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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

O Plebiscito do PSD Autárquico

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publicado na edição de hoje, 29 de março, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
O Plebiscito do PSD Autárquico

Apesar de ainda não estar concluída a ronda de audição do Primeiro-ministro a todos os partidos com assento parlamentar e à Associação Nacional dos Municípios Portugueses, tudo aponta para que as eleições autárquicas deste ano se possam realizar a 1 de outubro.

Apesar de ainda estarmos longe da conclusão de todos os processos de candidaturas autárquicas, nomeadamente às lideranças dos municípios (o PS apontou o mês de maio para a divulgação dos candidatos cabeças-de-lista e o PSD já apresentou cerca de 90 candidaturas das 160 confirmadas pelas estruturas distritais e nacional).

Apesar de serem já públicos alguns processos controversos, alguns “amuos” partidários que normalmente dão origem às tradicionais roturas e surgimento de candidaturas independentes ou a complicadas operações negociais.

Apesar de ainda não estarem fechadas todas as possíveis coligações partidárias para estas eleições, por exemplo o PSD, apesar do mau estar que o processo autárquico em Lisboa criou entre os sociais-democratas e o CDS, espera fechar cerca de 140 coligações (num total de 308 candidaturas municipais) com os centristas.

Apesar disto tudo, já há muito que as eleições autárquicas ganharam expressão na agenda política não só local como nacional. Todo o caminho que se irá percorrer até à data das eleições e os resultados que daí advenham vão ter impacto no futuro de alguns partidos, estejam eles na oposição, seja o do Governo ou os que suportam a maioria parlamentar.

Por mais que grande parte deste processo eleitoral seja confinada ao escrutínio local, há uma leitura política dos resultados que ultrapassa as fronteiras municipais. Lisboa e Porto e as suas áreas metropolitanas, a repartição de forças partidárias na Associação nacional de Municípios ou nas várias Comunidades Intermunicipais, serão factor de análise político-partidária mais abrangente.

Uma vitória eleitoral do PS representará a sua afirmação na governação do país. Além disso, a confirmação do PCP como partido com cariz autárquico e o aparecimento significativo do BE em algumas autarquias (apenas por uma única vez, e de forma negativa, o BE foi poder autárquico) será um importante balão de oxigénio para os dois partidos garantindo-lhes expressão política que lhes permita poder negocial na coligação parlamentar e expressão política para as legislativas de 2019.

No caso particular do PSD, a antecipação da candidatura de Assunção Cristas em Lisboa e todo o processo na escolha de um candidato para a capital do país que culminou na controversa opção da escola de Teresa Leal Coelho, a incapacidade de gerir o “obstáculo” Rui Moreira no Porto e o surgimento de alguns focos locais de instabilidade e polémica que levarão a inevitáveis conflitos internos, deixam antever extremas dificuldades nas próximas eleições autárquicas, obrigando a um redobrado esforço eleitoral das várias distritais do partido.

Para o PSD este será um momento de extrema importância para a actual liderança de Pedro Passos Coelho e para auferir do estado de força do seu eleitorado. Mas não será nada fácil. A forma como o PSD tem gerido o seu estatuto de oposição política não tem tido significativos resultados com impacto na opinião pública e no confronto com o Governo, prejudicados pelo prolongar da legislatura perante os constantes anúncios de um descalabro e de uma catástrofe governativa que nãos e têm concretizado.

Por tudo isto, uma parte dos cerca de 9 milhões e 390 mil eleitores terão a responsabilidade de confirmarem ou não uma anunciada hecatombe política social-democrata e darem expressão a um notado descontentamento interno.

Por mais que Passos Coelho tente desvalorizar e menorizar os impactos e a realidade internas, as eleições autárquicas de 2017 serão, de facto, um plebiscito claro para o futuro do PSD.

Notas Dominicais... (4)

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Primeira Nota - Presidência americana leva chumbo

Podem-se encontrar os argumentos que se quiserem que a realidade é só uma. A par com os diversos embargos à decisão da Administração Americana de impedir e condicionar o acesso aos Estados Unidos de cidadãos de algumas nacionalidades, o verdadeiro chumbo político para Donald Trump surgiu esta semana.
Aquela que foi uma das principais bandeiras da campanha eleitoral de Trump, a revogação da reforma da saúde conhecida por Obamacare (acesso à saúde e aos cuidados básicos para milhares de americanos) sofreu um colossal revés. Politicamente foi uma significativa derrota e machadada na ainda recente administração Trump.
Pior que ir a votos e ser chumbada, algo que faz parte de qualquer processo democrático, do ponto de vista político e da solidez da governação/administração não podia ter impacto mais negativo para Donald Trump do que retirar do Congresso a proposta de lei que revogaria o Obamacare depois do presidente norte-americano se aperceber que nem no seu partido recolheria os apoios suficientes e necessários. Para além de ser mais que óbvio que a revogação é uma clara afronta aos direitos mais elementares dos norte-americanos, afigura-se agora claro que Trump não agradará, em princípios chave, nem aos próprios Republicanos (seu partido).

