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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

É pró-menino e prá-menina

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publicado na edição de hoje, 30 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
É pró-menino e prá-menina

A semana ficou marcada pela polémica entre o “azul” e o “rosa” centrada na edição, por parte da Porto Editora (mas não caso único), de dois blocos de actividades para crianças diferenciados com base no sexo (rapaz/menino, rapariga/menina). Apesar da publicação ter quase um ano (em Portugal temos sempre esta infelicidade com os delays temporais) a referenciação pública levou às mais díspares opiniões e condenações, confinadas ao tradicional “pró e contra”.

A polémica tem várias vertentes e é social e politicamente relevante, ao contrário do que muitas vozes que se indignaram contra a legítima indignação querem fazer crer e menorizar. Há, em pleno ano de 2017, no pleno Portugal do século XXI, um estereótipo e um preconceito profundamente enraizado no que respeita à questão da igualdade de género. E não são pormenores ou peanuts. É um país, nesta área, substancialmente retrógrado, parado no tempo, medieval. Esta é a realidade dos factos.

Logo à cabeça surge a falta de percepção, de noção ou até de honestidade intelectual que impede a noção do sentido da “igualdade de género”. É óbvio, por mil e uma razões (que me abstenho de elencar por entender que ferem a inteligência de qualquer pessoa), que o menino é diferente da menina, o rapaz da rapariga, o homem da mulher. Ponto. É a vida… é da vida. Não é, nem nunca foi isso que está ou esteve em causa. Usar esta argumentação é reveladora de uma clara insuficiência cognitiva (antigamente dizia-se mesmo “burrice”). O que está em causa é a igualdade de oportunidades, de direitos, de respeito, de dignidade, independentemente do género. É tão simplesmente isto que grande parte da sociedade portuguesa ridiculariza, menospreza, desvaloriza, mesmo que isso continue a espezinhar e a ofender muitas meninas, raparigas e mulheres. Não se trata de questionar uma publicação só porque uma é azul (menino) e outra é cor-de-rosa (menina), o que por si só já é estúpido. Trata-se de questionar a necessidade de um bloco de actividades diferenciado para menino ou menina quando, pela missão pedagógica e educativa da Porto editora, se esperava e exigia uma publicação única para crianças. E também se esperava de uma editora que não houvesse tratamento desigual quanto à aprendizagem ou capacidades cognitivas baseadas no género (ao contrário do que há quem queira fazer crer para desvalorizar a indignação, o parecer técnico da Comissão para a Igualdade de Género referencia seis exercícios de dificuldade acrescida diferenciados no livro “azul” e quatro no livro “rosa”). Por essa razão teremos no futuro manuais escolares diferenciados, testes escolares diferenciados, exames diferenciados e regressaremos (cantando e rindo) às escolas diferenciadas para rapazes e raparigas. Mas, lamentavelmente, a questão da indignação não se limita ao estereótipo da diferenciação da cor ou da publicação diferenciada. A sociedade está mesmo carregada de preconceitos de género: a descrição e referenciação do menino ligado às actividades de ar livre, ao desporto, às ferramentas, enquanto a menina se apresenta no mundo das fadas e princesas, das actividades domésticas, é abjecta e abominável. É preconceituoso e é estereotipado.

Assim como é condenável o recurso à manipulação política do tema. A Comissão de Igualdade do Género tem uma missão e uma responsabilidade mais que óbvias e, infelizmente, necessárias face ao frágil desenvolvimento social e cultural do país. Importa recordar (como fez e bem a Fernanda Câncio num recente artigo no Diário de Notícias, “Isto só lá vai com educação”) o plano, ainda em vigor, para a igualdade de género traçado pelo governo de Passos Coelho: «é tarefa fundamental do Estado promover a igualdade entre homens e mulheres" e "dever inequívoco de qualquer governo reforçar a intervenção no domínio da educação, designadamente com a integração da temática da igualdade de género como um dos eixos estruturantes das orientações para a educação pré-escolar». Sem mais comentários. Isto não é uma causa de esquerda ou direita.

Mas para aqueles que acham e tratam a questão da igualdade de género como uma minudência e uma obsessão ideológica ou fracturante de uma minoria, é importante relembrar: a necessidade de legislar para a inclusão (cotas) de mulheres em listas eleitorais; as mulheres ganham, em média, menos 16,7% que os homens (menos 165,06€ a menos), sendo que nos quadros superiores (habilitações qualificadas) essa diferença aumenta para os 26,4%; em média as mulheres dedicam mais 1:13 hora às tarefas domésticas que os homens; as mulheres ocupam apenas 13% dos cargos de gestão empresariais; valores que, tendencialmente, têm aumentado e não diminuído. Isto já para não falarmos dos valores da violência doméstica ou das restrições laborais por motivos da condição maternal.

Claro que dar a um menino um brinquedo cor-de-rosa é torná-lo potencialmente efeminado. Um perigo, portanto.

O Reencontro... com Daniela Guerreiro

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"O Reencontro" é o primeiro filme da Daniela Guerreiro e projecta na tela a aventura de um jovem que percorre o Caminho de Santiago, por trilhos portugueses e espanhóis, ao (re)Encontro com vivências intensas, com descobertas que transformam, com o presente e as memórias vivas de outras gerações, que permitem construir uma forte interioridade e que permitem um Reencontro consigo. Um caminho difícil, tortuoso, solitário, mas rico de experiências.

Este é o seu primeiro sonho tornado realidade. O seu primeiro filme como realizadora e argumentista, com estreia marcada para o dia 2 de setembro, às 21:00 horas, no Centro Cultural e de Congresso de Aveiro, não é mais do que o primeiro passo para trilhar futuros caminhos e muitos mais e excelentes "Reencontros".

Quisemos saber o porquê, o como e o futuro. A Daniela Guerreiro revelou-nos tudo... sem esconder nada.

(Debaixo dos Arcos) É perceptível que este filme resulta de um sonho bem claro de abraçares a projectos cinematográficos e a realização. Está concretizado o sonho... Mas porquê um filme sobre o percurso dos Caminhos de Santiago? O que levou à escolha deste tema? Poderia ser sobre a emigração jovem, sobre um Reencontro mas numa ida a Fátima, sobre tanta outra coisa... mas foi sobre algo que ainda é, apesar de secular, muito restrito e obscuro aos olhos da maioria dos portugueses.
(Daniela Guerreiro) É difícil escolher o tema de um filme, confesso. Eu tinha vontade de fazer um projeto cinematográfico e passei muito tempo a pensar sobre o que deveria retratar. Conversei e partilhei essa minha vontade com pessoas de confiança e acabou por suscitar essa ideia dos Caminhos de Santiago. Depois foi preciso tempo para a desenvolver. O tema em si tem muita história e há cada vez mais pessoas, de várias idades, a querer passar por essa experiência. Achei que poderia ser interessante retratar essa realidade. Os peregrinos têm um espírito e entrega incríveis – quem por lá passa é que o sabe bem! Por outro lado, a nível de produção, como implicaria viagens e uma logística maior porque a cada dia estávamos mais longe de casa – também seria um desafio maior para mim.

(DB) Como é que surgiu a selecção do elenco, da equipa técnica? Como é que conseguiste reunir à tua volta este interesse por um filme com esta temática?
(DG) Posso dizer que sempre que apresentava o projeto a alguém tinha imensa recetividade. Apesar de tudo, o que estava a proporcionar era uma experiência única, intensa e desafiadora. O Gabriel [actor principal] eu já conhecia e foi das primeiras pessoas com quem falei sobre a ideia – ainda nem nome tinha. Em relação ao elenco, procurei referências junto de pessoas que já estivessem no meio e pesquisei muito – dentro daquilo que precisava e das personagens que tinha idealizado. Relativamente à equipa técnica, tentei arranjar pessoas com experiência para cada um dos cargos que tinha. Alguns acabaram por ser pessoas que tinham estudado na minha faculdade, nem todas no meu ano.

(DB) Acredito que o que te tenha dado mais prazer, onde te terás sentido mais feliz, foi teres um resultado final, chegares ao fim do projecto, fazer (agora) a sua apresentação pública. Mas o percurso adivinho que não terá sido fácil.
(DG) O percurso não foi nada fácil. Pelo contrário… Até partir em viagem, pensei em ligar para toda a gente a dizer “Não venham!”. Deu muito trabalho preparar tudo ainda para mais quando tinha 14 pessoas (contando comigo) à minha responsabilidade. Mas foi muito bom! Aprendi a lidar com imprevistos, com pessoas diferentes, a sair dum ambiente em que me sentia confortável. Esta experiência mostrou-me que não há impossíveis. Foi uma grande lição! Perceber que me superei a mim mesma, com tantas adversidades, faz-me sentir orgulhosa deste projeto, de quem participou e de quem o apoiou.

