Tons de verão...
Publicado na edição de hoje, 25 de julho, do Diário de Aveiro.
Debaixo dos Arcos
Tons de Verão…
Ao contrário do que normalmente ocorre noutros anos, a denominada “silly season” (época tonta/idiota), este ano, nada tem de calma, sem sabor, sem motivos de interesse ou explosivos. Bem pelo contrário… Vamos por partes.
1. Os “não casos” que teimam em serem casos. Miguel Relvas, ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, tem “encabeçado” a lista dos momentos altos da política nacional. Primeiro com as contradições no processo das “Secretas”, em segundo lugar surge o caso das pressões ao jornal Público e por último (para já) com o processo da obtenção da licenciatura na Universidade Lusófona. Muita tinta já fez correr Miguel Relvas neste início de verão ao ponto de se transformar mais num “fardo” para o governo e Passos Coelho do que propriamente no seu garante e sustentação. Aliás, Miguel Relvas rapidamente passou de um “não caso” para o principal ministro remodelável.
2. A Igreja da oposição. Mais recentemente alguns sectores da Igreja Católica, em Portugal, têm sido mais críticos e interventivos do que a oposição parlamentar toda junta. O caso tomou proporções mais significativas e mediáticas depois da intervenção do Bispo das Forças Armadas, D. Januário Torgal ao acusar o Governo de “profundamente corrupto” e de considerar alguns dos membros governativos como “diabinhos negros”. Mesmo que a Comissão Episcopal Portuguesa tenha vindo, no imediato, afirmar que a posição de D. Januário Torgal é estritamente pessoal, a verdade é que também D. José Ortiga, Arcebispo de Braga, e D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu, vieram a terreiro criticar o Governo. Sempre defendi que a Igreja devia e deve ter um papel activo na sociedade, como resposta e intervenção social e também política. Mas é óbvio que as declarações de D. Januário não são inocentes e em nada coerentes ou isentas. A realidade social portuguesa, as eventuais e supostas situações de corrupção e de falta de ética política não são, em nada, exclusivas deste governo. Antes pelo contrário. A verdade é que a posição assumida pelo Bispo das Forças Armadas mais não é do que tornar público o descontentamento da classe militar, a relação, mesmo que sempre dissimulada e camuflada, de sectores da Igreja (Opus Dei à cabeça) com, principalmente, uma das vertentes da Maçonaria (da qual é “seguidor” o ministro Miguel Relvas). É claro que D. januário tem informação privilegiada para tecer as afirmações que fez. Mas também a responsabilidade acrescida de as referenciar e, junto das entidades próprias, apresentar as devidas provas. O contrário só ajuda a incendiar uma época já por si própria quente.
3. Municipalismo e Poder Local a ferro e fogo. Depois do processo da Reforma da Administração Local que teve como principal objectivo a fusão e redução do número de freguesias, que se encontra em fase de conclusão (auscultação dos órgãos locais), o governo prepara-se para estudar e reformular a lei leitoral autárquica, com ou sem a “ajuda” do PS. Mas para além disso, o Poder Local tem sido “vítima” de um processo histórica de pressão e reformulação: os condicionalismos económicos e financeiros; as limitações ao exercício democrático da governação autárquica; a supressão de urgências e serviços hospitalares e, mais recentemente, o processo dos mega-agrupamentos escolares e da reforma judicial (tribunais). Não se afigura fácil a vida autárquica para o futuro. Futuro que, para o final deste ano se começará a delinear com vista às eleições autárquicas de 2013.
4. Cumprir ou não cumprir, eis a questão. De forma muito linear e sintética, este verão é igualmente marcado pela questão das contas públicas, do défice, do cumprimento do memorando da Troika e pela “movimentação” da economia, principalmente, europeia. Espanha continua uma incógnita com Itália e França “à espreita”, bem como a indefinição e incerteza quanto ao futuro cada vez mais cinzento da Grécia com óbvias implicações ao nível da zona euro. Mas no caso interno são também várias as incertezas quanto à realidade portuguesa: o primeiro semestre demonstra o cumprimento das metas propostas para o défice orçamental, o que significa o cumprimento das medidas impostas pelo memorando de ajuda externa (mesmo que à custa quase que exclusiva do sacrifício dos portugueses e quase que apenas do lado da receita – veja-se o exemplo do corte da despesa salarial no Estado em 17% por força da anulação dos subsídios. No entanto, há dados que deixam dúvidas claras quanto ao cumprimento total das metas e do défice proposto: o desemprego; o aumento da despesa com prestações sociais como o subsídio de desemprego (mais 22,4%) e o Rendimento Social de Reinserção; uma diminuição muito forte do valor espectável de receitas fiscais (nomeadamente o IVA e os impostos como o Imposto sobre Veículos ou o dos combustíveis); e, mais preocupante, o aumento da dívida pública que subiu para os 117% sobre o Produto Interno Bruto, sendo a terceira mais elevada da zona euro. Daí que se dividam as opiniões sobre a flexibilização das medidas da Troika (menos juros, mais tempo, mais dinheiro) e se torne claro que, em Agosto, não basta apenas uma avaliação positiva.