Segunda Nota - ainda Jeroen Dijsselbloem (mulheres, copos e dinheiro)

O ministros do Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, deu no final desta semana uma entrevista à TSF e ao Diário de Notícias em que abordou, entre outros assuntos, a questão em torno das declarações polémicas do Presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem.
Na referida entrevista, Augusto Santos Silva afirmou/respondeu a propósito: «A relação de Portugal com o Eurogrupo é a de sempre: Portugal é um participante ativo, empenhado nos trabalhos do Eurogrupo (...). Com o sr. Dijsselbloem a conversa não é possível, porque esta não foi a primeira, nem a segunda, nem a terceira vez que Dijsselbloem se permitiu tecer publicamente considerações que são inaceitáveis.» Ora, de facto, é sabida a posição do Governo português, do Presidente da República, de todos os partidos com assento parlamentar, dos eurodeputados e da própria sociedade portuguesa, sobre as declarações de Dijsselbloem de que os países do Sul da Europa "gastam o dinheiro em mulheres e copos". Tal como já aqui foi expresso as declarações do ainda presidente do Eurogrupo são, a todo e qualquer nível, deploráveis e condenáveis.
Mas com tanta gente no Governo, tanto adjunto ministerial, tantas assessorias, com tantos socialistas avalizados, é, no mínimo, surreal ouvir o ministro Augusto Santos Silva, em entrevista, criticar e tecer juízos de valor sobre Jeroen Dijsselbloem quando o próprio, ainda bem recentemente, apelidou a Concertação Social de "feira de gado".

O lado ‘B’ orçamental

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publicado na edição de hoje, 26 de março, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
O lado ‘B’ orçamental

Independentemente das convicções da oposição e das dúvidas dos parceiros da coligação parlamentar que suporta o Governo, 2016 registou o histórico défice orçamental de 2,1% do PIB. Foi assim encerrada a contabilidade orçamental de 2016, sustentada no relatório do INE, e que regista o marco de ser, nos últimos 42 anos, o défice mais baixo alguma vez conseguido por um Governo e uma inversão considerável na gestão das contas públicas. Ou melhor… uma inversão considerável na gestão de uma parte das contas públicas.

Se o valor de 2,1% prevê que Portugal saia do Procedimento por Défice Excessivo e transformou-se numa bandeira política do Governo de António Costa, a realidade não é consensual e não é apenas pelos partidos da oposição (PSD e CDS). O próprio Presidente da República veio lembrar e afirmar que o feito se deve ao esforço e sacrifício dos portugueses (afinal continuamos com austeridade, mesmo que ela vista outra roupagem); Bruxelas espera por garantias muito específicas que não haverá derrapagens orçamentais (quer ao nível da despesa/receita, quer pelo processo da Caixa Geral de Depósitos); PSD e CDS apontam para o recurso a medidas extraordinárias, para a falta ou escassez de investimento público e lembram que, excluindo o impacto da resolução do BANIF, o défice de 2015 teria ficado nos 3% ou 2,97% (aplicando o rigor decimal do ministro das Finanças, Mário Centeno, ao afirmar que o défice de 2016 é de 2,06%); e BE e PCP acrescentam ainda, tal como a oposição, o elevado valor da dívida pública e o excessivo encargo com os juros. Este é o lado oposto da face do valor do défice atingido em 2016. Não se trata de desvalorizar o feito e o registo alcançado, não só do ponto de vista económico-financeiro mas também como social e político. Muito poucos o esperariam e alguns, caso de Passos Coelho, diabolizavam o processo. Se por um lado o aumento de despesa pública era motivado pela reposição de salários, pelo aumento com as comparticipações sociais, pela redução da sobretaxa, entre outros, importa dar nota, mesmo sem os tais “milagres” ou “habilidades” que referiu o ministro das Finanças, que o aumento da carga fiscal, por exemplo nos produtos petrolíferos, uma melhoria na actividade económica (embora ainda muito baixa e abaixo das previsões governamentais) aumentou a contribuição do IVA e um aumento do número de empregados com o respectivo aumento das contribuições sociais, fizeram contrabalançar o referido aumento da despesa e contribuir para a diminuição do défice pelo lado da receita.

Mas não é verdade, ao contrário do que afirmou Mário Centeno, que não houve, em 2016, o recurso a “milagres” e a “habilidades”, as tais medidas extraordinárias que a oposição referiu. Para tal basta recordar o impacto, não repetível, que o processo PERES teve na arrecadação extraordinária (não repetível) de cerca de quase 600 milhões de euros. Além disso importa lembrar que 2016 trouxe impactos a nível internacional que melhoraram a actividade económica (nomeadamente com as exportações) e permitiram alguma estabilidade ao nível do emprego e do combate ao desemprego, aumentando alguma receita fiscal e algumas contribuições sociais. Mas, acima de tudo, há um outro dado muito importante e com significativo impacto no défice de 2,1%. Os dados apontam para uma redução muito elevada da despesa pública mas que, segundo o próprio INE, resulta de uma queda acentuada do investimento púbico, bastando olharmos para a situação que o país vai vivendo ao nível da saúde e da educação para percebermos esta realidade que está igualmente associada a uma quebra nas receitas dos Fundos Comunitários.

A terminar, importa ainda olhar também para o reverso da medalha deste feito orçamental: o aumento considerável da dívida pública e dos encargos com os juros (que representam cerca de 9,4% da despesa), o efeito que o processo da Caixa Geral de Depósitos possa ter nas contas orçamentais (poderá ser impeditivo da saída do Procedimento de Défice Excessivo) e a aceitação ou mão, por parte de Bruxelas, da inversão do que eram as exigências e as condições da UE: a subida da despesa pública com remunerações e prestações sociais.

É um facto que o Governo conquistou uma importante batalha, a redução do défice de forma relevante e importante. Resta saber se ganhou toda a guerra do equilíbrio orçamental e do controle das contas e da dívida pública.

