Centralidades com escala...
Publicado na edição de hoje, 31 de outubro, do Diário de Aveiro.
Debaixo dos Arcos
Centralidades com escala
Têm sido recorrentes as referências a novas centralidades, com alargamento de competências, com novas dimensões e escala que favoreçam o surgimento de massa crítica e melhoria de serviços que promovam o bem-estar e o desenvolvimento das comunidades.
Tudo começou com o que tem sido, há alguns anos a esta parte, uma constante alteração e “refundação” (para usar terminologia política actual) do paradigma do poder local e regional. Surgiram as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDRs), as comunidades intermunicipais (para além das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto) como a AMRia, a GAMA e a CIRA, no caso de Aveiro, e, mais recentemente, todo este processo da Reforma da Administração Local, da qual é reflexo a fusão/agregação de freguesias.
Toda esta realidade tem subjacente a questão da dimensão geográfica que permita escala de investimento e gestão, melhor administração de recursos, mais eficácia nos serviços a prestar. Mas há uma outra face da moeda que tem a ver com a questão de identidade social, cultural e histórica das diversas comunidades envolvidas. E aqui começam as dificuldades, acrescidas com realidades como a económica e o “peso político” que cada uma comporta.
Surgem os bairrismos, a imposição do mais forte sobre o menos forte (ou mesmo, mais fraco) ou as “velhas” rivalidades, entretanto ultrapassadas no tempo com as migrações (trabalho, estudo, novas oportunidades de vida) e com as novas gerações que se vão localizando em terras “adoptadas”.
Aveiro sempre teve este problema existencial em relação a Coimbra. Quer pelo obstáculo geográfico da dificuldade de enquadramento a norte ou ao centro de Portugal, quer pelo facto de Coimbra ter absorvido uma centralidade administrativa que “retirou” ou quer pela ligação académica de muitos aveirenses à Universidade de Coimbra (principalmente antes da criação da Universidade de Aveiro).
Há umas décadas foram direcções regionais que se perderam em Aveiro e que ficaram “centralizadas” em Coimbra, a CCDR-C, mais recentemente foi a questão do Museu de Aveiro e agora surge nova nuvem cinzenta com a polémica da eventual futura entidade que passe a gerir o saneamento (e a água) dos municípios de Aveiro, Coimbra e Leiria. Sem esquecermos que a Direcção Regional de Economia, o Turismo Centro Portugal e a gestão partilhada dos Portos de Aveiro e Figueira da Foz foram “conquistas” aveirenses. Mas a questão é que estas “guerrinhas” não têm qualquer sentido e levam, a maior parte das vezes, a um desleixo no cuidar das “coisas” aveirenses e ao alheamento na defesa dos interesses legítimos da nossa região.
É que o “mal” desta realidade não está em Coimbra. Está em Aveiro e nos aveirenses. Seja à escala regional ou até mesmo local. Sabemos criticar, sabemos condenar e transformarmo-nos em vítimas. Mas somos completamente inoperantes, de um conformismo às vezes preocupante, de uma inércia gritante. Coimbra apenas defende os seus interesses e marca uma posição regional que Aveiro não consegue impor, principalmente por que nos falta uma capacidade e um peso político que há muito perdemos. Nós só nos temos de culpar de nós próprios. Por não aproveitarmos novas realidades e novos contextos sociais e económicos, e, principalmente, por nem sabermos aproveitar as oportunidades que nos surgem (caso da importância estratégica do Porto de Aveiro, da centralidade na cidade do Turismo Centro de Portugal e da Direcção Regional de Economia).
Em jeito de conclusão e a título de exemplo que ilustra esta realidade. Salvo raríssimas excepções, quem, de Aveiro, alguma vez se preocupou (já para não dizer, visitou) com o Museu de Aveiro (tradicional Museu Sta. Joana)?!
Estamos preocupados com Coimbra e Aveiro corre o risco de perder o Tribunal do Trabalho porque anda praticamente sozinha a delegação de Aveiro da Ordem dos Advogados a tentar encontrar um espaço digno e a fazer um esforço para que Aveiro não perca este importante serviço de justiça. É isto que é defender a centralidade de Aveiro?!
Se calhar, ainda bem que temos Coimbra por perto… digo eu.