”. O pedido de fiscalização fora feito pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda.

Artigo 77º - Suspensão de 90% do subsídio de férias a pensionistas

Neste caso, face a 2012, o Governo repôs o subsídio de Natal e 10% do subsídio de férias. Manteve no OE2013, um corte de 90% do subsídio de Natal, agora considerado inconstitucional. A fiscalização deste artigo foi pedida de forma unânime pelo Presidente da República, Provedor de Justiça, PS, PCP, Bloco de Esquerda e Os Verdes.

Artigo 117º - Contribuição sobre prestações de doença e desemprego

O Governo introduziu no OE o pagamento de uma contribuição para a segurança social de 6% para quem recebe subsídio de desemprego e de 5% para quem é beneficiário do subsídio de doença. O Tribunal Constitucional considera que esta regra fere o princípio da proporcionalidade. O pedido tinha sido feito pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda.


Quem decidiu o quê? Veja as votações do juízes do TC (fonte: Diário de Notícias, edição de 06.04.2013, via Maria João Pires/Shyznogud)

Demissão de Relvas… lado b

A primeira parte (lado A) deste “disco sound” será publicada na edição de amanhã, 7 de abril, no Diário de Aveiro (e republicada aqui).

Importa, no entanto, destacar alguns aspectos que merecem relevância na leitura de demissão do (ex) ministro Miguel Relvas.

1. A explicação que é dada, apenas pelo próprio, sem qualquer posição oficial do Governo refere uma “incapacidade anímica” para continuar no cargo, chamando a si um narcisismo e um protagonismo de poder nunca visto.

(declaração de Miguel Relvas)

2. Mas perante os factos e a realidade, a verdadeira razão prender-se-á com o caso da sua suposta licenciatura e o facto do processo de investigação agora concluído (e que segundo o ministro Crato lhe chegou às mãos no mês passado e que, as linhas gerais do mesmo, teriam sido comunicadas a Passos Coelho) seguir para o Tribunal Administrativo (com indicação de anulação do grau académico) e para o Ministério Público, por suspeita de irregularidades criminais.

Legislação correspondente, faltando os regulamentos internos da Lusófona:
- lei de bases do sistema educativo: Lei 46/1986 - Lei 37/2003Lei 49/2005

- processo de Bolonha: Decreto-Lei 74/2006Decreto-Lei 107/2008Decreto-Lei 230/2009

- documento da auditoria da inspecção geral de educação e ciência

- comunicado do ministério da Educação

Sobre este ponto 2, convém referir:

- infelizmente, Miguel Relvas sai do Governo não por questões directamente relacionadas com erros graves de gestão política (e havia tantos) mas por uma questão de irresponsabilidade ética, num processo da sua vida privada antes de ser ministro.

- quem incorre em atropelos à legalidade (procedimentos judiciais e criminais) é a Universidade Lusófona pelo incumprimento da Lei (ou das Leis) e dos próprios regulamentos internos.

- é indiscutível que a sociedade portuguesa, em pleno século XXI, ainda viva embebida por um complexo social burguês e aristocrata da posição social e do mérito pessoal sustentados num simples grau académico, o chamado “canudo”. Esquecendo, por exemplo, que supostamente poderá ser mais enriquecedor para um CV a referência como ex-ministro do que um simples “dr.”

- além disso, o país precisa de um verdadeira Reforma do Ensino, como um todo, que volte a valorizar o mérito, o conhecimento, o saber, a experiência, que, sem elitizar classes, não caia no extremo da massificação, por exemplo do ensino superior (algo que o infeliz processo de Bolonha gerou), que abandone o estigma de inferioridade do ensino técnico-profissional, que ‘descomplexe’ a realidade entre ensino público e particular (quando muitos destes fazem parte da rede pública, com contratos de associação, e pedagogicamente iguais).

Este é que é o impacto político-social de uma demissão inesperada e, simultaneamente, injustificável, pelo menos pelas razões apontadas.

corte de relva(s)

É um facto que não é um pormenor na vida política nacional a demissão de um membro de um governo...

É um facto que a demissão de um ministro como Miguel Relvas (para o bem ou para o mal) não é um pormenor qualquer...

Mas a verdade é que após a notícia, os comentários óbvios das forças partidárias e de um ou outro comentador, tudo o mais serve como mediatismo, "encher chouriços", repetir o que já foi dito, comentar o que já foi comentado.

Ao ponto de já ninguém se lembrar da Moção de Censura ao Governo apresentada ontem pelo PS, do caso "Casa Pia" e o cumprimento das penas de prisão, as fraudes na saúde e na segurança social, o debate sobre a redução do IVA nas energéticas, a Coreia do Norte, os "offshores", a entrevista de Isaltino Morais, a "economia social" como tema do próximo debate quinzenal, as perguntas dos portugueses que terão resposta de Sócrates na RTP... o jogo do Newcastell.