O lado real dos conflitos

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publicado na edição de hoje, 22 de março, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
O lado real dos conflitos

A história universal está repleta de conflitualidades entre os povos, pelas mais diversas e distintas razões. A verdade é que desde os primórdios tempos da descoberta do fogo, entre nomadismos e sedentarismos, o homem, as comunidades ou os povos, viveram sempre em permanente confronto político-ideológico, religioso e cultural, económico, estratégico e territorial. E apesar de estarmos em pleno século XXI, com tudo o que isso representa em relação ao desenvolvimento das sociedades, da ciência, das comunidades, o mundo está longe de deixar de sentir essa permanente conflitualidade, seja ela do ponto de vista económico (supremacia dos países ricos em relação aos subdesenvolvidos e mais pobres), social e cultural (conflito religioso, ocidente-oriente) ou geopolítico (relação de poder e de força estratégica internacionais). Se o 11 de Setembro de 2001 fazia regressar o mundo aos tempos medievais das cruzadas e das guerras ocidente-oriente, nomeadamente entre os séculos XI e XIII (e não vale a pena disfarçar a realidade porque as responsabilidades são, ou devem ser, repartidas) volvidos 16 anos a conflitualidade bélica, económica, social e cultural, e política tem sido a marca do mundo pós atentados em solo americano.

E se estamos mais sensíveis e despertos para o mediatismo da guerra e dos atentados que a celeridade da informação nos apresenta regularmente, a verdade é que há um outro lado desta realidade que se tem mantido, infelizmente, demasiado oculta. Os jogos do poder político e económico têm um contributo demasiado significativo para a degradação das condições de vida ou da defesa dos direitos humanos mais elementares e fundamentais, para além de exponenciar a conflitualidade bélica entre povos e comunidades.

Há tempos, o Professor Adriano Moreira, em entrevista ao Sapo24, tinha uma expressão feliz que reflecte o “estado de alma” do que é hoje a realidade internacional (relação entre Estados) ou o sentimento demasiado alargado de muitas pessoas e comunidades: «Temos de substituir o 'eu' pelo 'nós'». É esta a actual urgência na alteração de relação entre todos, cidadãos, comunidades, Estados, realidades política, culturais e económicas.

Enquanto essa alteração do paradigma das sociedades de hoje não acontecer continuaremos a ter as mais inaceitáveis notícias sobre refugiados, a maior hipocrisia entre a Europa e a Turquia nomeadamente com as mais recentes trocas de acusações e bloqueios querendo fazer esquecer o deplorável acordo EU-Turquia para os refugiados, o prolongar dos conflitos armados em África e no Médio Oriente.

Continuaremos a ter uma elevada taxa de portugueses que vivem abaixo do limiar da pobreza (mais de dois milhões de portugueses). Além disso, segundo o relatório Confederação Europeia de Sindicatos e do Instituto Sindical Europeu, divulgado este mês em Bruxelas, hoje os salários são mais baixos que há oito anos (2008).
Continuaremos a ter, sem qualquer solução à vista, um Mediterrâneo a servir de cemitério a cerca de 4500 cidadãos por ano, dos quais cerca de 700 são crianças.
Continuaremos a ter 2,1 milhões de moçambicanos em risco de fome.
Continuaremos a ter, apesar do cessar-fogo assinado em Agosto de 2015, um milhão de crianças a precisarem de ajuda na Ucrânia.
Continuaremos a ter uma catástrofe no Iémen que afecta cerca de 19 milhões de pessoas (segundo dados da ACNUR-ONU).
Continuaremos a ter na Somália, a morte, a cada dois dias, de cerca de 100 pessoas devido à fome, três milhões de pessoas em risco de fome devido à seca e mais de 7000 mil deslocados devido ao conflito.
Continuaremos a ter… porque a forma como proliferam e crescem os extremismos e os fundamentalismos, a desintegração das comunidades internacionais e os totalitarismos, só potenciam, tal como espelha o mais recente relatório da Amnistia Internacional, a “retórica tóxica” dos políticos que ameaça os direitos humanos mais elementares.

Esta é a realidade escondida da permanente conflitualidade nas comunidades e entre os Estados que importa não deixar esquecida.

(créditos da foto: Getty Imagens em exame.com)

Obviamente... demita-se e peça desculpa

Para fundamentar uma eventual solidariedade dos restantes países da Europa, nomeadamente do norte, à crise que assolou os países do sul (Portugal, Espanha, Itália e Grécia) e à necessidade destes fazerem frente aos seus desequilíbrios orçamentais e das suas contas públicas, o ministro das Finanças da Holanda e actual presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem argumentou publicamente que é inconcebível "gastar dinheiro em mulheres e copos e depois vir pedir ajuda".

Duas notas...

I.
A liberdade de expressão e de opinião dá o direito a qualquer cidadão de assumir as suas convicções e afirmar as suas ideias. O que significa igualmente o assumir das responsabilidades pelos actos e afirmações que se produzem, principalmente quando se exercem cargos públicos e políticos. A afirmação que proferiu para argumentar e fundamentar o princípio da solidariedade que defende é, no mínimo, condenável, infeliz, injustificada, para além de revelar um sexismo deplorável e o recurso a uma linguagem infundada e dispensável no cargo que exerce.
Lembremo-nos que ainda há bem pouco tempo um eurodeputado polaco foi sancionado pelo presidente do Parlamento Europeu por afirmações públicas sexistas e misogénicas.

II.
Não corresponde à verdade esta realidade solidária dos países do norte da Europa em relação aos do sul.
O que a realidade e a conjuntura europeias nos tem demonstrado é que muita da actual crise estrutural e existencial da União Europeia se deve precisamente pela falta de solidariedade entre os Estados-membros.
O que a realidade nos espelha é que a dificuldade que os países do Sul da Europa, nomeadamente Portugal, Espanha, Itália e Grécia, sentiram (e sentem) em fazer frente a uma crise económica/financeira que extravasou as derrapagens internas orçamentais foi também provocada pela falta de solidariedade entre as economias mais fortes em relação às economias mais débeis. Aliás, as economias mais débeis existentes no seio da União Europeia são-no muito pela falta de solidariedade entre todos e, igualmente, pelo complexo de supremacia e de puritanismo dos países mais ricos em relação aos mais pobres.
O actual presidente do Eurogrupo precisa claramente de rever o seu conceito de solidariedade e de responsabilidade.
É por demais evidente que a Europa, hoje, caminha a duas velocidades, ou mais, face aos desequilíbrios existentes no seu seio, muito por falta de solidariedade entres os Estados-membros.