(DB) Em recente notícia do Diário de Aveiro afirmaste que uma das maiores dificuldades foi a vertente dos apoios. Sentiste esta dificuldade porque as várias entidades e empresas não apostam no cinema ou foi por algum cepticismo em relação ao projecto?
(DG) A maior parte das empresas fecham-se a patrocínios e apoios, fogem só de ouvir falar. E comparando com outros países, em Portugal a cultura não é uma área onde por si hajam muitos apoios. Muito menos quando se fala no nome de alguém desconhecido. Eu tinha uma folha – frente e verso – com nomes de empresas a quem pedi apoios - monetários e em produtos… Apresentei o projeto via email, pessoalmente ou por telefone de acordo com aquilo que conseguia. Perdi muitas horas em frente ao computador e ainda mais ao telefone. A minha lista resumiu-se a poucas entidades. Era a realidade que tinha e tive de me adaptar a isso. Como se costuma dizer – poucos e bons! Estou muito grata… a quem apostou no meu filme e confiou em mim. Procuro não os desiludir. Até para não fechar portas de outras pessoas que sonham como eu.

(DB) Aconteça o que acontecer (e vão acontecer coisas boas no próximo sábado, de certeza) o filme está pronto, a estreia vai realizar-se. O sonho está concretizado. E agora? Como é que vai ser daqui para a frente, no futuro, a tua faceta comunicacional? Não acredito que este vá ser "filho único".
(DG) Estou muito concentrada neste "filho" que também eu espero que não seja o único. Tenho várias ideias, mas tenho de dar a este o tempo que ele precisa. Quero encher o auditório do Centro Cultural de Congressos de Aveiro e viver esse dia na sua plenitude. É meu e ninguém mo vai tirar da memória. Depois quero chegar a várias localidades, mostrar o meu trabalho a Portugal inteiro e quem sabe, percorrer o mundo. A minha faceta comunicacional fica sempre, as imagens e histórias também falam...

Aveiro tem o privilégio de ser o primeiro local escolhido para a estreia deste "O Reencontro" que terá lugar no dia 2 de setembro, às 21:00 horas, no Centro Cultural e de Congressos de Aveiro, com entrada livre. Uma estreia que promete mexer com Aveiro.

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Apontamentos semanais (*)

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publicado na edição de hoje, 27 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Apontamentos semanais
(*)

Pena é que uma semana como a que passou incendiada nas redes sociais não tivesse sido o único palco dos incêndios em Portugal. Pelo menos estes não trariam os impactos que os reais, infeliz e tragicamente, têm espalhado.

1 A tragédia dos incêndios e dos atentados terroristas não preencheu a semana só com vítimas e destruição; houve claros impactos políticos e polémicas à mistura. Não se percebe como há ainda quem estranhe ou se admire com as acções do Presidente da República. Goste-se ou não, não há nada que não tivesse sido mais que expresso por Marcelo ainda durante o período eleitoral (a Presidência dos Afectos). Prefiro claramente um Presidente presente, activo, próximo e atento, do que um inquilino em Belém munido apenas do dever de promulgação ou do direito ao veto ou ainda publicamente visível nos primeiros dias de cada ano, a cada 25 de abril ou 10 de junho. Fez muito bem Marcelo Rebelo de Sousa em marcar presença pronta nos incêndios (ainda ontem em Oleiros), na Madeira ou em Barcelona. É esse o seu papel e a sua função. O que já não é tão claro e cristalino é a acção do Governo na gestão das crises. António Costa, a ministra da Administração Interna, o ministro da Agricultura, entre outros (ao contrário do que aconteceu com o ministro da Defesa no caso de Tancos) têm demonstrado (e não estou a falar de responsabilidades) uma notória falta de agilidade e desenvoltura política e governativa na gestão das tragédias e das calamidades. No fundo, de tudo o que foge à normalidade da governação, nomeadamente da preocupação da gestão do défice e das contas públicas. Não dá para disfarçar, apesar da disponibilidade e da presença, que a acção do Governo tem sido pautada e orientada pelas iniciativas e pressões presidenciais de Marcelo. O Presidente não governa, nem tem governado, mas neste verão tem sido notoriamente o líder e motor da governação.

2. A Secretaria de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa “incendiou” as redes sociais, esta semana, com a declaração pública sobre a sua orientação sexual, em entrevista ao Diário de Notícias. Facto… fez história. Facto… inquestionavelmente com coragem política (e pessoal, diga-se). Face às reacções, concretamente aqueles que criticaram e condenaram a afirmação, é óbvio que a declaração de Graça Fonseca é mais que justificada, é demasiado importante, é, política e socialmente, reveladora. Só quem não passa pela sabor da exclusão, da diferença e da indiferença, de ser minoria, de ser ostracizado, preterido, de ter de esconder ou disfarçar as suas legítimas opções individuais, de não ter acesso aos mesmos direitos, é que pode achar que o preconceito que, infelizmente, persiste em pleno século XXI, deve prevalecer como motor da sociedade estereotipada. Graça Fonseca fez mesmo história na política nacional. O que se lamenta é que a sociedade portuguesa, hoje, em 2017, ainda se surpreenda com tais realidades porque do resto da entrevista, das afirmações políticas e governativas da Secretária de Estado nem uma linha, nem um comentário. Triste.

3. Porque é que tem que ser “pró-menino e prá-menina”? Não seria mais que suficiente e correcto ser apenas “prá-criança”? Claro que sim. Num país que tem uma das maiores desigualdades de género da Europa, onde as mulheres trabalham mais horas, recebem menos salário e têm menos direitos, era perfeitamente dispensável haver descriminação em função do género. Mais ainda, era dispensável que a polémica tivesse tido origem naqueles que deveriam primar por uma pedagogia de igualdade de direitos, através do conhecimento e do saber. A Porto Editora (e outras editoras… porque, infelizmente, há mais) errou, falhou a todos os níveis (publicação, explicações e reacção). O pormenor do azul e rosa é o menos da questão. Não passa de um pormenor estúpido. Mas editarem um livro de actividades para crianças diferenciado no grau de dificuldades cognitivas das tarefas entre rapaz e rapariga é, no mínimo dos mínimos, deplorável e desprezível. E esteve ainda muito mal a Porto Editora que precisou de uma recomendação (escusada) da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género e de um coro de críticas (que nem os poucos elogios abafaram) para retirar do mercado os livros de actividades. Era escusado… primeiro porque erraram em publicar (nem sequer deveriam ter colocado essa possibilidade); segundo… porque não souberam reconhecer o erro e não assumiram, por iniciativa própria, a retirada da publicação.

(*) semana de 19 a 27 agosto

Moderação festiva

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Em 2016 e no primeiro trimestre de 2017 qualquer indicador financeiro que o Governo, com mérito (diga-se), atingia era motivo para imediato regozijo, festividade e anúncios público com toda a pompa e circunstância. Contextos, aliás, sublinhados pelos partidos de apoio parlamentar que aproveitavam todos os momentos para atiçar as críticas à governação de Passos Coelho como se a memória dos portugueses fosse curta, deixássemos de recordar o que foi a transição governativa em 2011, com responsabilidades para o Bloco de Esquerda, ou o período de resgate externo.

De repente deixámos de ouvir, por parte do Governo, do PS e do BE e do PCP, os foguetes no ar... e não é pelas restrições que advêm dos cuidados com os riscos de incêndios neste período de verão (algo que, irresponsavelmente, por esse país fora, nem todos cumprem e acatam).

A verdade é que sobre cada anúncio do cumprimento das metas orçamentais ou da redução da taxa de desemprego, surgia o outro lado da moeda: não se alterava o paradigma do sistema bancário, agravado pela realidade da CGD; surgiu a engenharia financeira das cativações, as quais o próprio BE não quer (não pode) contestar de forma clara e transparente; surgiu o novo dado do INE sobre o desemprego real que se situa acima dos 16%; o paupérrimo estado da saúde e do SNS; as trapalhadas na educação; entre outros e só para simplificar.

Entretanto surgia o excelente (e é, de facto) valor do crescimento do PIB, acima da média europeia, na ordem dos 2,8% (apesar de menor que os expectáveis 3%) e surge agora o anúncio do ministro das Finanças de que o país está em condições de cumprir as metas orçamentais para 2017, sendo que julho deste ano registou uma diminuição em cerca de 23% do défice das contas publicas em relação ao mesmo período do ano passado. Importa, no entanto, registar que no final do ano haverá lugar ao pagamento de 50% do valor do subsídio de Natal e não haverá repetição do PERES. Importa ainda sublinhar que o aumento registado nas receitas fiscais, como por exemplo 6,1% nas contribuições para a Segurança Social ou os 4,1% de IRS, resultam em grande medida pelo aumento do rendimento do trabalho (salário mínimo, reposição de cortes, etc) e não exclusivamente pela criação de novos empregos.

E porque é que há contenção do Governo nas festividades? Algo que, em termos de comunicação política, até seria compreensível para retirar a atenção da polémica com a gestão dos incêndios.

A verdade é que há sempre o outro lado da realidade... como se costuma dizer "não há bela sem senão".

Há quatro dias o Banco de Portugal revelou que o endividamento da economia portuguesa (onde se incluem as dívidas do estado, das Empresas privadas e das famílias e dos cidadãos) aumentou consideravelmente neste primeiro semestre do ano para os 132,4% do PIB (sendo que em igual período de 2016 ela era de 130,3%) situando-se nos 726 mil milhões de euros (um acréscimo de cerca de 10,9 mil milhões de euros). Por outro lado, só a dívida pública (Estado) voltou a subir e está agora muito próxima dos 250 mil milhões de euros.

