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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

É tão mais fácil atirar pedras...

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Uma morte, em contexto de saúde (internamento, urgências, tratamento hospitalar, entre outros), não é, infelizmente, caso esporádico e único ou raro, independentemente dos factores que a originam.

Para além do lamento agregado a qualquer perda da vida, seja em que circunstâncias for, todo o mediatismo em torno da morte da jovem de 17 anos vítima de uma pneumonia bilateral - sarampo, para o qual a jovem não estava imune (vacinada), serviu para nada ou muito pouco.

Ou melhor... serviu para acusações infundadas, extemporâneas, injustas, dirigidas, em primeira instância, aos pais, sem o mínimo de respeito pela dor que sentiam (e devem sentir).

Foram lançadas "toneladas de pedras" a criticar e a condenar os pais pelo facto da jovem não estar vacinada, ao ponto de haver quem os ligasse a movimentos e convicções anti-vacinas, às medicinas alternativas ou aos movimentos relacionados com as ditas alimentações "saudáveis e vegetarianas". Tudo, sem o mínimo de precisão, de rigor e de verdade.

Sabe-se que a jovem que tomou outras vacinas enquanto bebé foi desaconselhada pela pediatra a não continuar com o programa nacional de vacinação, nomeadamente com a segunda dose da vacina do sarampo, por ter sofrido uma reacção alérgica à vacina. Aliás, segundo é público, o seu estado foi notoriamente agravado por vários problemas de saúde que a tornaram mais debilitada e mais indefesa.

Mas mais grave ainda foi o mediatismo e o alarmismo criado em torno da situação que, até à data, com cerca de 20 casos de sarampo confirmados (mais 18 por avaliar) se confina apenas a um surto longe de qualquer epidemia.

Hoje Portugal tem uma taxa de vacinação na ordem dos 96%. Para a Direcção-Geral de Saúde as cerca de 10 a 15 mil crianças não vacinadas são um número que não causa qualquer tipo de preocupação ou que não tem grande expressão. Apesar dos 20 ou 21 casos comprovados apenas o desta jovem se tornou problemático e teve um final que se lamenta mas que teve igualmente um conjunto de circunstâncias muito particulares.

Por isso, é pena que se tenha debatido o assunto sobre um cenário irrealista, meramente mediático.

Em vez de se ter explorado ou continuar a explorar o descontextualizado conflito entre "medicina convencional" e "medicina alternativa", o confronto entre pais pró-vacinação e anti-vacinação (inaceitavelmente a comunicação social abordou, maioritariamente, a questão do ponto de vista das mães esquecendo, sem justificação cabal, o papel e a responsabilidade do pai, como se estas coisas da saúde, do arrumar o quarto, do tomar banho, do estudar, coubesse apenas ao "mau feito" maternal) perdeu-se quase tudo do que seria fundamental e essencial.

Por exemplo, em vez de se crucificar, sem razão, os pais em praça pública, era muito melhor discutir-se qual a resposta imunológica que o Programa Nacional de Vacinação dá hoje.
Por exemplo, em vez de se explorar o confronto "dogmático" entre os que são "pró" e os que são "contra" a vacinação era importante percebermos se faz sentido o Governo (e os órgãos políticos) pensar a questão da obrigatoriedade da vacinação.
Por exemplo, faria igualmente sentido discutir-se o que faz mais sentido: a liberdade de escolha pessoal ou a responsabilidade colectiva na defesa da saúde pública. Importa destacar que há entre os 21 casos diagnosticados casos de sarampo em profissionais da saúde não vacinados.
Por exemplo, em vez de colocar no mesmo prato da balança medicina tradicional/convencional e medicina alternativa, o que se afigura como incomparável, nem sequer confrontável (ou, como tantas vezes projectado pela comunicação social, o debate em torno da vacinação vs a alternativa da chamada alimentação saudável e/ou vegetariana... o que quase se assemelha a comparar astrofísica ou astronomia com bolas de , búzios, cartas e signos) era preferível a discussão sobre a evidência científica da vacinação.
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Por último, em vez do alarido, do alarmismo injustificado, do facilitismo na crítica e na acusação, tinha sido uma excelente oportunidade para que se pudesse ter feito uma excelente campanha de sensibilização para a importância da vacinação.

Foi demasiado barulho em cima da lamentável perda de vida de uma jovem de 17 anos que esteve (por contágio de uma bebé de alguns meses que não pode ser vacinada por estar em estado febril) no lugar errado, à hora errada.