Em suma, tão grave como as afirmações proferidas é igualmente a sua incapacidade de reconhecer o erro e a gravidade das declarações, e de pedir, publicamente, desculpas.
Desta forma, resta a Jeroen Dijsselbloem um único caminho... a apresentação da sua demissão do cargo de presidente do Eurogrupo. Assim, já terá tempo para, no mínimo, ir beber um copo.

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Mercantilização do ensino

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publicado na edição de hoje, 15 de março, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Mercantilização do ensino

A educação era uma bandeira e uma paixão nas anteriores governações socialistas, como por exemplo, no governo de António Guterres. Na actual governação a educação foi “cavalo de batalha” frente ao ensino privado, mais por força ideológica e imposição do Bloco de Esquerda do que propriamente por vontade programática do PS. Actualmente, o descontentamento face às reformas prometidas e não cumpridas tem aumentado e criado algum desconforto junto da comunidade escolar. A este propósito vieram a público duas circunstâncias recentes que merecem nota de destaque, aliás, por falta de oportunidade já deviam ter sido, aqui, referenciadas. Primeiro, a notícia, divulgada ontem pelo jornal i que dava nota da polémica entre o ministério da Educação e as escolas quanto às ausências das reformas curriculares para o próximo ano lectivo. E este facto leva-me a recordar a excelente reportagem que a TVI apresentou em meados de Janeiro, com a assinatura da jornalista Alexandra Borges, sob o título “Negócio dos Manuais Escolares” e que no passado domingo teve novos desenvolvimentos com o exemplo da gratuidade e da reutilização dos manuais escolares nos Açores.

As duas grandes reportagens, exemplos do que pode e deve ser o jornalismo de investigação (a relevância do tema, a apresentação dos factos e da sua veracidade, os exemplos e entrevistas e o direito ao contraditório), levantam interessantes questões sobre um dos temas mais polémicos na educação e que toca ao universo escolar e a milhares de famílias nem que seja uma vez por ano (Setembro). Sobre a qualidade do trabalho jornalístico que a Alexandra Borges apresentou não restam dúvidas. Aliás, se a investigação jornalística não tivesse sido tão assertiva não teria havido lugar a significativa contestação por parte de professores, escolas e editoras, porque, como diz, e bem, a sabedoria popular «quem não se sente não é filho de boa gente», com ou sem razão. A reportagem teve o condão de alertar, de incomodar, de suscitar massa crítica, de revelar publicamente o que corresponde o pesadelo anual de muitas famílias em cada início dum ano escolar no que respeita aos manuais escolares. Bem como o outro lado da moeda (a oposição à actual realidade) espelhado no exemplo das práticas aplicadas na Região Autónoma dos Açores, se bem que não se afigura propriamente fácil replicar o processo para uma escala nacional. No entanto, esta questão das reformas curriculares e dos manuais escolares suscita-me outra reflexão: a questão da responsabilidade governativa e política.

Tendo em conta as abordagens apresentadas na reportagem da TVI da jornalista Alexandra Borges, havendo uma óbvia mercantilização e um claro negócio sombrio neste processo dos manuais escolares, não podemos deixar de responsabilizar o Governo (e muitos governos anteriores) e o ministério da Educação pela situação e realidade descritas.

Podemos (e eventualmente devemos) criticar a posição das editoras mas não podemos, igualmente, deixar de recordar o carácter privado e económico do âmbito da sua actuação (comércio). O que já não é admissível é a forma como o Governo (ou os governos), por inércia, desresponsabilização, falta de capacidade política, pactua e é conivente com a realidade.

E não seria muito difícil, houvesse vontade e coragem política, para além da necessária reforma do sistema de ensino actual, alterar o estado da arte. Por um lado, a criação de comissões multidisciplinares, na esfera do ministério, que fossem responsáveis pela reforma e definição curriculares, bem como pela elaboração de manuais únicos, iguais para todas as escolas do país. Manuais esses que deveriam ser impressos e distribuídos (comercializados) pela Imprensa Nacional Casa da Moeda, retirando do “mercado livreiro e editorial” a mercantilização e o negócio pouco claro de todo o processo.

Desta forma retirava-se o pesadelo anual do deitar ao “lixo” centenas de euros em manuais que não servem para os anos seguintes; acabava o pesadelo das alterações fictícias anuais que levam a escusadas e dispensáveis edições novas; haveria a capacidade para uma diminuição considerável no preço dos manuais e, consequentemente, dos próprios apoios sociais escolares do Estado; haveria uma maior equidade na aprendizagem e no exercício da docência em todo o país; haveria uma melhor selecção de manuais mais condizentes com as reformas curriculares e as políticas e princípios pedagógicos do ministério; entre outros. O que o país, as escolas, os professores, as famílias e, principalmente, os alunos dispensam é este paralelo assobiar para o lado do Governo e do Ministério da Educação face a esta realidade. Este governo e muitos outros para trás.

(adenda ao texto: as três peças de investigação jornalística da Alexandra Borges - repórter TVI - podem ser revistas aquiaqui e aqui)

Alguma justiça... pelo menos como exemplo

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O mês de março iniciava-se com as polémicas, condenáveis e abjectas declarações do eurodeputado polaco a poucos dias do Dia Internacional da Mulher, aqui retratado (A questão de altura, força e QI.) e destacado pela equipa do Sapo.