Apesar das expectativas de inversão da tendência para 2018, a verdade é que nos últimos 10 anos o número de insolvências em Portugal triplicou o seu valor.

Por último, importa lembrar dados relevantes do Eurostat ou da OCDE. Por exemplo, o Eurostat situa Portugal como um dos países da União Europeia e da Zona Euro onde despesas como alojamento/habitação, água, electricidade e gás, representam 18% do valor mensal das despesas familiares. Já o estudo da OCDE lembra que em Portugal 6% dos portugueses revelou não ter ido ao médico por falta de dinheiro. Algo que um inquérito da Universidade de Lisboa concluía, no final de 2016, 30% alteraram os seu hábitos quotidianos e cerca de 13% comem pior. Isto sem esquecer que a chamada (?) classe média baixa, com rendimentos mensais até aos 2600 euros (casal com um ou dois filhos) não consegue realizar qualquer tipo de poupança.

Ainda há pouco mais de três ou quatro anos o país (eu incluído) insurgia-se com uma expressão do então líder parlamentar do PSD. Luís Montenegro, que afirmava que "a vida das pessoas não está melhor mas o país está muito melhor". A realidade deu razão a Luís Montenegro... a vida das pessoas está na mesma apesar do défice do país estar bem melhor. Só que agora anda tudo, à esquerda, convenientemente caladinho.

No tenim por

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publicado excepcionalmente na edição de hoje, 21 Agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
No tenim por
(*)

Os últimos e recentes momentos são de luto, de dor e de tragédia: incêndios, devastação, mortes, ataques terroristas. Foi no Pinhal Interior, no interior centro e sul do país, na Madeira, em Barcelona e em Cambrils (acrescentando-se ainda, com contornos por clarificar à hora da escrita deste texto, o atentado em Turku, na Finlândia). No caso das Ramblas e Cambrils, a Europa volta a ser alvo de dois hediondos ataques terroristas reivindicados pelo Daesh, apesar de várias notícias recentemente difundidas que davam conta de uma eventual fragilização na liderança e nos recursos do movimento radical islâmico. No entanto, no espaço de poucas horas e de escassos quilómetros de distância, dois atentados provocam 14 mortos e mais de uma centena de feridos, duas das quais portuguesas, num total de quase 40 nacionalidades.

A Europa voltou a ser alvo do extremismo e da fúria do radicalismo islâmico assente nos três pilares dogmáticos: social, religioso e político. O transtorno da normalidade do dia-a-dia, a instalação do pânico, do medo e da insegurança, a conflitualidade e a divisão multicultural, são objectivos claros da acção das células terroristas no seio das comunidades. A negação e o combate aos valores da sociedade ocidental por oposição aos valores do Islão, são os óbvios objectivos religiosos desta jihad menor. Por último, a reacção às acções da comunidade internacional, nomeadamente no médio oriente, que têm, ao longo de décadas (para não precisarmos de recuar muito mais nas memórias da história), criado na região uma instabilidade política, social e económica completamente desastrosa, espelha o combate político.

Novamente, em plena Europa, os nossos valores, costumes, princípios e modo de vida, foram atacados “por e de dentro”, por cidadãos europeus nos seus plenos direitos de cidadania. Mas, a par com a revolta e a solidariedade inequívocas, há algumas inquietações que os factos me suscitam.

  1. Por mais discursos e momentos de solidariedade que possam exprimir a dor e a revolta, das cerca de 40 nacionalidades representadas pelas vítimas dos atentados na Catalunha quantos governos não são responsáveis pela instabilidade política, económica e social do Médio Oriente (com a Síria à cabeça, sem esquecer a “amiga” norte-americana e europeia Arábia Saudita) e no coração africano, que tem levado ao surgimento e propagação do radicalismo islâmico?
  2. O ressurgimento do populismo e xenofobismo (islamofobia). Não faltou muito, poucas horas apenas, para que se instalasse a confrontação (discursiva ou mesmo física) entre aqueles, nos quais me incluo, que defendem a integração e o multiculturalismo, que acham que o drama dos refugiados nada tem a ver, directamente, com esta realidade, que a jihad menor não é apenas executada na Europa mas sim nos próprios países muçulmanos (mas é tão fácil esquecer a Síria, África, Afeganistão, Mossul, …, só porque é lá a “terra deles”); e os que preferem erguer muros e fronteiras, barreiras sociais e físicas contra a defesa da dignidade da pessoa humana e dos seus fundamentais direitos, liberdades e garantias inerentes a cada cidadão, muito para além das fronteiras do nosso quintal, bairro, comunidade ou país. E isso é um dos principais objectivos que motivam os jahidistas.
  3. No caso concreto, alargado a todos os atentados até agora realizados, a comunidade islâmica radicada na Europa tem publicamente condenado as acções dos radicais e extremistas. Mas é importante que os responsáveis por essas comunidades passem a ser, definitivamente de uma vez por todas, parte activa no combate ao terrorismo porque é no seu seio que surgem estes mujahidin. Importa lembrar que só na Catalunha estão mais de metade das mesquitas erguidas em território espanhol, algumas centradas no islamismo mais conservador. Não basta condenarem publicamente se o seu dia-a-dia é inconsequente no que respeita ao contributo para o fim das células terroristas.
  4. Por último, é inequivocamente louvável a forma como as comunidades que sofrem os atentados reagem, positivamente (mesmo com a dor e a revolta), a cada acto ignóbil e indigno que atenta contra o valor da vida humana e a sua dignidade. O regresso imediato, mesmo que a custo, à normalidade é algo que perturba o sucesso destas acções e dos seus autores. Daí que não seja perceptível o comportamento da comunicação social no tratamento informativo destes contextos, com a difusão excessiva e massiva de imagens das vítimas e dos impactos da tragédia, a proliferação repetitiva (e muitas vezes banalizada) dos directos e depoimentos, a divulgação dos rostos e nomes dos criminosos transformados, dessa forma, em mártires e exemplos vindouros, colocando em causa a própria responsabilidade social inerente à sua génese e missão. É contraditório, é perfeitamente escusado, é evitável, sem que isso menorize a qualidade informativa e o rigor da notícia. Importa distinguir interesse público de “interesse do público”.

(*) “No tenim por” significa, em catalão, “Não temos medo”

(créditos da foto: Lluis Gene/AFP - in Veja.com)

Duas perguntas que nunca ouvi colocarem...

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Dois meses passados sobre a tragédia de Pedrógão Grande e do Pinhal Interior o inferno dos fogos não tem dado tréguas às populações e a diversas comunidades. Aliás... tem sido verdadeiramente devastador.

Desculpem-me os meus amigos fotojornalistas e fotógrafos... mas esta imagem (que tem a assinatura de Lucília Domingues (que desconheço, deparei-me com a foto no mural da jornalista Rosa Veloso) espelha de forma perfeita a realidade do flagelo dos incêndios desta ano da graça de 2017: a devastação provocada pelos incêndios; a dor de se perder tudo; o isolamento de muitas aldeias; o envelhecimento demográfico; a solidão a que estão votados muitos idosos por esses meios rurais fora.
Este é um excelso quadro (foto) do Portugal em pleno verão de 2017. Pela dureza da foto... SOBERBO.

Não me vou alongar nas considerações políticas dos atrasos das ajudas, das falhas do SIRESP, da "lei da rolha" com os briefings, se há ou não responsabilidade política governativa por apurar, para além de outras responsabilidades. Já aqui foi abordada, bem ou mal, alguma da vertente política dos incêndios (É fogo que arde e se vê.) e aqui (Deixem o eucalipto em paz).

Acho é que sabe a muito pouco que a acção governativa e parlamentar tenha ficado pela "mordaça comunicacional criada" com os briefings da ANPC e pelo ataque ao Eucalipto e às Celuloses (basta olhar para as localidades e parar as áreas ardidas para perceber o desnexo de tal medida e preocupação política). Assim como é muito pouco ficarmos à espera dos resultados da comissão independente criada para apuramento de responsabilidades e causas dos acontecimentos do final de junho no Pinhal Interior (Pedrógão Grande, Figueiró de Vinhos e Castanheira de Pêra), relatório que só deverá ser apresentado por volta de Outubro, até porque o país não estava preparado para este contínuo devastar do património ambiental, urbano e empresarial de inúmeras comunidades provocado pelos sucessivos incêndios que têm lavrado sem parar. O Pinhal Interior acabou por ser o rastilho e não um caso isolado apesar de trágico e dantesco.

Não vou, por outro lado, entrar em teorias da conspiração que envolvem as tradicionais questões de corrupção, compadrios, whatever, relacionados com o combate aos incêndios. Há umas décadas era a questão do valor da madeira; alterada a legislação os incêndios não pararam. Veio depois o recurso aos incêndios para alterações de PDMs e especulação imobiliária; houve rigor, mais transparência, mais fiscalização mas os incêndios continuaram. Agora vem o fantasma do negócio dos meios aéreos (embora eu defenda que deviam estar sob a responsabilidade da Força Aérea Portuguesa) e das próprias corporações dos bombeiros e da Protecção Civil. Se há desconfianças ou provas dessas teorias há entidades e espaços próprios para serem tratados (Ministério Público, Tribunais).

