Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Soube a pouco

publicado na edição de hoje, 6 de abril, do Diário de Aveiro.
(nota: a foto, significativamente antiga, publicada na edição do jornal é da responsabilidade da redacção do Diário de Aveiro)

Debaixo dos Arcos
Soube a pouco

36 congresso PSD - espinho 2016.bmp

Soube a pouco o 36º congresso do PSD, realizado em Espinho, neste último fim-de-semana. Um congresso marcado pela mera confirmação da liderança de Passos Coelho à frente do partido, por muitas ausências, algumas inquietações e incómodos e a marcação de um novo tempo para os social-democratas: o tempo do partido assumir a sua condição de oposição. Mas também foi um congresso que define alguns desafios políticos importantes para o futuro.

A primeira nota de destaque vai para o discurso de Pedro Passos Coelho na abertura do 36º Congresso do PSD. Muito para além dos “vivas” e “urras” dados pela esquerda que viu nas palavras de Passos Coelho o reconhecimento da legitimidade da governação (o sentido da expressão “consistência” tem mais a ver com a pouca previsibilidade de eleições legislativas antecipadas do que a admissão ou valorização da maioria à esquerda), a declaração de abertura do congresso foi toda virada para o interior do partido: críticas à oposição interna e às ausências, a avaliação dos últimos quatro anos de governação e o assumir, que faltava e já tardava, da condição de partido da oposição (deixando definitivamente para trás o trauma pós-eleitoral de 2015). Num Congresso marcado por duas fortes expressões, “compromisso reformista” e “social-democracia sempre”, nem a primeira e muito menos a segunda foram a marca da reunião magna social-democrata. Curiosamente, o único a “pisar” terrenos ideológicos foi mesmo a honrosa intervenção da voz crítica mais esclarecida de José Eduardo Martins ao referir alguns aspectos menos positivos da governação e ao afastamento do PSD em relação a algumas vertentes sociais (por exemplo, as reformas e os pensionistas). O liberalismo ou, de forma mais clara, um afastamento da concepção de social-democracia (para não entrar em concepções ideológicas mais extensas) marcou as duas intervenções de Passos Coelho. Por outro lado, falou-se muito pouco de reformas neste congresso (segurança social e sistema eleitoral souberam a pouco) e nem a lista à Comissão Política Nacional deixou marcas de grandes mudanças ou afastamento do que foi a linha pragmática e programático dos quatro anos de Governo (o “mau estar” em algumas nomeações para as vice-presidências ou a ausência de acordos com as diversas distritais foram tónica presente e sinais de alguma inquietação).

Se a repetida afirmação de que o PSD, face à actual conjuntura política, será, após o Congresso de Espinho, um partido sem pressa, sereno, com a assunção clara do seu estatuto de partido de oposição, a verdade é que são vários os desafios que se colocam ao partido e que determinam, ao contrário do que algumas vozes pretendem insinuar, o sucesso da liderança de Passos Coelho e o regresso do partido ao poder. E começa tudo por o maior desafio que se coloca ao partido e que foi a marca mais visível neste congresso: as eleições autárquicas de 2017. É certo que a forma, a substância, com que o partido se apresentar aos portugueses no seu papel de oposição e alternativa à actual governação terá o seu impacto sobre a capacidade de manter ou crescer o seu eleitorado e a preferência dos portugueses. É certo que uma mudança reformista, de compromisso político com o seu adn ideológico, só trará benefícios ao partido se o PSD se souber posicionar ao centro e recuperar a sua essência social-democrata. Mas que não restem dúvidas. O partido precisa, como do pão para a boca, de vencer as eleições autárquicas de 2017. Não apenas, como foi referido por alguns congressistas, para conquistar as presidências da ANMP e da ANAFRE (isso é o menos e de somenos, convenhamos). O PSD precisa de vencer as autárquicas do próximo ano para recuperar a sua veia de partido autárquico, de proximidade com as comunidades e os cidadãos. Precisa de voltar a ter mais câmara e mais juntas de freguesia para preparar o seu regresso à governação. Precisa de vencer como barómetro da sua capacidade política e do seu potencial como alternativa, ganhando estratégia e argumentação para o combate final das legislativas de 2019. De outra forma, quer o partido, quer Passos Coelho, entrarão num ciclo político preocupante de “travessia do deserto”. E há aqui três aspectos demasiado importantes: a forma como serão encaradas as autarquias de Lisboa e Porto neste processo eleitoral; o impacto político que possa surgir de uma eventual transposição do compromisso entre PS e BE (deixando de fora o PCP) para o processo autárquico; a forma como as estruturas de base, nomeadamente as distritais, conduzam o processo de escolha dos melhores, limando fissuras e fracturas existentes (não vale a pena esconder a cabeça na areia há “feridas” por sarar). Se o PSD superar estes desafios mais facilmente ganhará a batalha eleitoral seguinte, não esquecendo que, após quatro anos de difícil e complexa governação, os eleitores, os portugueses, em 2015, ainda preferiram o PSD a qualquer outra alternativa que se apresentou ao eleitorado. E isso é um facto que não pode ser menosprezado. Segundo Passos Coelho “o PSD é um partido que não tem pressa” mas não tem tanto tempo como querem fazer parecer.