Felizmente, as várias reacções junto do Parlamento Europeu viram alguma luz ao fundo do túnel. Não tenho a certeza de se ter feito justiça, mas pelo menos houve um sinal positivo por parte do Parlamento Europeu no que respeita à liberdade de expressão/opinião e a defesa da dignidade humana e dos mais elementares direitos humanos fundamentais, ao caso, os direitos das mulheres.

Repito que não sei se foi feita justiça mas pelo menos que sirva de exemplo e de aviso.

Na altura o eurodeputado polaco, Janusz Korwin-Mikke, afirmou, em pleno plenário e sem qualquer tipo de constrangimento ou pudor, que as mulheres devem receber menos salário do que os homens porque são mais fracas, mais frágeis e menos inteligentes.

Volvidos pouco mais de 15 dias o Parlamento Europeu sancionou o ignóbil eurodeputado com a exclusão do plenário por um período de 10 dias, a perda de ajudas de custo diárias durante 30 dias e a proibição de representar o Parlamento Europeu durante um ano.

É pouco perante o que esconde a afirmação proferida: o crescimento do fundamentalismo e do extremismo, a defesa da misoginia, do racismo, da homofobia e da xenofobia.

A hipocrisia europeia

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Ainda estão bem frescos na memória de muitos os contornos polémicos e cinzentos que estiveram na base do recente eventual golpe de Estado na Turquia a 15 de julho de 2016. Mais ainda, não foram ainda esquecidas as várias purgas políticas e sociais que ocorreram nos dias e meses consequentes. Ainda mais... é hoje bem patente a forma como o regime de Erdogan se tem mantido no poder e tem alterado a sua estratégia geopolítica, muito por força da crise na Síria e no Iraque e pela maior proximidade à Rússia de Putin.

Não há como esconder a realidade política e social que a Turquia vive nos dias de hoje, nem deixar de condenar e criticar Erdogan e a actual conjuntura política turca.

Mas o que não dá também para esconder é a contínua hipocrisia política da União Europeia e da maioria dos seus Estados-membros em relação a este país que faz a fronteira entre o Ocidente e o Oriente.

Primeiro, pelo arrastamento e indefinição do processo de adesão, ou não, à Comunidade Europeia.

Depois, e no seguimento dos mais recentes confrontos diplomáticos, políticos e sociais, entre a Turquia, a Alemanha e agora a Holanda, em plena semana eleitoral nos Países Baixos. O confronto diplomático, os bloqueios e as trocas de acusações políticas são o mais recente espelho de uma Europa sem rumo e sem deriva, sem futuro e objectivo. A mesma Europa que ataca veemente Erdogan e o universo político e social turcos é a mesmíssima Europa que, sem saber lidar, sem ter uma estratégia comum e solidária, sem respeito pelos direitos humanos, pagou, mercantilizou, à Turquia para resolver o problema, com o qual não soube, nunca soube e dificilmente saberá, lidar dos Refugiados.

É a total perda da coerência.

Offshore pariu um rato

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publicado na edição de hoje, 12 de março, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Offshore pariu um rato

Andava o país inquietantemente à espera e à espreita trocadas entre o ministro das Finanças, Mário Centeno, e o ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos, António Domingues, quando, de repente, a modos que caídos do nada, surgem 10 milhões de euros e 20 declarações não tratadas pela Autoridade Tributária de transferências para Offshores e que provocam um tsunami na agenda política nacional e, igualmente, no universo dos provérbios populares ou tradicionais: «março, marçagão.. de manhã no BES… à tarde nas Ilhas Caimão». A verdade é que a polémica tem tido contornos díspares e tem surgido como um tiro no pé no que respeita à sua implicação política, embora não consiga livrar-se dessa amarra.

Primeiro, foi o ex-Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do Governo PSD-CDS, o centrista Paulo Núncio que, não conseguindo dar uma explicação coerente e consistente sobre a polémica, acabou por assumir responsabilidades políticas que, pouco tempo depois, se verificaram serem desajustadas, ao ponto de apresentar a sua demissão de todos os cargos que ocupava no CDS-PP. E quando toda a maioria que suporta o Governo afiava facas e segurava alguidares para a imolação política do ex-Secretário de Estado é, curiosamente, o actual titular da pasta dos assuntos fiscais no Governo de António Costa, o próprio tão badalado interveniente no caso das viagens ao Europeu de Futebol, Rocha Andrade, que acaba por salvar politicamente o seu anterior homólogo e a própria oposição. O actual Secretário de Estado do Governo do PS afirmaria mesmo que não tinha “nenhum facto que indicie qualquer indicação política ou técnica para ocultação de dados”. Mais ainda, justificou o caso como um erro informático na utilização de um software descontinuado que não processou integralmente a informação e não numa intenção política. Mas a vertente política continuaria, apesar de, nessa fase, entrar já em campo a Procuradoria-geral da República por suspeitas de eventual procedimento criminal. Isto porque, nesta fase, o nome BES voltou à estampa. Dos 10 milhões de euros grande parte provinha do antigo banco liderado por Ricardo Salgado, sendo que a este facto acresceria outro que obrigou a maioria que sustenta a governação a redefinir a estratégia política inicial: as vinte declarações que fugiram ao controlo da Autoridade Tributária não eram exclusivas do período de governação PSD-CDS; sete delas já estariam dentro do período de responsabilidade governativa do actual Governo socialista. E nesta fase desabava quase toda a estratégia da “geringonça” para atacar PSD e CDS e desviar as atenções do que era, até então, a marca principal na agenda política nacional: a Caixa Geral de Depósitos.