Pessoalmente continuo a defender que as políticas relacionadas com os incêndios (prevenção e combate) devem abordar a questão da demografia; do envelhecimento das comunidades; da desertificação e despovoamento não só do interior mas de todo o meio rural; a dispersão populacional e territorial; o abandono das terras; da reforma (já iniciada) da floresta mas que vá muito para além do eucalipto; a transferência de responsabilidades na gestão da prevenção e combate para as Comunidades Intermunicipais e para o Poder Local; entre outros...

Mas há duas questões que me provocam alguma inquietação:

1. O INE divulgou um estudo que revela haver, no activo, cerca de 28000 bombeiros (já nem me vou referir às afirmações do Presidente da Liga dos Bombeiros, Marta Soares, sobre estas questão porque são surreais). No entanto, o número máximo eu ouvi/li de operacionais no terreno foi cerca de 6000 (no total das ocorrências) e num espaço temporal muito curto (3 ou 4 dias). Isto é cerca de um quinto (1/5) dos bombeiros no activo. Então os outros 22000?

2. Há uma ânsia partidária e social de haver "fuzilamento político" na gestão do combate dos incêndios. Isto é transversal porque importa recordar o número de militantes socialistas de Pedrógão Grande que se desfiliaram e entraram os seus cartões de militantes. Mas sobre esta questão das responsabilidades há algo que me inquieta. Em toda a fase de prevenção, em todo o período chamado de "época baixa", fora do período charlie, qual foi a acção de fiscalização e de prevenção das autarquias, nomeadamente daquelas que agora exigem toda a responsabilidade e apoios a outrém, aos governos (sim... no plural), à ANPC, etc? E a sua própria responsabilidade na administração e fiscalização do seu território?

Isto não ouvi perguntar, nem encontro respostas.

(créditos da foto:

É preciso tê-los no sítio...

A isto podemos chamar inúmeras coisas com a certeza que, infelizmente, não é para qualquer um.

Consciência, Respeito pela Dignidade Humana, Cidadania, Liberdade, Coerência, Personalidade, ... (podem continuar).

O nadador espanhol Fernando Álvarez pediu à organização do Mundial de Masters de Budapeste, em que está a participar, que fosse feito um minuto de silêncio antes da realização das provas em homenagem às vítimas do atentado de Barcelona. A organização recusou. “Não se pode perder nem um minuto”, foi a resposta da organização da prova de veteranos ao nadador espanhol.
Álvarez não se conformou e, quando chegou a sua vez de competir, na prova dos 200 metros bruços, quando todos os outros nadadores partiram, o espanhol ficou quieto e em silêncio durante um minuto na prancha, e só depois partiu, acabando por perder a prova.

(fonte: Observador)

a prova dos nove. Exemplar...

A importância de nos "reencontrarmos"

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Quem de nós nunca procurou ou quem nunca necessitou, como ar que respiramos, de um Reencontro consigo mesmo, com a sua interioridade, com a redefinição de um "Eu" mais consistente e mais fortalecido?

São inúmeros os meios que se podem descobrir para atingir esse objectivo... são vários os caminhos que podem ser percorridos até essa descoberta, até esse Reencontro.

Um desses caminhos que permite um intenso Reencontro é o "Caminho de Santiago" que a jovem aveirense Daniela Guerreiro soube, majestosamente, espelhar numa curta metragem.

"O Reencontro" é o primeiro filme da Daniela Guerreiro e projecta na tela a aventura de um jovem que percorre o Caminho de Santiago, por trilhos portugueses e espanhóis, ao (re)Encontro com vivências intensas, com descobertas que transformam, com o presente e as memórias vivas de outras gerações, que permitem construir uma forte interioridade e que permitem um Reencontro consigo. Um caminho difícil, tortuoso, solitário, mas rico de experiências.

Aveiro tem o privilégio de ser o primeiro local escolhido para a estreia deste "O Reencontro" que terá lugar no dia 2 de setembro, às 21:00 horas, no Centro Cultural e de Congressos de Aveiro, com entrada livre. Uma estreia que promete mexer com Aveiro.

Cerca de 34 minutos vão deixar-nos, garantidamente, pregados ao ecran também à procura dos nossos "reencontros".

Um filme, uma viagem, uma aventura, um REENCONTRO que merecem ser descobertos.

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Daniela Guerreiro é uma jovem aveirense, com 23 anos, que após a conclusão da licenciatura em comunicação social e o estágio na RTP (Lisboa e Porto) lançou-se no seu próprio reencontro pessoal e profissional.

Este é o seu primeiro sonho tornado realidade. O seu primeiro filme como realizadora, argumentista e também produtora, com estreia marcada para o dia 2 de setembro, não é mais do que o primeiro passo para trilhar futuros caminhos e muitos mais e excelentes "Reencontros". Garantidamente...

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Para além do horizonte político

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publicado na edição de hoje, 16 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Para além do horizonte político

Não há memória de uma silly season tão pouco politicamente silly como este período de férias político-partidárias deste ano. Em parte devido ao período eleitoral autárquico que se aproxima e que há mais de um ano tem vindo, a espaços, a animar as hostes político-partidárias, não só locais, como, em alguns casos, ampliadas, que mais não seja pelas polémicas, para o âmbito nacional. Por outro lado porque a ambiência e vivência política neste período, normalmente dedicado e preenchido pelos fait divers, têm sido substancialmente férteis em polémicas, em casos, em conjunturas e circunstâncias, em conquistas e em medidas falhadas. É quase caso para podermos usar o expressionismo popular “há de tudo como na farmácia”.

Para o Governo as áreas das finanças e da economia tem servido de bandeira política para a demonstração do sucesso da gestão socialista do país. E, de facto, não há como esconder ou contrariar a realidade: Portugal cumpriu, acima do esperado, as metas orçamentais exigidas pelos tratados e compromissos europeus; Portugal saiu de alguns dos constrangimentos e das regras dos Procedimentos por Défice Excessivo; a taxa de desemprego situou-se abaixo dos nove pontos percentuais e os últimos dados divulgados pelo INE apontam para um crescimento histórico do PIB, nas duas últimas décadas, em 2,8%.

Só que quando olhamos para o mar há muito mais para além da linha do horizonte ou quando olhamos para a floresta temos que ver muito mais que uma ou duas árvores. E aqui, o recurso à expressão “floresta” não é, de todo, inocente. A forma como o Governo não tem tido a capacidade de assumir responsabilidades ou de incutir responsabilidades e, essencialmente, de gerir a tragédia que tem sido o flagelo dos incêndios (já muito para além do caso de “Pedrógão”), em toda a sua dimensão (humana, material, económica, demográfica, ambiental) é demasiado grave. Como começa a ser grave a tentativa de encobrimento político de uma realidade que está à vista de todos sob a capa ou o subterfúgio do compromisso partidário do “não aproveitamento político da tragédia”. Se é verdade que é deplorável que alguém faça bandeira política da tragédia humana (qualquer que ela seja) não é menos condenável e criticável que o Governo tente fazer cair no esquecimento a sua responsabilidade governativa, como é tão apanágio das governações neste país (a culpa morre sempre solteira: já lá vão mais de dois meses sobre a tragédia do Pinhal Interior, já lá vai mais de um ano sobre a tragédia dos fogos na Madeira, já lá vão 16 anos sobre a tragédia da ponte Entre-os-Rios, em Castelo de Paiva… só como exemplos). E, no entanto, o país continua tragicamente a arder sob a mísera preocupação política de uma fútil obsessão ideológica do BE pelo “único” culpado até à data: o infeliz do eucalipto e a diabolização da celulose.

Há ainda o outro lado da linha do horizonte ou o resto da floresta. Todo o, legítimo, direito do Governo em fazer a “festa” com os resultados da vertente económico-financeira da governação deveria implicar, simultaneamente, um assumir de preocupação pública perante outras realidades que são demasiado relevantes para o destino do país e não em teimar em varrer os problemas para debaixo do tapete como se vivêssemos num “mar de rosas” (literalmente).

Os dados do desemprego divulgados pelo INE divulgam, pela primeira vez, uma outra realidade: o desemprego real (aquele que vai muito para além da subsidiação social) situa-se nos 16,6% (cerca de 900 mil portugueses), valor demasiado alto, com impacto no valor do emprego.

Por outro lado, importa não esquecer os importantes recados do Tribunal de Contas que colocam em causa o rigor e a transparência nas contas públicas. Já é demasiadamente badalada a polémica em torna das cativações que reduzem a responsabilidade social do Estado na gestão do país, como o caso da educação e da saúde. E no último caso não deixa de ser preocupante a informação recentemente divulgada que demonstra que, nos últimos cinco meses, os pagamentos em atraso só nos hospitais subiu 195 milhões de euros. Mais… enquanto o Governo mantém (ou agrava) a austeridade camuflada por via indirecta, recorre ao perdão fiscal para incumpridores criando uma enorme injustiça no fisco, desagrava as responsabilidades do sistema bancário à custa dos contribuintes (algo tão convenientemente ignorado por BE e PCP), a dívida pública aumentou 18 mil milhões de euros e o défice da balança comercial voltou a aumentar com as importações a vencerem o valor das exportações em cerca de 6 mil milhões de euros. Por último, apenas como exemplo, apesar do aumento do salário mínimo nacional, das pensões mais baixas e da reposição progressiva dos salários, segundo os últimos dados divulgados pela OCDE, Portugal é o penúltimo país com a taxa mais baixa de poupanças dos cidadãos (-4,1%). Além disso, um em cada quatro portugueses (25,1%), cerca de dois milhões e seiscentos mil encontram-se no limiar da pobreza e da exclusão social.