Ou ainda, o facto do PSD-Aveiro ficar limitado à escolha entre Ribau Esteves ou nenhum candidato (após a desistência do actual presidente da câmara, Élio Maia).

Para já, segue um interrupção até Domingo... aqui e num Diário de Aveiro perto de si.

Mas o país continua.

Entretanto, aproveitem e leiam a declaração do ex-ministro Sr. Relvas de "fio-a-pavio".

Um Moção completamente chumbada...

Não me parece democraticamente legítimo condicionar qualquer partido parlamentar ao direito que lhe assiste de apresentar moções, sejam elas de confiança ou de censura. Obviamente, que o instrumento regimentar (ou Constitucional – alínea e) do artigo 163º) tem um peso político relevante (independentemente de poder ter impacto directo na queda ou não dos governos, mesmo que chumbadas à partida) e não deve ser usado de forma leviana e abusiva, sob pena de desvirtuar e banalizar este “argumento” de combate político.

E este é que se tornou o principal “inimigo público” da Moção de Censura que António José Seguro apresentou, hoje (3 de março) contra o Governo de Pedro Passos Coelho. Falhou no objectivo (já que o impacto, por força do número de votos seria o esperado: chumbado, com 131 votos contra – PSD e CDS - e 97 a favor – PS, CDU e BE). É que Moção de Censura não foi eficaz no combate político, não fragilizou o Governo (aliás, na duvidosa estratégia de tentar “dividir para reinar”, tentado questionar e interpelar o papel do CDS na coligação, apenas a tornou, mesmo que aparentemente, mais consolidada), não mobilizou a esquerda (apenas no voto). Fez ricochete, virou-se o feitiço contra o feiticeiro. E a verdade está na resposta de Passos Coelho e que apenas mereceu a gargalhada de Seguro: “A Maioria está bem mais unida que o PS”.

Foram tantas as armadilhas, tanta a incapacidade argumentativa, tanta a demagogia sem apresentação de alternativas que mostrem a diferença dum projecto político que garanta algum sucesso eleitoral (imagine-se o que seria o país a cair em eleições nestas circunstâncias) e credibilidade externa, que o PS e, concretamente, António José Seguro, saíram claramente a perder a dobrar: moção chumbada e imagem política fragilizada.

Antes de analisar, brevemente, um ou outro aspecto em particular, há, inexplicavelmente (a não ser por uma questão de “trauma político”) uma aversão de António José Seguro ao passado recente da governação de José Sócrates. E seria por aqui que o líder socialista deveria ter fundamentado a sua moção. Porque politicamente é sustentável do ponto de vista argumentativo e factual. Se é verdade que foram cometidos erros na governação do período socrático (alguns mais graves que outros, para além dos aspectos positivos que o próprio Governo PSD-CDS ainda recentemente aproveitou), também não deixa de ser menos verdade os erros, demasiados, que este Governo tem cometido. Tudo isto com um transparente agravamento: o que motivou o chumbo do PEC IV, a condução do país para o inevitável recurso à Troika, as falsas (como agora se pode perfeita e historicamente demonstrar e comparar) promessas eleitorais alternativas para o país que apenas tiveram o objectivo do derrube do anterior governo para, com desmedida e encapotada ambição, ocupar a “cadeira do poder” custasse o que custasse. Tudo tinha sido mais fácil para Seguro, se não andasse tão obcecado pelo mediatismo, por forçar ser oposição apenas por ser, demagogicamente, apenas para tentar esbater a “sombra” do regresso de Sócrates à esfera e intervenção públicas. Exemplo disso é o caso hilariante, tal como ridículo, da carta à Troika (que afinal tinha ido, mas não foi, existia, mas que acabou por aparecer hoje, sem se saber se foi enviada). Ou ainda o total desnorte com o aumento das reformas mais baixas e das PPP.

Ao enveredar por este caminho, tal como em muitos pontos altos públicos, António José Seguro, com a habitual demagogia e vazio de propostas concretas, reais, compatíveis coma situação do país, concretizáveis, banalizou e perdeu uma oportunidade (mais uma) de se demarcar de tudo. Nem a capacidade de contestar a surpresa discursiva do ministro das Finanças, Vítor Gaspar quando, ao contrário do que tem sido a posição do Governo em não falar do governo de Sócrates, a menos que a isso José Seguro exija, se debruçou sobre o resultado da “década perdida” da governação anterior. Vítor Gaspar recordou que o PS esteve no Governo em grande parte dos últimos 15 anos e que, neste período, Portugal foi dos países que menos cresceu. "Não é possível negar que a estratégia do Partido Socialista falhou". Nem uma contestação.

