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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

O Governo caiu. Viva o Governo.

eu_DA_debaixo-dos-arcos.jpgpublicado na edição de hoje, 11 de novembro, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
O Governo caiu. Viva o Governo.

Independentemente do conteúdo a forma é inevitável: há acordo à esquerda para a formação do XXI Governo Constitucional após a queda do XX Governo PSD-CDS nestes dias. Era, e é, o desfecho mais que previsível e expectável.

Ao contrário do que muitas vozes à esquerda querem impor não vejo nenhum papão, como sempre afirmei, no Bloco de Esquerda e no PCP, num acordo à esquerda ou até na formação de um Governo com as várias tendências. São, legitimamente, partidos com lugar e assento na democracia e na vida política portuguesa. A história política já cumpriu o 25 de novembro de 75 e registou uma importante mudança na geopolítica mundial com a queda do "Muro de Berlim" e o fim da cortina de ferro. Não é nada disso que está em causa, embora, verdade seja dita, há uma determinada histeria injustificada em algumas pessoas da direita em relação ao futuro político do país. O que não significa que não haja, por outro lado, a legitimidade na preocupação quanto à instabilidade que possa surgir e quanto ao desfecho negativo deste acordo (o que é, igualmente, previsível e apontado).

O que sempre esteve em causa, tal como foi aqui por inúmeras vezes referido, é a posição do Partido Socialista em todo este processo e a forma (não o conteúdo, até porque esse continua com grande secretismo, pelo menos em parte) como se promoveu este acordo entre PS, BE e PCP.

Uma maioria à esquerda tem toda a legitimidade, em condições normais, de existir e de se afirmar. Isso é a essência da democracia. O que não faz sentido é que o PS, derrotado nas últimas legislativas, em vez de se afirmar com a sua identidade, com responsabilidade e sentido crítico na actual conjuntura política, se reveja no papel de marionete política apenas com ânsia de ser poder.

Com mais ou menos cedências programáticas o principal objectivo do BE e do PCP não é, nem nunca mostrou ser, o de constituir uma alternativa para a governação do país, até porque as diferenças e o fosso ideológico e da concepção da sociedade são ainda significativos em relação ao PS. O principal objectivo do BE e do PCP, tantas vezes sublinhado, é o de, a todo e qualquer custo, impedir a legitimidade democrática da formação de um governo PSD-CDS. O Partido Socialista foi o isco encontrado e tornado refém político, ao ponto de deixar cair, por força das negociações, grande parte da sua bandeira eleitoral das últimas legislativas: o documento estratégico assinado por Mário Centeno (independentemente de este ser o nome mais badalado para futuro Ministro das Finanças, o que, por si só, resulta numa enorme contradição e um claro erro político face às limitações impostas pelas cedências ao acordo com BE e PCP). Por isso nada de estranho se afigura na recusa de ambos, BE e PCP em participarem directamente no Governo PS, libertando-os da responsabilidade governativa, permitindo-lhes terem sempre o PS na "mão" e sobre pressão, por mais compromissos de defesa em eventuais moções de rejeição que tenham sido acordados. Essa é que é a grande questão.

Por outro lado, há também, em toda esta conjuntura política que o país atravessa, uma considerável responsabilidade do PSD, na forma como geriu o período eleitoral, na forma como se afastou dos portugueses nos quatro anos de governação. Mas a verdade, e a bem da verdade, é que não se pode deixar de olhar com algum constrangimento, para os sociais-democratas, para as declarações em entrevista ao jornal Público, há cerca de uma semana, de Pedro Nuno Santos, presidente da distrital do PS-Aveiro e vice-presidente da bancada parlamentar do PS, pelo facto de expressarem uma leitura clara e realista. O responsável socialista afirmava que há uma enorme responsabilidade do PSD no actual momento político porque "o afastamento do PSD do centro permitiu e facilitou o acordo à esquerda". O que, infelizmente, do ponto de vista de qualquer social-democrata (sentido programático) é uma factualidade e uma realidade.