Preocupa o outro lado da moeda que o Governo teima em varrer para debaixo do tapete sob o “assobiar para o lado” e BE, PCP e sindicatos.

Já não é possível evitar...

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Há um cansaço enorme numa grande parte da população portuguesa...
Há um desespero enorme em muitos portugueses...
Há uma frustração e uma desilusão consideráveis na sociedade e nas comunidades...
Há dor, luto, devastação que não pára, não estanca... que acende e reacende constantemente.

BASTA! É demasiada terra queimada, demasiada floresta devastada, demasiado património desfeito, demasiadas mortes (nem que fosse uma apenas), demasiados feridos, demasiada dor, sofrimento, medo, pânico... demasiado!

E não dá para conter mais. Não sou, de forma alguma, defensor da "caça à bruxa política", da leitura demasiado simplista das "responsabilidades políticas" de quem tutela e de quem governa. Isso é demasiado fácil e é, de facto, querer subjugar a realidade ao jogo da politiquice. Não se faz, não se pode fazer, política com a tragédia, seja ela humana ou apenas material. É uma total falta de respeito pela dignidade humana. Facto.

Mas há um ponto, um momento, em que já não é suportável o silêncio, em que não é possível conter a crítica, em que não é possível permitir confundir ética política com inoperância e ineficácia. E não podemos continuar a aceitar o argumento da ciclicidade dos factos ou da realidade. É verdade que há uma passividade longínqua e transversal a várias governações na gestão dos incêndios florestais de verão. Mas o passado não pode continuar a servir de desculpa até porque, a cada mudança governativa, a cada nova legislatura, tem que corresponder políticas diferentes, acções de governação distintas. Não faz sentido que tudo continue igual. O actual Governo já tinha tido um aviso há precisamente um ano com a tragédia dos fogos na Madeira, tinha tido a oportunidade de redefinir e repensar estratégias e novas políticas. Tudo ficou igual.

Se a realidade deste ano, do após Pedrógão Grande e todo o Pinhal Interior (e já lá vão dois meses), não produz qualquer efeito na gestão política deste grave problema que assola, a cada Verão, o país, cada vida, cada sofrimento, cada perda, cada gesto de solidariedade, perdem todo e qualquer sentido ou respeito. E isso tem que ter uma responsabilidade política que não pode ficar por um "banal" sistema de comunicações falhado ou por uma fútil obsessão ideológica sobre um dos principais instrumentos económicos nacionais (celuloses) ou a diabolização do eucalipto.

É preciso muito mais e não podemos ficar paralisados sob a capa do "não aproveitamento político das tragédias" porque isso não pode significar, mais uma vez, que a responsabilidade se perca no tempo e que a "culpa volte a morrer solteira". Isso é demagogia política.

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Era tão escusado, porra (desculpem o meu "francês")

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Já vão meses e meses a fio da mesma conversa mas não há, porque há quem teime em forçar as situações, como fugir da realidade.

É deveras importante para a sobrevivência do partido que Pedro Passos Coelho se mentalize, de vez, de duas coisas:
1. apesar de ter ganho as eleições, apesar de ser mais que óbvio o objectivo do BE e do PCP, a verdade é que a solução governativa com o apoio parlamentar, criticável, é democraticamente legítima. Ponto. Há que fazer o "luto político" e seguir em frente. Mas seguir de forma consistente, coerente, como alternativa aos olhos dos muitos portugueses descontentes, apreensivos e com inúmeras dúvidas. Algo que, nestes quase dois anos, não se tem visto. Mesmo nada.
2. é importante que o PSD, enquanto oposição e com a experiência governativa ao longo dos vários períodos e momentos da história da democracia portuguesa, se preocupe com o país real, o do dia-a-dia dos cidadãos, o das causas e com o seu futuro. E não andar constantemente com tiros nos pés, a atirar a alvos que nada têm de relevante. É importante que se apresente como alternativa e alerte os portugueses para o outro lado da moeda do "mar de rosas" que hipnoticamente vive o país. Porque a geringonça não cai antes dos quatro anos. Não vale a pena sonhar acordado ou com realidades quase que diríamos impossíveis (embora não haja impossíveis em política).

Passos Coelho tem que deixar, a bem do partido, de caçar bruxas, de perseguir fantasmas, de não ter a humildade política para reconhecer alguns dos sucessos, mais que óbvios (é a vida democrática), deste Governo. A verdade é que o défice diminuiu para valores abaixo dos esperados, em dois anos; a verdade é que o PIB atingiu, a meio deste ano (2º trimestre), um valor de crescimento histórico na última década (2,8%); a taxa de desemprego (desempregados inscritos) baixou a fasquia relevante dos 9% (8,8%); o salário mínimo nacional e as pensões aumentaram; foram repostos cortes salariais de forma progressiva, tal com, aliás, o governo PSD-CDS o previa. Isto entre outros...

Esperava-se, por isso, que Pedro Passos Coelho, no arranque do "combate político legislativo" e com o aproximar das eleições autárquicas de 1 de outubro, tivesse a capacidade de virar a página e olhar em frente com propostas, com alternativas, com esperança para os portugueses. Mas no Pontal tudo correu mal quando havia tudo para correr de forma positiva.

Como social-democrata só me posso sentir envergonhado e acredito que Sá Carneiro tenha corado de vergonha. Não é possível, não acredito, que um Partido que tem na sua génese e no seu lema "Paz, Pão, Povo e Liberdade", caia no populismo (a que alguns, cobardemente, chamam de "polarização da sociedade") ou no "trumpismo" absurdo, xenófobo e racista. Já não bastava o tiro no pé com a continuidade do apoio a um determinado desprezível candidato autárquico para Passos Coelho escorregar tão facilmente no facilitismo retórico. «O que é que vai acontecer ao país seguro que temos sido se esta nova forma de ver a possibilidade de qualquer um residir em Portugal se mantiver?» Isto não aconteceu... isto é renegar os princípios básicos e fundamentais do PSD, é cortar com as nossas origens, com os nosso valores epistemológicos. Isto não tem a ver com qualquer (des)contexto.. foi desvario, desnorte, desespero político. O discurso do medo, do populismo, da rotura e exclusão social, tinha andado, felizmente e ainda bem, tão arredado da política do PSD. Até ao fim-de-semana... e isto é pura e simplesmente lamentável e condenável.

E havia tanto por onde "pegar".

É importante não esquecer que BE e PCP, por mais que o queiram disfarçar e por mais hipocritamente o não queiram assumir, suportam o Governo e com ele (Governo e PS) determinam as políticas governativas actuais. Bastava criticar, com frontalidade, a entrada em vigor do chamado "imposto Mortágua" que é um verdadeiro flop e ilusão fiscal e apenas tem como suporte uma cega e fútil ideologia obsessiva. Bastava perguntar onde andam BE e PCP com a elevada carga fiscal indirecta que dá continuidade crescente à austeridade; onde andam BE e PCP quando Centeno ilibia e perdoa quase 4000 incumpridores fiscais apenas para garantir as metas do défice; onde andam BE e PCP quando falamos de um perdão ao sistema bancário através das alterações das regras do Fundo de Resolução da banca ou quando aumentam as comissões na CGD (somado todo o sistema são 5 milhões de euros/dia em comissões), para além do fim dos tectos salariais da administração do banco público; onde andam BE e PCP quando aumentam exponencialmente os chamados Vistos Gold que tanto, mas tanto, criticaram anteriormente; onde andam BE e PCP quando as alterações às regras do RSI facilitam os incumprimentos e a deturpação das mesmas regras; ... .

E mais... não pode o Primeiro-ministro manter esta postura em relação aos incêndios. Não pode, sob a capa e a camuflagem do acordo de princípio partidária do aproveitamento político da tragédia, tentar varrer para debaixo do tapete responsabilidades e a óbvia incapacidade para tratar desta tragédia que já vai muito para além de Pedrógão Grande, Castanheira de Pêra ou Figueiró dos Vinhos. Portugal não pode voltar a viver o esquecimento a que foram votadas famílias das vítimas de Entre-os-Rios ou do ano passado na Madeira. E já lá vão dois meses e o inferno continua a alastrar e a desbastar o país. A única solução? mais uma factura ideológica do BE (a obsessão pelas celuloses e pelo eucalipto, o menor dos problemas dos incêndios) para o PS e o Governo pagarem a troco do suporte parlamentar.

