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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Em Ílhavo o pacote fiscal tem rigor, transparência e objectividade clara

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É cíclica a controvérsia que a aprovação anual dos pacotes fiscais municipais gere, normalmente, fruto da dialéctica política democrática, associada a uma não menor demagogia e retórica discursiva.

Por norma, obviamente que variando em função das realidades municipais específicas e particulares, há duas vertentes que sobressaem na discussão: os valores da Derrama e do IMI.

No caso da Derrama (imposto que incide sobre o lucro tributável das pessoas colectivas) o valor que foi aprovado para o ano de 2018 (igual a 2017) é, no Município de Ílhavo, de 1,5% sobre valores iguais ou superiores a 150 mil euros de lucro tributável, sendo que, abaixo desse valor, as empresas ficam isentas do seu pagamento.
Aquando da sua aprovação, por maioria (com a abstenção do PS e oposição do BE), foi questionado se a aplicação do referido valor tributável (1,5%) não seria factor condicionante para o desenvolvimento económico do Município e para eventual afastamento da fixação do tecido empresarial em Ílhavo.
O Diário de Notícias de hoje dá a resposta... aliás, o tecido empresarial de excelência fixado em Ílhavo dá a resposta cabal contribuindo para que o distrito de Aveiro seja um dos dois distritos (juntamente com o de Viana do Castelo) com maior peso nas exportações (51% do volume de negócios gerado pelas empresas do sector exportador) - dados do relatório anual do Banco de Portugal "Análise das empresas do setor exportador em Portugal 2007-2016" (de 20/12/2017).

Já no caso do IMI a realidade é mais polémica e crítica, embora, por força do confronto político-partidário, raramente quem se opõe consegue abstrair-se da demagogia.
Há vários aspectos que importa focar e analisar.
Primeira nota para o facto da Autarquia de Ílhavo ter aderido ao chamado IMI Familiar (com deduções fixas que variam até aos 70 euros); ter concedido isenção parcial (20% e 10% o valor do IMI) para edifícios que apresentem Certificação Energética com classe A+ ou A; e ainda isenção total do IMI, por dois anos, para prédios objecto de recuperação destinada a arrendamento (rendas fixadas entre os 225 e os 325 euros). É, por isso, inquestionável a preocupação social, ambiental e urbanística presente na tributação municipal do IMI.
A segunda nota foca-se na tentativa demagógica de isentar responsabilidades governativas e fazer recair sobre as autarquias o ónus da questão. Mas o facto é que o Imposto (que é) Municipal sobre Imóveis é fixado pelo Governo, em sede de Lei de Orçamento do Estado e legislação específica, e sobre ele ainda incidem outros factores determinantes para o valor a pagar pelos cidadãos proprietários: o valor patrimonial, onde se incluem sobretaxas (lembremo-nos do polémico "imposto Mortágua"); o coeficiente de localização; e factores como a "polémica" exposição solar ou proximidade com cemitérios, frentes ribeirinhas e costeiras; entre outros. Factores que são da responsabilidade do Governo e da governação da nação.
Além disso, o intervalo que permite às autarquias fixarem os valores a cobrar é, também ele, determinado pelo Governo e, nalguns casos, por força de programas de ajustamento financeiro, a fixação da taxa é imposta por regulamentação própria (veja-se o caso do FAM e do PAM).
A terceira nota é a facilidade com que se tenta imputar alguma iliteracia fiscal aos cidadãos com o discurso de que a maioria nem sabe que o IMI é um imposto tributado em benefício exclusivo das autarquias. Mesmo os "menos jovens" (ou os cidadãos "mais vividos") ainda se recordam bem da contribuição predial. Por outro lado, é injusto e ofensivo para os cidadãos contribuintes a firmação de que os mesmo nem sabem o que é que pagam. É certo que os portugueses, ao longo de tantas décadas, têm uma dificuldade acrescida de percepção do destino final das suas contribuições fiscais face ao que tem sido a responsabilidade social do Estado, nomeadamente na Saúde, na Educação, na Cultura, no Ambiente e na protecção social (reforma e emprego). É bem verdade. Mas se há, em toda esta realidade, uma noção clara do impacto ou do uso devido de um imposto é, precisamente, o IMI porque às autarquias, pela proximidade democrática, é permanentemente exigida a prestação de "contas públicas". E os ilhavenses não o esquecem. Por isso, ao contrário do que é tentado fazer crer, o resultado eleitoral de outubro passado espelha precisamente essa realidade: os eleitores confiaram no rigor, na transparência da gestão autárquica, no uso inquestionável e eficiente dos recursos financeiros em áreas da responsabilidade municipal como a rede de águas e saneamento; a acção social; o associativismo; a cultura, o saber e a formação; o ambiente e qualidade de vida; o ordenamento, o planeamento e coesão territorial; a educação (com o exemplo da reabilitação do parque escolar); a juventude; ... . E sabem-no e expressaram-no em plenitude. Sabem, como souberam nos anos anteriores, a importância do rigor e do equilíbrio financeiro numa autarquia, assim como sabem que o que exigem num orçamento que responda às suas necessidades, num orçamento que tem uma dotação de investimento (face às GOPs) na ordem dos 14,6 milhões de euros, tem que ter a corresponsabilidade da contribuição de todos (em função das suas capacidades contributivas e financeiras, obviamente).
Daí que nem sempre (ou quase nunca) a equidade da contribuição fiscal indirecta (a tal "austeridade à esquerda") é justa... antes pelo contrário. É muito mais justa a contribuição progressiva, por mais pequena que ela seja.

Por último, o recurso discursivo ao esforço que é exigido aos portugueses não colhe para o debate municipal. E não colhe porque se é verdade que os dados apontam para um aumento da receita do IMI para as autarquias, em 2017, na ordem dos 4,2% (face a 2016) - cerca de 1,54 mil milhões de euros - e os mesmos dados apontam para uma evolução, em 2018, para 5% (face a 2017, na ordem dos 1,61 mil milhões de euros) a verdade é que ao Estado cabe a responsabilidade de tal realidade. Primeiro na fixação dos factores tributáveis, segundo (ao contrário do que tinha proposto o Partido Comunista Português no OE2017) porque há uma resistência governativa em encolher o valor máximo do imposto (0,45 para 0,4), mas, principalmente, porque o Estado/Governo não tem a capacidade política e técnica para encontrar, em sede de Orçamento do Estado, uma forma alternativa de financiar as autarquias, como é sua responsabilidade governativa.