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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Dever cumprido... até sempre.

tomada de posse.jpg(foto da tomada de posse... Assembleia de Freguesia Glória e Vera-Cruz - 18/10/2013)

publicado na edição de hoje, 6 de setembro, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Dever cumprido

Não é fácil adivinharmos o futuro; aliás afigura-se, a qualquer ser humano, impossível. Daí a expressão comum «nunca digas nunca». No entanto, haverá sempre a garantia daquilo que possam ser os desejos, as perspectivas e as expectativas. Praticamente concluído o mandato autárquico 2013/2017 estão, desta forma, terminadas as minhas funções como Presidente da Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Glória e Vera Cruz. Mesmo sem a certeza do que possa estar para além do horizonte atrevo-me a dizer que não será um “até já” ou um “até breve”… é, com a garantia do presente, um “até sempre”.

Foram várias as vivências autárquicas ao longo de alguns anos como vogal (e neste último quadriénio como presidente) da assembleia de freguesia. Por exemplo, ficam as marcas de ter estado presente na mudança da sede da Rua Dr. Nascimento Leitão para a Rua Mário Sacramento; a inauguração da casa da Sustentabilidade; a reforma administrativa que resultou na fusão das duas freguesias urbanas (Glória e Vera Cruz).

A descrença e a desilusão na política local aveirense, a todo e a qualquer nível, de forma generalizada e sem qualquer pretensão de particularizar, partidarizar ou personificar, levam-me a dizer “adeus”, “até sempre”. Há um vazio crítico, um “buraco negro” de militância e participação nos partidos políticos aveirenses e na vivência política local. Algo, diga-se, pelo panorama e pelo que é possível conhecer, se alastra a um significativo número de municípios/regiões no país.

Por razões óbvias inerentes à conjuntura eleitoral que se vive e ao tempo que medeia o próximo acto eleitoral autárquico, aconselha o bom-senso e a ética que não faça qualquer juízo particular em relação ao mandato agora terminado, dado que entre os colegas autarcas que comigo percorreram este último mandato nas freguesias da cidade de Aveiro há recandidatos e candidatos. Mas há quatro notas que importa relevar das experiências autárquicas vividas.

Primeiro, realçar o respeito político e pessoal vivido por todos, assente numa pluralidade partidária significativa, que só beneficiou o papel e a acção da Assembleia de Freguesia através de uma vivência tão substancialmente participada quanto informal. O que, para além do contributo cívico e político de todos, só facilitou o meu papel e função na presidência da mesa.

Segundo, lamentar que o país, depois de tantos alertas, depois de uma reforma administrativa e legislativa do Poder Local desconexa, sem qualquer consistência e com resultados práticos duvidosos, não tenha, volvidos estes anos, parado para reflectir, repensar e implementar uma verdadeira alteração ao mapa administrativo do poder local (regiões, municípios, freguesias) aliada a uma premente alteração do quadro legislativo do Poder Local (finanças locais, lei eleitoral local, competências, financiamentos, etc.). Infelizmente, em Portugal, o tempo arrasta demasiadamente a realidade que se vive sem que as soluções e decisões surjam coerentes e consistentes.

Terceiro, o país tem que reflectir sobre o (sério) problema da legitimidade democrática e da sobreposição administrativa territorial: competências, financiamento, responsabilidade, gestão. Não é compatível o exercício democrático da eleição autárquica com a sobreposição administrativa e política de uma região face a um município ou de uma câmara face a uma freguesia, principalmente as de cariz e realidade urbanas.

Por último, embora este mandato tenha tido (por comparação com outros na então freguesia da Glória) vários momentos de presença de cidadãos (fregueses) em algumas sessões da Assembleia de Freguesia, Portugal ainda tem uma enorme iliteracia política e de cidadania para colmatar. Falta participação e presença dos cidadãos junto dos órgãos que elegeram, falta sentido de cidadania na vida das comunidades. A democracia não pode, nem deve, estar refém de uma “cruz” de quatro em quatro anos, do vício crítico de “sofá” dos eleitores quando se aproximam eleições. E a culpa é dos cidadãos. A democracia constrói-se com todos e em todos os momentos (nas eleições, no direito fundamental a eleger – e a ser eleito – na participação na vida das comunidades, dos bairros, das freguesias, dos municípios) sem que isso retire ou menorize a responsabilidade e legitimidade democrática do poder de decisão dos eleitos.

Mas ao país, a todo o país, ainda falta muita democracia.