Ao ser descoberto o envolvimento significativo do BES em todo o processo soaram novos alarmes e as baterias viraram-se, de novo, para o Banco de Portugal, para Carlos Costa e para a questão da supervisão do sistema bancário e financeiro. Só que esta nova realidade deixou isolado o Bloco de Esquerda nesta luta. A questão da falha do sistema de supervisão não é uma realidade apenas imputável a Carlos Costa, ela é muito mais antiga e reporta-nos, por exemplo, até aos anos de governação do Banco de Portugal pelo socialista Vítor Constâncio. O problema não está em Carlos Costa mas sim procedimento de regulação e supervisão, ou seja no próprio sistema. Mas o “voo” dos 10 milhões para offshores, apesar das reviravoltas, teima em manter-se na esfera política. O Bloco de Esquerda sabendo, apesar dos anúncios, que muito dificilmente o Partido Socialista demitirá Carlos Costa, já que o mesmo foi reconduzido pelo actual Governo, a estratégia do BE passa agora por partidarizar o Banco de Portugal (basta recordar a recente escolha de Francisco Louça para o Conselho Consultivo do Banco de Portugal) e pela desvalorização do papel do banco central português e do Governador ao ser avançada a eventual criação de uma entidade que fiscalize e se sobreponha à actividade reguladora bancária e financeira em Portugal. No fundo, uma polícia financeira do Estado que coloca em causa a independência institucional do Banco de Portugal.

Infelizmente, à parte disto tudo, as questões que importaria discutir e avaliar ficaram esvaziadas: há ou não matéria criminal no processo (relembre-se a afirmação do presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, Paulo Ralha: «nas transferências para as offshores, os impostos já foram pagos, o problema é a origem do dinheiro»)? Há ou não vontade política e governativa para alterar legislação e procedimentos que tornem a supervisão mais eficaz e eficiente? O que irá ser feito para impedir novos “apagões” na Autoridade Tributária? É ou não possível acabar ou limitar as offshores? Isto para que tudo não fique na mesma, com mais ou menos publicação de listagens. Já chega de Portugal assistir a montanhas a parirem, constantemente, os respectivos ratos.

O ar puro político… exemplo de Ílhavo

Publicado na edição de hoje, 8 de março, do Diário de Aveiro

Debaixo dos Arcos
O ar puro político… exemplo de Ílhavo

A cada "travessia do deserto" (período entre eleições) surgem as "tempestades" políticas inerentes aos processos eleitorais, sejam eles internos (partidos), sejam eles públicos (eleições legislativas ou autárquicas, como exemplo).

Com o aproximar das eleições autárquicas agendadas para o início do último trimestre deste ano (tudo aponta para que em outubro) surgem as tricas (e as ‘trincas’) partidárias internas, a ânsia pessoal do poder, as invejas políticas, as questionáveis e criticáveis profecias eleitorais demagogas. E com tudo isto surge também o lado negro dos partidos (das suas estruturas locais, distritais ou nacionais), da política e dos políticos: a falta de ética, de transparência e a transposição para o espaço público de uma imagem degradada da essência e dos alicerces do dever político e público.

É geral e transversal, infelizmente... basta recordar o que veio a público e foi tema de conversa em cada esquina em Aveiro em relação ao PSD local; basta olhar o que tem sido a dificuldade do PS-Aveiro para encontrar o seu candidato (não que já seja tarde... começou foi demasiado cedo, e mal, o processo); basta recordar o que são os vários casos de roturas partidárias como, por exemplo e já aqui abordado, Eduardo Conde em Ílhavo; ou o caso do deputado parlamentar eleito pelo círculo de Braga do Partido Socialista, Domingos Pereira (candidato à autarquia de Barcelos); o surgimento (como em 2013) de inúmeras candidaturas independentes por rotura partidária como foi o caso em Anadia, em Oeiras, e que agora retomam os apoios partidários e concelhios... e seria longa a lista por esse Portugal fora.

Em todos estes processos há um denominador comum: a forma de fazer política e a forma de alguém se servir da política (em vez de servir a política). E é lamentável porque só demonstra que não é nenhuma irrealidade ou demagogia o que revelam demasiados estudos quanto ao afastamento dos portugueses em relação à política, aos partidos e aos políticos.

Mas tal como nos livros de Astérix (de Albert Uderzo e René Goscinny) há sempre algumas comunidades e estruturas que resistem a esta rotura e degradação. São aqueles que, politicamente, respiram "ar puro" (político, entenda-se). Ar puro pela forma desinteressada (a nível pessoal), responsável e ética com que enfrentam os desafios dos cargos políticos e públicos que assumiram perante as suas comunidades e os seus eleitorados. Ar puro pela forma como mantêm a defesa dos seus valores, princípios e convicções políticas, independentemente das adversidades, dos obstáculos, das perspectivas não concretizadas ou das desilusões

A expressão "ar puro político", reconheça-se, não é minha... é a "adulteração" da expressão usado por Carlos António Rocha, presidente da Concelhia do PSD-Ílhavo, aquando da sua tomada de posse (juntamente com a da JSD-Ílhavo) no passado recente (dia 18 de Fevereiro).

No discurso da sua tomada de posse, segundo noticiava a imprensa local e regional, Carlos António Rocha afirmou que “Ílhavo é um Município onde se respira muito bem". Respira política apenas interessada nas comunidades e nas suas pessoas, respira ética política, respira sentido de unidade entre as várias estruturas políticas e públicas (por exemplo, Distrital e Concelhia dos PSD e Câmara Municipal), respira responsabilidade pública, respira respeito pelos princípios partidários, pela herança e pelo passado políticos. E respira bem porque há trabalho feito; há empenho no serviço da causa pública; há respeito pelos cidadãos, pelas entidades e pelas instituições, da comunidade; há uma relação estreita entre o poder da governação local e o poder político partidário.