Além disso, não se compreende o alheamento do (ainda) líder do PSD em relação ao valor real do Desemprego, divulgado pelos últimos dados do INE, e que se situa acima dos 16% (quase o dobro do valor do desemprego de 8,8% e perto de um milhão de portugueses).
Não se compreende a quase despreocupação com as cativações orçamentais que reduzem o país ao mínimo do investimento e ao mínimo da responsabilidade social do Estado (as mais elevadas nos últimos 8 anos, segundo a UTAO), como na justiça, na educação, na cultura, e na saúde, onde, por exemplo, a dívida dos hospitais, nos últimos cinco meses, aumentou 195 milhões de euros.
Não se compreende como se deixa cair no esquecimento que, em Maio deste ano, o INE tenha avançado com dados que revelam que cerca de 2,6 milhões de portugueses viviam no limiar da pobreza, dos quais perto de 500 mil eram crianças e outros tantos 500 mil idosos. Ou seja, um milhão de portugueses encontra-se nas faixas etárias mais vulneráveis da sociedade. Além disso, os dados das instituições privadas e públicas que lidam com a vertente social indicam que cerca de 300 mil portugueses não conseguem fazer uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias (dia sim, dia não). Ou que passe despercebido um recente estudo científico da Universidades Católica e de Lisboa e da Rede Europeia Anti-Pobreza que demonstra que este valor do "limiar da pobreza" está manifestamente subavaliado já que o valor mensal determinado para 2017 e que é de 439 euros mensais é insuficiente e que o mesmo se devia situar, actualmente, nos 783 euros por mês (média).
Não se compreende que Passos Coelho deixe na gaveta os dados, de 2016, da OCDE que classificam Portugal como o penúltimo país com a taxa mais baixa de poupanças dos cidadãos (-4,1%), deixando apenas a Grécia num lugar abaixo na lista.
Não se compreende como é que o discurso no Pontal, aquele que marca oficialmente a reentrada política do PSD após as férias, deixe de lado uma preocupação com os importantes recados ao Governo por parte do Tribunal de Contas que coloca em causa o rigor e a transparência nas contas públicas, sabendo-se que a dívida pública aumentou 18 mil milhões de euros (situando-se a cima dos 250 mil milhões de euros) e que o défice da balança comercial voltou a aumentar com as importações a vencerem o valor das exportações em cerca de 6 mil milhões de euros.
A lista já vai longa, mas aproveitando o pico do verão e das férias, infelizmente pouco importou a Passos Coelho que a tudo isto o Eurostat tenha vindo juntar mais um elemento que reforça as dificuldades que sentem os portugueses e que em nada demonstra uma diminuição da austeridade: na Europa, um em cada três cidadãos não tem dinheiro para sair de casa durante uma semana de férias. Em Portugal, o mesmo estudo do Eurostat revela que perto de metade dos portugueses, 47%, não tem dinheiro para fazer uma semana de férias fora de casa. Contexto que não difere muito dos valores indicados pelo INE há semanas e que demonstram que, em 2016, 90% das viagens turísticas dos portugueses se realizaram dentro do país, apesar da maioria das deslocações ter como objectivo a visita a familiares e amigos e só depois surgem as viagens de lazer e férias.

E havia tudo para o Pontal de 2017 ter sido tão, mas tão, feliz...

Infelizmente e mais uma vez, Passos Coelho estragou tudo ao "Venturizar e Trumptizar" o PSD e ao banalizar e esvaziar o confronto político.

(créditos da foto: Luís Forra / Lusa, in Expresso online)

Não é normal… felizmente.

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publicado na edição de hoje, 13 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Não é normal… felizmente.

Na segunda-feira passada terminou o prazo para entrega das respectivas listas para as eleições autárquicas 2017 que se realizarão no próximo dia 1 de outubro. Não escasseiam polémicas, casos jurídicos, acusações e críticas político-partidárias, reclamações e recursos, mas também algumas surpresas e indignações. Acresce ainda o aproveitamento mediático do momento para as demagogias políticas sobre recandidaturas ou alternativas. Como se costuma dizer… “há de tudo como na farmácia”. Mas há igualmente listas e candidaturas que se apresentaram construídas de forma séria, transparente, politicamente coerentes e, ainda, democraticamente inovadoras e sensatas.

Uma das questões mais críticas envolve a vertente das independências. A temática do novo conceito político do “independentismo” foi aqui referida na edição de 8 de junho. No entanto, alguns condicionalismos legais no que respeita às listas de movimentos independentes às eleições autárquicas suscitam uma outra abordagem à realidade. Em traços muito simples a legislação proíbe o uso e a referência da expressão “partido” nas siglas dos movimentos de cidadãos e na respectiva campanha. O que, por natureza, se afigura óbvio já que nos movimentos de cidadania e de independentes não existem estruturas partidárias, sendo que o recurso à expressão “partido” tem mais a ver com a própria linguagem eleitoral e política. Aliás, o que importa mesmo reflectir é se é mais conflituoso que um movimento independente use a expressão “partido” ou se uma candidatura/lista partidária use e abuse de elementos ditos independentes. E é aqui que importa reflectir. Há quem se orgulhe no número de elementos independentes nas suas listas partidárias (por exemplo, dois terços do total dos candidatos - 100 em 152 nomes) e faça disso bandeira eleitoralista. Só que isso não passa da maior falácia político-partidária e a maior demagogia eleitoralista. A afirmação de independência faz-se, com toda a legitimidade, com o direito ao exercício de cidadania em movimentos verdadeiramente independentes. Pelo contrário, não há independência, nem independentes, numa lista e estrutura partidária. Quando muito há críticos, visões distintas, quem “pense pela sua cabeça e princípios” e não embarque em seguidismos cegos. O que revela o número de independentes numa determinada lista/candidatura é que a estrutura partidária que a suporta localmente não tem dinamismo suficiente, é amorfa, não cria massa crítica, não tem internamente capacidade de resposta ou tem um problema de estratégia. Aliás, há exemplos de candidaturas que nem a experiência política dos seus vereadores eleitos em 2013 soube ou conseguiu agregar e acolher no seu projecto eleitoral. E isto é um panorama bem generalizado nos 308 municípios.

Há, no entanto, quem saiba primar e agir pela diferença, mesmo que essa diferença pareça, à primeira vista, fora do normal (entenda-se… comum, generalizado). O PSD Ílhavo apresenta-se a sufrágio eleitoral tendo elaborado as suas listas com militantes ou simpatizantes social-democratas que, em função do número de eleitores e da sua proporcionalidade, representam todas as freguesias do Município, ninguém ficou de fora ou esquecido. Isto demonstra bem a capacidade mobilizadora do partido e a disponibilidade dos seus militantes e simpatizantes para o exercício de um legítimo direito de cidadania (tão legítimo como aqueles que se apresentam como independentes), igual disponibilidade para o serviço público e para a defesa dos interesses das suas comunidades. Mais ainda, este dinamismo mais que notório permitiu um claro rejuvenescimento dos eleitos, aliando a experiência política e pública de uns à experiência profissional e à juventude de muitos, sem que tivesse havido a necessidade (patente em outros) de procurar candidatos “fora de casa”. E mesmo os que ontem foram eleitos e hoje se apresentam em lugares não elegíveis dão o “corpo às balas” sem quaisquer constrangimentos ou conflitos internos ou pessoais, com elevada dedicação e empenho, em clara empatia e sintonia com um projecto autárquico que ajudaram a construir e que também é seu (longe dos meros interesses pessoais e sede de poder). Isto é normal? Provavelmente não o é… e, felizmente, ainda bem.

Porque é desta forma que muitos ilhavenses e gafanhenses, em vez dos tiros no escuro com promessas de mudanças, do experimentalismo político baseado na incerteza e na inexperiência, preferem claramente um Futuro com Certeza(s).

A factura há-de chegar para ser paga

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publicado na edição e hoje, 9 de agosto, do Diário de Aveiro

Debaixo dos Arcos
A factura há-de chegar para ser paga

Vem bem a propósito, nesta semana, a expressão que serve de resumo à entrevista de Daniel Oliveira ao jornal i. O ex-dirigente do Bloco de Esquerda afirmou que “no dia em que o Partido Socialista conseguir maioria absoluta, a geringonça acabou”. A afirmação tem acrescido impacto numa semana (há cinco dias) em que é conhecida a sondagem Expresso/SIC/Eurosondagem que mostra um ligeiro aumento de intenções de voto no Partido Socialista (perto dos 41%), apesar dos impactos negativos dos incêndios e de Tancos na imagem de António Costa e do Governo, a estagnação do PSD e CDS (juntos perfazem 35% das intenções e voto, infelizmente por claro demérito próprio) e ligeiras oscilações negativas do PCP e do BE (entre -0,2 e -0,1).

Mas não é só pela coincidência da afirmação com a divulgação da sondagem que a expressão do Daniel Oliveira tem impacto. Ela é reveladora e espelha claramente o objectivo político que esteve na origem dos acordos da maioria parlamentar que sustenta o Governo: impedir, tão somente, que houvesse continuidade do PSD e do CDS no Governo. Não foi a aproximação das vontades políticas comuns para alterar o rumo da governação do país ou quaisquer afinidades ideológicas e partidárias. Bem pelo contrário… e haja o que houver (a menos que surja algum sismo ou terramoto político) tudo será feito para garantir a governação na totalidade da legislatura. Nem que para tal BE e PCP abdiquem de princípios, esqueçam os conteúdos programáticos eleitorais de 2015, esqueçam as promessas e as políticas com que se apresentaram a votos, abdiquem claramente do que foram sempre as suas lutas, as suas preocupações, os seus combates sociais e políticos. É muito pouco, mesmo muito poucachinho, a reivindicação do BE no aumento do salário mínimo nacional, como foi aqui referido na edição de domingo. É ainda muito pouco, mesmo muito poucachinho, toda a demagogia e do “alarido partidário” em torno da preparação do Orçamento do Estado para 2018.

