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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Sete pecados mortais da moção de Censura

A Moção de Censura ao Governo, apresentada pelo PS (texto integral), ao menos por uma questão de coerência política e discursiva poderia ter servido para um total ruptura: do passado recente da governação socialista, do memorando (como o próprio afirmou, não foi por ele assinado), do governo. Mas faltou-lhe coragem… a mesma ausência de coragem para assumir que tudo podia ter sido diferente se não tivessem ocorrido as eleições de 2011 que, afinal e na prática, serviram para desiludir muitos eleitores, decepcionar os cidadãos e, conforme provam a realidade dos números, afundar ainda mais o país. Como diz o ditado “mal por mal, mais-valia não se ter mexido”. Mas também o que esperar de uma Moção de Censura ao Governo, com um país assolado de problemas e que se resume a quatro páginas? (já vi textos na Assembleia Municipal de Aveiro maiores e mais consistentes).

Só que foram tantos os erros no debate de hoje.

1. A estratégia de tentar destabilizar e criar algum mau estar, com a moção, no Governo, a partir do CDS. Logo o CDS que dificilmente sairá do Governo porque tal significa abdicar do poder (que nem o conquistou directamente por sufrágio) e sujeitar-se a mais uma travessia do deserto político nacional. Alvo totalmente errado.

2. Segundo Carlos Zorrinho, a “moção de censura contra o governo é um acto patriótico”. Tal como a abstenção em relação ao OE2012 era uma abstenção violenta. O patriotismo vê-se e demonstra-se em alternativas, em apresentar soluções para o problema… os portugueses já não conseguem sobreviver de demagogia (não alimenta o estômago, nem avia medicamentos nas farmácias). E aqui, surge a primeira armadilha política pela voz do líder da bancada social-democrata, Luís Montenegro: "Censuro, logo existe. Censuro, logo sou oposição, Censuro, logo acalmo as minhas hostes. Censuro, logo isso é bom para mim enquanto líder do PS".

3. Não basta dizer que tudo falhou, que é a austeridade pura e dura, que as previsões foram todas ao lado (algumas até para o dobro). Isso qualquer dos comuns dos mortais portugueses sente na pele e no bolso todos os dias. Era preciso demonstrar que o caminho que estava a ser anteriormente seguido (obviamente com as devidas e constantes readaptações, tal como em cada revisão da troika), afinal, era menos penoso, podia ter tido mais sucesso, sacrificava menos os portugueses e, acima de tudo, de tudo mesmo, não recorria a promessas eleitorais que, na prática, resultaram em políticas, reformas e medidas totalmente opostas ao discurso de passos Coelho em 2011, quer face ao Governo do PS, quer em plena campanha eleitoral.

4. Outro e preocupante erro estratégico do PS é não ter conseguido rebater o argumento do Governo (usado por Passos Coelho e por Portas) de que a moção, em caso de aprovação, significaria um segundo resgate externo a Portugal. Algo que o próprio governo PSD-CDS não garante, nem tem provas, de que não acabará por acontecer face ao rumo que o país leva. A menos que, finalmente, Portugal saia da zona euro. Alternativa, infelizmente, que o PS não sublinha. Ou ainda, o tal erro que revela um incompreensível “trauma político” pelo passado foi o não assumir que o PEC IV tinha a aprovação das instituições da União Europeia e que não teve consequência por força do seu chumbo e pela “birrinha institucional” de Cavaco Silva.

5. O discurso vazio, inócuo, do mais tempo, da renegociação do memorando, de outras condições, é pura demagogia. Seguro sabe bem que a sua posição perante os credores externos (troika e mercados) só teria qualquer peso se apresentasse soluções, medidas alternativas concretas. Atirar uns bitaites e no fim afirmar que honrará os compromissos, é o mesmo que perder qualquer credibilidade. O certo é que o PS ainda não encontrou capacidade de pressionar a Troika para outro tipo de condições de resgate que garantam, a quem nos emprestou o dinheiro (goste-se ou não), um conjunto de garantias de sucesso para a consolidação da dívida e das contas públicas. Por outro lado, Seguro sabe que está a dar um tiro no pé ao exigir uma renegociação profunda das condições quando não tem qualquer suporte, nem apoio, por parte da Troika.

6. Quando Seguro foi comparado com Hollande na ânsia da conquista do poder, a que poderia ser comparado Passos Coelho depois de tudo o que mentiu aos portugueses e depois de tudo o que fez, com a conivência de Cavaco Silva, para derrubar José Sócrates? Pelos visto, nada…

7. António José Seguro assumir publicamente (o tal patriotismo) a responsabilidade política de liderar um novo Governo no país, acaba por, apesar da legitimidade do “sonho”, de colocar a “cereja em cima do bolo” no desastre que foi esta Moção de Censura: o PS não tem alternativa política para se apresentar a sufrágio, os portugueses não querem, com essa realidade eleições, o país não aguenta, nesta fase, eleições. Isso é radicalismo à esquerda.