De fora, ficaram os interesses pessoais, as tricas político-partidárias, a ânsia pela cadeira do poder a qualquer custo, o renegar as convicções e os princípios partidários e ideológicos... e também ficou de fora o rasgar de todo um passado político assente em compromissos e em responsabilidades partidários.

Politicamente respira-se bem em Ílhavo e será ar puro que servirá (ou devia servir) de exemplo para muitos outros municípios e estruturas partidárias (sejam elas de que “cor” forem), bem como um excelente exemplo de como se gere exemplarmente um "condomínio autárquico". Na plenitude.

Um dos piores dias do ano...

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8 de março... Dia Internacional da Mulher.

A luta teve início ainda no século XIX, por volta de 1909 ou 1910. Prolongou-se por anos e anos a fio, sem ver, em pleno século XXI, em 2017, o seu fim. Só em 1977 a ONU reconheceu o Dia Internacional da Mulher (fixando a data neste dia 8 de março) sem que, hoje, o dia seja celebrado em todo o mundo (longe disso... 67 países dos 193).

Volvidos 107 anos, chegados a 2017, este é um dia de vergonha para as sociedades e as comunidades (recordando o que já aqui referi há seis dias).

Haver descriminação salarial e laboral em função do género para os mesmos cargos (por exemplo, na UE as mulheres ganham menos 16,3% que os homens)...
Haver descriminação social por se ser mulher (desde 1974, nos cargos governativos em Portugal houve a nomeação/eleição de 1609 homens e apenas 154 mulheres, sendo que demorámos cerca de 38 anos para termos, pela primeira vez, uma mulher como presidente da Assembleia da República)... isto sem esquecer os números da violência doméstica ou que o risco de pobreza continua a ser mais elevado para as mulheres do que para os homens...
Haver descriminação cultural por se ser mulher (o menosprezo pelo papel e pelo valor da mulher em determinadas sociedades, culturas e religião, incluindo a Igreja Católica; a mutilação genital feminina em muitas sociedades e culturas, nomeadamente em África mas também, por exemplo, com reflexos em Portugal)...
Haver desigualdades e descriminação no acesso ao emprego e a determinados cargos em função do género...
Haver quem, por ser mulher, em 2017, seja vítima de escravidão, sexismo e assédio sexual...

Tudo isto é motivo mais que suficiente para que, passados estes 107 anos, ainda hoje seja, vergonhosamente para a sociedade e para os homens, necessário registar o Dia Internacional da Mulher.

Devia ser ridículo e vergonhoso, nos dias de hoje, haver a necessidade de registar um dia onde se reclama, legitimamente, o cumprimento dos mais elementares e fundamentais direitos humanos: a igualdade ou a não descriminação em função do sexo, idade, raça, religião ou credo.

É vergonhoso...

Je Suis... mas só quando dá jeito

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Não há nada mais falso que o conceito de alguma esquerda (repito... alguma esquerda) sobre democracia e liberdade. Precisamente aqueles que a propósito de tudo e mais alguma coisa invocam o direito à liberdade de expressão e opinião ou, até, agitam aos sete ventos as conquistas de Abril de 74 (ao mesmo tempo que fazem por esquecer, porque interessa, as conquistas de novembro de 75.

E é esta falsa ou demagoga democracia e liberdade que assombra (assombrou) e remete à exclusão parte da esquerda (da mesma forma que, do lado oposto, renega ao desprezo o extremismo de direita): esta ilegítima apropriação da liberdade, esta abominável higienização de pensamento e convicções.

Infelizmente (como sempre apontei) é esta esquerda que se coligou ao PS e que, "também", nos vai governando.

Declaração prévia de interesses, antes de continuar: não me move qualquer empatia por Jaime Nogueira Pinto. Nem sim, nem não... antes pelo contrário. É-me indiferente. Isto apesar de lhe reconhecer conhecimento histórico e político, como historiador e politólogo.

O que não consigo descortinar, por maior que seja o exercício de memória, é alguma posição ou afirmação pública de Jaime Nogueira Pinto racista, xenófoba, que coloque em causa os direitos fundamentais da dignidade humana, de algum extremismo nacionalista.

Ainda há alguns meses Jaime Nogueira Pinto fez parte de um trio que compôs o painel de uma conferência em Cascais juntamente com Francisco Seixas da Costa e Francisco Louçã, segundo relatou na sua página do facebook o próprio ex-diplomata. E nada ocorreu... nem uma manif, um boicote ou uma ameaça.

É, por isso, inconcebível que num Estado de Direito, volvidos mais de 40 anos após o 25 de Abril de 74, e logo num espaço onde os conceitos de liberdade, de pluralismo, de democracia, devem merecer especial atenção e respeito (a Escola, o Ensino Superior, públicos) haja amarras e mordaças à liberdade e à democracia, inaceitáveis, só pelo simples facto de alguém poder pensar ou falar diferente.

Jaime Nogueira Pinto tinha uma conferência agendada por um núcleo de estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa sob o título (mais que inofensivo e até mais que actual) "Populismo ou democracia? O Brexit, Trump e Le Pen em debate". Nada mais do que algo que é tema corrente do debate público nos dias de hoje face às conjunturas geopolíticas actuais. Nada mais simples até que um grupo de estudantes, sabido próximo ou do Bloco de Esquerda, decidiu mostrar o que mais negativo comporta a esquerda extremista: o totalitarismo (que tanto combate se for no lado oposto), a falta de respeito pela liberdade de opinião e pelo pluralismo. Até que conseguiram boicotar e impedir a realização da conferência.