Do BE e ao PCP esperava-se mais seriedade, mais coerência e menos “sapos engolidos”. E são demasiados. Numa mesma realidade, em contextos semelhantes ou até mesmo iguais, numa conjuntura mais agreste ao país, Bloco de Esquerda e Partido Comunista Português “rasgavam vestes”, enchiam ruas, avenidas e praças, paralisavam sectores importantes para o país. Não se acobardavam sob a capa de demagogas estabilidades. O sentido de Estado, a defesa de princípios e de dogmas políticos eram outros. As exigências ideológicas e políticas são agora muito menores, displicentes, esquecidas. O sindicalismo entrou num estado de hibernação (mesmo que a ferver por dentro) como garante da estabilidade social, duma paz social podre, para que a ilusão de um país melhor se mantenha longe das críticas e das preocupações dos portugueses. BE e PCP tornaram-se indiferentes.

Os problemas da banca, nomeadamente da CGD, do perdão bancário do Fundo de Resolução, um sistema que lucra, por dia, cerca de 5 milhões de euros em comissões, passam ao lado do combate partidário.

Importa lembrar ao PCP e ao BE que as cativações orçamentais do governo, aquelas que Pedro Filipe Soares, líder da bancada parlamentar do BE, veio timidamente afirmar que «o Governo não tinha mandato política para fazer esta cativações», aquelas que retiram capacidade ao cumprimento das responsabilidades sociais do Estado, ao cumprimento das necessidades de investimento público (não apenas nas obras de betão), foram, segundo a Unidade Técnica de Apoio orçamental (UTAO), as mais elevadas dos últimos oito anos (mais do que no tempo da Troika).

A total descoordenação e incapacidade política na gestão do “pós-Pedrógão Grande”, que já levou a que mais de 30 militantes do PS concelhio se desfiliassem do partido, o atraso nos apoios ás vítimas e aos seus familiares e empresas, era motivo para doer a voz ao BE e ao PCP noutras circunstâncias políticas. Aliás, está bem na memória as acções de Catarina Martins, há precisamente um ano, nos incêndios da Madeira. Hoje, ainda há apoios e subsídios por atribuir. Acusações, manifestações, críticas? Zero. Nem uma palavra.

Quando se apregoam alvíssaras de ilusórias conquistas políticas, é bom lembrar o que é o descalabro do sentido social e laboral de hoje no BE e no PCP. Em Maio deste ano o INE avançava que cerca de 2,6 milhões de portugueses viviam no limiar da pobreza, dos quais perto de 500 mil eram crianças e outros tantos 500 mil idosos. Um estudo científico recente (Universidades Católica e de Lisboa e a Rede Europeia Anti-Pobreza) demonstra que este valor está manifestamente subavaliado já que o valor mensal do limiar da pobreza determinado para 2017 e que é de 439 euros mensais é manifestamente insuficiente e que o mesmo se devia situar, actualmente, nos 783 euros por mês (média). Obre isto, nem uma referência à esquerda.

A realidade há-de continuar ilusória, o Orçamento para 2018 há-de passar, o Governo cumprirá os quatro anos, haverá ali e acolá disfarçadas críticas e acusações… mas a factura há-de chegar para ser paga. E sempre pelos mesmos. E não será pelo diabo.

Os rendimentos dos portugueses

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publicado na edição de hoje, 6 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Os rendimentos dos portugueses
(o outro lado da moeda)

No comício de Verão do BE, na quarta-feira, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, elencava um conjunto de medidas e políticas implementadas pelo Governo com a “marca política” do BE. Entre elas estava o regozijo pelo fim dos cortes salariais no tempo da Troika e pelo aumento do salário mínimo que, esperam os bloquistas, possa atingir, em Janeiro de 2018, os 580 euros mensais.

As notícias não podiam, aparentemente, ser mais encorajadoras e positivas: Portugal cumpriu as metas e as exigências orçamentais a que estava obrigado pelos compromissos e regras europeias; Portugal saiu do Procedimento por Défice Excessivo; Portugal baixou a taxa de desemprego para níveis significativos, muito próximos dos 9%; entre outros dados.

Mas este vangloriar partidário do Bloco de Esquerda esquece, porque politicamente dá jeito para garantir a estabilidade governativa e parlamentar, uma realidade que teima em estragar a festa política da actual conjuntura: o PIB ficou longe do aumento previsto; a economia não evoluiu para os valores expectáveis; surgem as críticas e as condenações às cativações orçamentais que implodem o investimento e a responsabilidade social do Estado (por exemplo, na saúde e na educação). Por outro lado, cumpridas as metas orçamentais e as exigências e procedimentos, o Banco de Portugal divulgou dados referentes ao primeiro semestre de 2017 (junho) e que revelam um aumento da dívida pública em cerca de 18 mil milhões de euros, situando-a, nesta data, em cerca de 250 mil milhões de euros.

E os anunciados aumentos dos rendimentos dos portugueses e das famílias espelham outras realidades preocupantes. Em 2016, segundo os dados divulgados pela OCDE, Portugal é o penúltimo país com a taxa mais baixa de poupanças dos cidadãos (-4,1%), deixando apenas a Grécia num lugar abaixo na lista. Uma das razões, para além da economia não crescer dentro dos valores esperados, pode estar o aumento preocupante (face ao historial de erros e resultados negativos que um passado recente ainda traz à memória) do crédito ao consumo em cerca de 5% o que pode, se não controlado, provocar um endividamento das famílias de novo incontrolável, com impactos para todos e para o país. Por outro lado, os dados revelados pelo Banco de Portugal, na passada quinta-feira, demonstram que 90% dos depósitos a prazo simples (para a maioria das poupanças do comum dos portugueses) davam uma remuneração anual simples inferior a 1%, sendo que cerca de 70% dos depósitos situava-se abaixo dos 0,5% ao ano.

Importa ainda não esquecer que um em cada quatro portugueses (25,1%), cerca de dois milhões e seiscentos mil encontram-se no limiar da pobreza e da exclusão social. Destes, 500 mil são crianças e outros tantos (mais meio milhão) são idosos. Ou seja, um milhão de portugueses encontra-se nas faixas etárias mais vulneráveis da sociedade. Além disso, os dados das instituições privadas e públicas que lidam com a vertente social indicam que cerca de 300 mil portugueses não conseguem fazer uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias (dia sim, dia não).

A tudo isto o Eurostat vem juntar agora mais um elemento que reforça as dificuldades que sentem os portugueses e que em nada demonstra uma diminuição da austeridade: na Europa, um em cada três cidadãos não tem dinheiro para sair de casa durante uma semana de férias. Em Portugal, o mesmo estudo do Eurostat revela que perto de metade dos portugueses, 47%, não tem dinheiro para fazer uma semana de férias fora de casa. Contexto que não difere muito dos valores indicados pelo INE há dois dias e que demonstram que, em 2016, 90% das viagens turísticas dos portugueses se realizaram dentro do país, apesar da maioria das deslocações ter como objectivo a visita a familiares e amigos e só depois surgem as viagens de lazer e férias.

Por mais que haja quem se queira vangloriar por políticas que encobrem uma austeridade que teima em manter a sua presença e os seus efeitos, num manifesto exercício demagógico, esta é a outra face da mesma realidade: o país pode estar melhor mas os portugueses nem por isso.

Como é fácil perceber o porquê do 25 de Novembro de 75

A Venezuela encontra-se a ferro e fogo. Nicolás Maduro conseguiu, com o golpemanipulaçãofraude políticos do passado domingo, transformar a Venezuela na Coreia do Norte do continente sul-americano.

nova Assembleia Constituinte venezuelana (curiosamente, ou não, presidida pela esposa de Nicolás Maduro... que conveniência democrática) tomou posse contra o povo, contra as instituições, contra a democracia, contra as liberdades, com o claro objectivo de alterar a Constituição e reforçar os poderes totalitários e ditatoriais do presidente venezuelano.

Excluindo a China, Cuba, Nicarágua, Bolívia, o "nim" da Rússia, a comunidade internacional (Vaticano, ONU, União Europeia, entre outros) e nomeadamente a maioria dos países sul-americanos que acabam por isolar a Venezuela (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, México, Panamá, Paraguai e Peru) condenaram a opção de Nicolás Maduro e não reconhecem a legitimidade da nova Assembleia (ao que se junta a recente posição do MERCOSUL).

Também o Governo português tomou a posição pública de condenar a suposta legitimidade das eleições do passado domingo, mesmo tendo em conta a enorme comunidade luso-venuzuelana.

Só o PCP, em pleno século XXI e após 43 anos da (re)conquista da liberdade, mantém esta incapacidade ideológica e programática de não reconhecer a importância dos direitos, liberdades e garantias de qualquer cidadão e do valor imprescindível da democracia e do pluralismo.