(ver aqui, via TSF, os principais momento do debate de hoje)

Sete pecados mortais da moção de Censura

A Moção de Censura ao Governo, apresentada pelo PS (texto integral), ao menos por uma questão de coerência política e discursiva poderia ter servido para um total ruptura: do passado recente da governação socialista, do memorando (como o próprio afirmou, não foi por ele assinado), do governo. Mas faltou-lhe coragem… a mesma ausência de coragem para assumir que tudo podia ter sido diferente se não tivessem ocorrido as eleições de 2011 que, afinal e na prática, serviram para desiludir muitos eleitores, decepcionar os cidadãos e, conforme provam a realidade dos números, afundar ainda mais o país. Como diz o ditado “mal por mal, mais-valia não se ter mexido”. Mas também o que esperar de uma Moção de Censura ao Governo, com um país assolado de problemas e que se resume a quatro páginas? (já vi textos na Assembleia Municipal de Aveiro maiores e mais consistentes).

Só que foram tantos os erros no debate de hoje.

1. A estratégia de tentar destabilizar e criar algum mau estar, com a moção, no Governo, a partir do CDS. Logo o CDS que dificilmente sairá do Governo porque tal significa abdicar do poder (que nem o conquistou directamente por sufrágio) e sujeitar-se a mais uma travessia do deserto político nacional. Alvo totalmente errado.

2. Segundo Carlos Zorrinho, a “moção de censura contra o governo é um acto patriótico”. Tal como a abstenção em relação ao OE2012 era uma abstenção violenta. O patriotismo vê-se e demonstra-se em alternativas, em apresentar soluções para o problema… os portugueses já não conseguem sobreviver de demagogia (não alimenta o estômago, nem avia medicamentos nas farmácias). E aqui, surge a primeira armadilha política pela voz do líder da bancada social-democrata, Luís Montenegro: "Censuro, logo existe. Censuro, logo sou oposição, Censuro, logo acalmo as minhas hostes. Censuro, logo isso é bom para mim enquanto líder do PS".

3. Não basta dizer que tudo falhou, que é a austeridade pura e dura, que as previsões foram todas ao lado (algumas até para o dobro). Isso qualquer dos comuns dos mortais portugueses sente na pele e no bolso todos os dias. Era preciso demonstrar que o caminho que estava a ser anteriormente seguido (obviamente com as devidas e constantes readaptações, tal como em cada revisão da troika), afinal, era menos penoso, podia ter tido mais sucesso, sacrificava menos os portugueses e, acima de tudo, de tudo mesmo, não recorria a promessas eleitorais que, na prática, resultaram em políticas, reformas e medidas totalmente opostas ao discurso de passos Coelho em 2011, quer face ao Governo do PS, quer em plena campanha eleitoral.

4. Outro e preocupante erro estratégico do PS é não ter conseguido rebater o argumento do Governo (usado por Passos Coelho e por Portas) de que a moção, em caso de aprovação, significaria um segundo resgate externo a Portugal. Algo que o próprio governo PSD-CDS não garante, nem tem provas, de que não acabará por acontecer face ao rumo que o país leva. A menos que, finalmente, Portugal saia da zona euro. Alternativa, infelizmente, que o PS não sublinha. Ou ainda, o tal erro que revela um incompreensível “trauma político” pelo passado foi o não assumir que o PEC IV tinha a aprovação das instituições da União Europeia e que não teve consequência por força do seu chumbo e pela “birrinha institucional” de Cavaco Silva.

5. O discurso vazio, inócuo, do mais tempo, da renegociação do memorando, de outras condições, é pura demagogia. Seguro sabe bem que a sua posição perante os credores externos (troika e mercados) só teria qualquer peso se apresentasse soluções, medidas alternativas concretas. Atirar uns bitaites e no fim afirmar que honrará os compromissos, é o mesmo que perder qualquer credibilidade. O certo é que o PS ainda não encontrou capacidade de pressionar a Troika para outro tipo de condições de resgate que garantam, a quem nos emprestou o dinheiro (goste-se ou não), um conjunto de garantias de sucesso para a consolidação da dívida e das contas públicas. Por outro lado, Seguro sabe que está a dar um tiro no pé ao exigir uma renegociação profunda das condições quando não tem qualquer suporte, nem apoio, por parte da Troika.

6. Quando Seguro foi comparado com Hollande na ânsia da conquista do poder, a que poderia ser comparado Passos Coelho depois de tudo o que mentiu aos portugueses e depois de tudo o que fez, com a conivência de Cavaco Silva, para derrubar José Sócrates? Pelos visto, nada…

7. António José Seguro assumir publicamente (o tal patriotismo) a responsabilidade política de liderar um novo Governo no país, acaba por, apesar da legitimidade do “sonho”, de colocar a “cereja em cima do bolo” no desastre que foi esta Moção de Censura: o PS não tem alternativa política para se apresentar a sufrágio, os portugueses não querem, com essa realidade eleições, o país não aguenta, nesta fase, eleições. Isso é radicalismo à esquerda.

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