Dos bloquistas não se ouviu, até agora, qualquer comentário. Verdade seja dita, pelo contrário, muitos socialistas insurgiram-se com críticas bem consistentes. Felizmente e meritório.

Isto não é só lamentável... é, acima de tudo, condenável e perigoso para a democracia e para a liberdade que tanto custou a conquistar. Vergonhoso.

O "Je Suis" só quando é a nossa verdade ou só quando nos interessa é mera hipocrisia e atentado à democracia.

Não tendo qualquer empatia por Jaime Nogueira Pinto não posso deixar de defender o que é, para mim, um princípio mais que elementar e fundamental: “Não concordo com o que dizes, mas defenderei até a morte o direito de o dizeres" (Evellyn Beatrice Hall - biógrafa de Voltaire).

Je Suis... sempre!

A questão de altura, força e QI.

Ou melhor dizendo... como a estupidez humana nos revela seres abomináveis e deploráveis. E não é, infelizmente, de tempos a tempos... é regular e frequentemente.

A notícia é, em primeira instância, revelada pelo El País (a fonte recolhida é através do Diário de Notícias).

Um eurodeputado polaco, Janusz Korwin-Mikke, em pleno Parlamento Europeu, afirmou, com justificações completamente surreais e vergonhosas, que as mulheres deviam receber menos salário que os homens porque, pasme-se, são "mais fracas, mais pequenas e menos inteligentes". E as justificações são inqualificáveis: "sabem que posição as mulheres ocupavam nas olimpíadas gregas? A primeira mulher, digo-vos eu, ocupou a posição 800. Sabem quantas mulheres há entre os primeiros 100 jogadores de xadrez? Eu digo: Nenhuma". Isto.. assim, a seco.

Mas há, infelizmente, o outro lado da moeda desta condenável realidade.

Primeiro, é que a dita personagem foi eleita e houve quem nele votasse.

Segundo, numa foto recolhida de uma campanha eleitoral é perfeitamente visível, junto aos apoiantes do ignóbil eurodeputado algumas mulheres.

Terceiro, como é que é possível o Parlamento Europeu ter destas personagens pré-históricas, com afirmações políticas e públicas desta natureza, e, apesar da reacção de alguns eurodeputados, o Parlamento Europeu ainda ir reflectir e pensar se haverá ou não lugar a sanções?

Dia 8 de março é o Dia Internacional da Mulher... infelizmente ainda há muito para conquistar e percorrer. E estamos em pleno século XXI.

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O ar puro político - exemplo de Ílhavo

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A cada "travessia do deserto" (período entre eleições) surgem as "tempestades" políticas inerentes aos processos eleitorais, sejam eles internos (partidos), sejam eles públicos (eleições legislativas ou autárquicas, como exemplo).

Com o aproximar das eleições autárquicas agendadas para o início do último trimestre deste ano (outubro) surgem as trincas partidárias, a ânsia do poder, as invejas políticas, as questionáveis profecias eleitorais. Com tudo isto surge igualmente o lado negro dos partidos (das suas estruturas locais, distritais ou nacionais): a falta de ética política e a exposição na opinião pública de uma imagem degradada da essência do dever político e público.

É geral... basta recordar o que veio a público em Aveiro em relação ao PSD; basta olhar o que tem sido a dificuldade do PS-Aveiro para encontrar o seu candidato (não que já seja tarde... começou foi demasiado cedo o processo); basta recordar o que são os vários casos de roturas partidárias como, por exemplo, Eduardo Conde em Ílhavo; ou o caso do deputado parlamentar Domingos Pereira (Barcelos); o surgimento (como em 2013) de inúmeras candidaturas independentes por rotura partidária como por exemplo em Anadia... e seria longa a lista por esse Portugal fora.

Em todos estes processos há um denominador comum: a forma de fazer política e a forma de alguém se servir da política (em vez de servir a política). E é triste porque só demonstra que não é nenhuma irrealidade ou demagogia o que revelam demasiados estudos quanto ao afastamento dos portugueses em relação à política, aos partidos e aos políticos.

Mas tal como nos livros de Astérix (de Albert Uderzo e René Goscinny) há sempre algumas comunidades e estruturas que resistem a esta rotura e degradação. São aqueles que, politicamente, respiram "ar puro". Ar puro pela forma desinteressada (a nível pessoal),  responsável e ética com que enfrentam os desafios dos cargos políticos ou públicos que assumiram perante as suas comunidades e os seus eleitorados.

A expressão "ar puro político", reconheça-se, não é minha... é a "adulteração" da expressão usado por Carlos António Rocha, presidente da Concelhia do PSD-Ílhavo, aquando da sua tomada de posse (juntamente com a da JSD-Ílhavo) no passado recente (dia 18 de fevereiro, há cerca de oito dias).

No discurso da sua tomada de posse, segundo noticiou a Rádio Terra Nova, Carlos António Rocha afirmou que Ílhavo "é um Município onde se respira muito bem". Respira política apenas interessada nas comunidades e nas suas pessoas, respira ética política, respira sentido de unidade, respira responsabilidade pública, respira respeito pelos princípios partidários, pela herança e pelo passado políticos. E respira bem porque há trabalho feito, há empenho no serviço da causa pública, há respeito pelos cidadãos, pelas entidades e pelas instituições, da comunidade.

De fora, ficaram os interesses pessoais, as trincas político-partidárias, a ânsia pela cadeira do poder a qualquer custo, o renegar as convicções e os princípios partidários e ideológicos... e também ficou de fora o rasgar de todo um passado político assente em compromissos e em responsabilidades partidários.

Politicamente respira-se bem em Ílhavo e será ar puro que servirá de exemplo para muitos municípios e estruturas partidárias, bem como um excelente exemplo de como se gere bem um "condomínio autárquico". Na plenitude.