Não podia haver momento, circunstância ou realidade, que melhor espelhasse a importância de que se revestiu o 25 de Novembro de 1975 para a implementação da democracia em Portugal. Felizmente...

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(créditos da foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters)

O valor da transparência e competência

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publicado na edição de hoje, 2 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
O valor da transparência e competência

A notícia foi avançada ontem pela Rádio Terra Nova: 57 municípios, dum total de 79 câmaras, cumpriram todas as obrigações a que estavam sujeitos e deixam de estar sujeitos às várias exigências do Programa de Apoio à Economia Local. Da lista das 57 autarquias, embora ainda a aguardar confirmação oficial, constam os municípios vizinhos de Vagos e Ílhavo.

Sem enfrentar, ao contrário de muitos outros municípios aderentes, grandes e significativas restrições impostas pelo Programa (por exemplo, a não obrigatoriedade de colocar impostos e taxas no máximo; ainda para este ano Ílhavo reduziu o IMI e introduziu o chamado IMI Familiar), o município esteve basicamente sujeito às regras inerentes ao Plano de Ajustamento Financeiro, sem impactos relevantes na gestão da sua despesa corrente. O Plano permitiu manter a credibilidade do Município, o seu desenvolvimento consistente e equilibrado, a sua sustentabilidade, a redução da dívida (2017 poderá encerrar com a dívida em cerca de 10 milhões de euros, perfeitamente enquadrada dentro da sustentabilidade de quaisquer finanças locais) e o escrupuloso pagamento a fornecedores (pagamentos inferiores aos prazos legais em vigor). O Município de Ílhavo está, desta forma, com capacidade acrescida de gestão de todos os seus recursos, de autonomia plena, sempre com o sentido de responsabilidade, de sustentabilidade e de realismo, com a clara noção de que nem tudo o que é desejável é possível de concretizar de uma só vez e no imediato, havendo a plena consciência do sentido de prioridade e de necessidade das comunidades e dos cidadãos. E este contexto e esta realidade têm um impacto significativo no momento das opções do próximo dia 1 de outubro.

O eleitorado e as comunidades são, hoje, mais exigentes para com os políticos e a política, embora, infelizmente, em alguns casos e momentos, tal possa significar o afastamento dos cidadãos em relação à política e ao legítimo exercício do direito cívico de cidadania. As decisões eleitorais são, hoje, mais complexas (face à complexidade da realidade e do serviço público) mas, simultaneamente, mais conscientes.

O contacto directo que a candidatura de Fernando Caçoilo tem mantido e promovido com os munícipes, com as comunidades e com as instituições, tem demonstrado, com a frontalidade e o realismo com que são encarados quer as virtudes do trabalho realizado, quer os problemas que ainda há por enfrentar (através das sugestões que vão sendo apresentadas) que os eleitores procuram claramente a continuidade da experiência e provas dadas, o sucesso do trabalho realizado, o rigor e a transparência demonstrados e provados, no conhecimento profundo da realidade e das necessidades, na dedicação e no contributo para o desenvolvimento do município, das freguesias e das comunidades.

Há uma procura eleitoral inequívoca na transparência e na autenticidade, na escolha segura (e pelo seguro) de um Futuro com (a) Certeza assente e sustentado na verdade das políticas e da gestão autárquica, numa simbiose perfeita com as Freguesias, que tem produzido resultados com óbvias e naturais lacunas, imperfeições, mas muito mais com virtudes, com autenticidade, com realismo e com o pragmatismo que direcciona o trabalho para as necessidades dos ilhavenses e gafanhenses, para as comunidades, as empresas, as associações e instituições do Município de Ílhavo.

Entre as demagogias eleitoralistas, entre as reviravoltas e cambalhotas ideológicas ou partidárias, por mais independências que se queiram assumir, o eleitorado do Município de Ílhavo saberá escolher, no dia 1 de outubro, sem descurar o tradicional sentido de exigência, a continuidade num futuro sustentado, transparente, autêntico, dedicado e com trabalho e provas dadas e resultados visíveis.

Entre o voto no escuro e no incerto, na desconfiança e na incerteza, os eleitores de Ílhavo e das Gafanhas saberão optar por um futuro com certeza, desenvolvimento, qualidade e segurança.

Uma season pouco silly

Ciclicamente o verão ou as férias políticas de verão são marcadas pela chamada silly season, período (a)normalmente preenchido com faitdivers que apenas servem para ocupar o tempo "morto" e "morno" das férias.

Este ano é excepção à regra: a tragédia de Pedrogão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pêra, à qual se junta o recente incêndio de Mação; o roubo de armamento de Tancos; a Caixa Geral de Depósitos; a crise na Venezuela; as viagens, as várias viagens; a mini remodelação governamental, entre outros têm provocado uma agitação política fora do comum. Há ainda a acrescentar a tudo isto a aproximação das eleições autárquicas.

Toda esta agitação político-partidária tem tido ainda um outro efeito para além da confrontação Governo/Oposição e Oposição/Posição (maioria parlamentar): o país deixou de ouvir falar em finanças e economia.

As notícias não podiam ser mais encorajadoras e positivas: Portugal cumpriu as metas e as exigências orçamentais; Portugal saiu do Procedimento por Défice Excessivo; Portugal baixou a taxa de desemprego para níveis significativos, muito próximos dos 9% (apesar dos anunciados 9,4% de Marques Mendes); entre outros dados.

Mas surge, paralelamente, uma realidade que teima em estragar a festa política: o PIB ficou longe do aumento previsto; a economia não evoluiu para os valores expectáveis; surgem as críticas e as condenações às cativações orçamentais que implodem o investimento e a responsabilidade social do Estado (por exemplo, na saúde e na educação). Por outro lado, cumpridas as metas orçamentais e as exigências e procedimentos, o Banco de Portugal divulgou dados referentes ao primeiro semestre de 2017 (junho) e que revelam um aumento da dívida pública em cerca de 18 mil milhões de euros, situando-a, nesta data, em cerca de 250 mil milhões de euros.

E apesar dos anunciados aumentos dos rendimentos dos portuguesas e das famílias há um em cada quatro portugueses (25,1%), cerca de dois milhões e seiscentos mil, que se encontram no limiar da pobreza e da exclusão social. Destes, 500 mil são crianças e outros tantos (mais meio milhão) são idosos. Ou seja, um milhão de portugueses encontra-se nas faixas etárias mais vulneráveis da sociedade. Além disso, os dados das instituições privadas e públicas que lidam com a vertente social indicam que cerca de 300 mil portugueses não conseguem fazer uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias (dia sim, dia não).

A tudo isto o Eurostat vem juntar agora mais um elemento que reforça as dificuldades que sentem os portugueses e que em nada demonstra uma diminuição da austeridade: na Europa, um em cada três cidadãos não tem dinheiro para sair de casa durante uma semana de férias. Em Portugal, o mesmo estudo do Eurostat revela que perto de metade dos portugueses, 47%, não tem dinheiro para fazer uma semana de férias fora de casa.

Esta é a outra face da mesma realidade...

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Pior que um cego é quem não quer ver

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Quase duas dezenas de mortos só no dia das eleições venezuelanas.

Em quatro meses (desde o dia 1 de abril) já morreram mais de cem pessoas nos protestos anti-governamentais na Venezuela.

Execuções sumárias, como a do jornalista José Daniel Sequera, do diário El Nuevo País, crítico da governação de Nicolás Maduro e encontrado morto esta manhã.

Os dois líderes da oposição a Nicolás Maduro, Leopoldo López (Vontade Popular) e Antonio Ladezma (Aliança Bravo Povo), foram novamente isolados numa prisão militar (Ramo Verde) por elementos do Serviço Bolivariano da Informação (Sebin, a polícia secreta venezuelana) que os levaram de sua casa, durante a noite.

O desrespeito pela democracia (o desrespeito pelo voto e pela vontade do povo que tinha eleito uma Assembleia maioritariamente da oposição a Maduro), a imposição de uma vontade única, a preparação da implementação de uma ditadura presidencial, para além de toda a instabilidade e o caos social e económico que a Venezuela vive há alguns anos, faz como que, hoje, aquele país esteja a tornar-se na "coreia do norte sul-americana". Cada vez mais ditatorial, cada vez menos democrática, cada vez mais opressiva dos direitos e liberdades, cada vez mais degradada e cada vez mais isolada da região (Colômbia, Brasil, Panamá, Peru, Argentina, Costa Rica, por exemplo) e do mundo.

Ao contrário dos desejos políticos do PCP, Portugal (e o mundo) não deve respeito por ditaduras (seja esta, seja a da Coreia do Norte ou qualquer uma outra) por mais que o Partido Comunista queira desvirtuar o que é a democracia e a liberdade. E infelizmente, o PCP não percebe ou não quer perceber que hoje, em pleno século XXI, não há ditaduras de esquerda ou de direita (não se percebe porque é que o PCP não pede o mesmo respeito pela Hungria ou recentemente pela Polónia, por exemplo) . Não há. O que há é Ditadura, ponto. E isso é o oposto da democracia e da liberdade.

(créditos da foto: EPA, em BBC News)