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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

A ler os outros... Paulo Baldaia no Diário de Notícias

paulo baldaia.pngA propósito do post de ontem "Gente como nós... desesperadamente" e do artigo de hoje do Diário de Aveiro "Uma Europa sem rumo" encontrei este excelente texto que vale a pena ler.

Paulo Baldaia, no Diário de Notícias ("Gente como nós, com filhos nos braços"), faz bem em lembrar a memória de uma Europa que, no pós Guerra, viveu, internamente, semelhante drama, sem esquecer que o arame farpado não é solução. Aludindo ainda a uma excelente peça da Bárbara Baldaia, na TSF, com o mesmo título.

Uma Europa sem rumo

eu_DA_debaixo-dos-arcos.jpgpublicado na edição de hoje, 30 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Uma Europa sem rumo

Continua o drama incontrolável dos refugiados e migrantes e que são, pelas razões mais trágicas, notícia constante no dia-a-dia europeu. Do Mediterrâneo transformado em cemitério para aqueles que não conseguiram chegar às costas da Grécia, Malta e Itália, a tragédia passou para o interior da Europa atingindo França, Inglaterra e o norte europeu, aumentando também o número de migrantes que tenta entrar no velho continente por via terrestre. Basta lembrar a situação de Calais ou, recentemente, as cerca de 100 vítimas encontradas no interior de um camião abandonada numa berma de uma auto-estrada austríaca. Já para não falar no permanente atravessamento do Mar Mediterrâneo em direcção à Grécia, Itália e Malta.

Toda esta problemática social e humanitária de dimensões inquestionáveis vem colocar a nu a enorme fragilidade do actual estado de sobrevivência União Europeia. A crise financeira e os resgates internacionais a alguns países da UE vieram questionar a solidariedade entre os Estados-membros. O surgimento de um número significativo de partidos eurocépticos, o crescente sentido de independência e abandono do projecto europeu, a tentativa de "elitizar" (a seis países, como recentemente sugeriu Hollande) a Europa só vem demonstrar a fragilidade política da União Europeia. A incapacidade de encontrar e projectar medidas e políticas, quer na origem, quer no acolhimento, que minimizem e estabilizem este drama humanitário, revela uma Europa sem capacidade de intervenção, sem sentido de unidade e entreajuda. Durante muito tempo (demasiado tempo) o centro europeu olhou com inquietante indiferença para a tragédia quase que diária na costa grega e italiana, até que o drama chegou ao coração da França, às portas de Inglaterra, ao centro do norte europeu. E aí, já as “virgens ofendidas” levantaram as suas vozes, já o problema deixou de ser periférico, já havia a necessidade da Europa distribuir recursos e implementar medidas, apenas porque não era a Grécia, a Itália, o sul de Espanha, mas a toda poderosa Inglaterra, França ou o Norte Europeu.

É esta a Europa falida no seu projecto: uma União Europeia dos subsídios e fundos, das regulamentações, dos burocratas e dos mercados financeiros. Uma Europa de um projecto político, social e económico comum e único e que há muito (mesmo antes do drama dos refugiados) se afundou no Mediterrâneo, ficou presa nos arames farpados ou nos muros de betão, ou se perdeu numa berma de uma auto-estrada.

Uma Europa sem qualquer capacidade de se impor internacionalmente, de encontrar e ser parte de soluções, de implementar políticas coerentes e de assumir as suas responsabilidades. Por mais muros que se ergam e por mais arames farpados que se coloquem nas fronteiras, por mais força militarizadas que se disponibilizem, por mais vigias e controlos que se façam no Mediterrâneo, por mais que se acene com o “fantasma” anti-Schengen, vamos continuar a assistir, dia após dia, a centenas de pessoas desesperadas à procura de um sonho e de uma esperança, da própria vida (algo que não encontram ou perderam no centro de África, no Magreb, na costa africana do mediterrâneo, no Médio Oriente), a tentarem entrar na Europa e à espera que a Europa os acolha. Uma Europa que ainda não percebeu que as situações que levam ao desespero de milhares de crianças, jovens, adultos, idosos, pelas suas condições de vida abaixo do limiar da sobrevivência, onde tudo o que está para além do Mediterrâneo (mesmo a morte na sua travessia) é sempre melhor do que o que se lhes deparar no seu dia-a-dia, é da sua responsabilidade pela forma exploratória com que olham para aqueles países, pela instabilidade social e política que a Europa criou ou ajudou a criar, pela miséria a que aquelas povos foram votados. E este assumir de responsabilidades cabe, também, à União Europeia, não serve é fazer-se apenas de vítima (que o não é).

Gente como nós... desesperadamente

Migrantes 01.jpgDepois das férias (algumas) o regresso.

Antecipando o artigo da edição de amanhã do Diário de Aveiro("Uma Europa sem rumo"): a tragédia humanitária dos migrantes/refugiados.

Segundo a ACNUR (agência da ONU para os Refugiados) cerca de 300 mil migrantes chegaram à Europa, este ano, quando ainda faltam quatro meses para o fim de 2015, tendo-se registado cerca de 2500 mortes na travessia do mediterrâneo, também só neste ano.

Semana após semana (para não ser tão extremista num dia após dia) há novos dados, novas notícias, mais tragédias.

Definitivamente a Europa demonstra, na incapacidade de lidar com este drama (na origem e no centro europeu), a sua fragilidade, a sua fragmentação e desmoronamento. Pior, a Europa começa a dar sinais de estar refém de extremismos e radicalismos que a condicionam na sua liberdade, fraternidade e igualdade.

A União Europeia ficou reduzida a meros fundos e subsídios, a uma burocracia regulamentar e à pressão dos mercados financeiros. Sem solidariedade, sem política, sem resposta social, sem unidade em torno de um projecto comum (que esteve na sua génese e que definhou perante a crise financeira).

No entanto, a bem da verdade e por uma merecida justiça, importa destacar.

É tão fácil, publicamente ou não, criticar e acusar Angela Merkel pela posição economicista que a Alemanha impõe à Europa. Pena é que não haja a mesma frontalidade pública para aplaudir a coragem política que a chanceller alemã tomou ao colocar a Alemanha na vanguarda da defesa dos direitos humanos e no apoio humanitário aos refugiados e migrantes, mesmo contra forte pressão da extrema-direita da Alemanha. ("Merkel vaiada à chegada ao centro de refugiados atacado por neonazis", in Diário de Notícias de 26 de agosto de 2015).

«O Governo de Angela Merkel suspendeu para os sírios a regra da convenção de Dublin que permite expulsar imigrantes ilegais. A Síria tem sido palco dos mais sangrentos atentados do auto-designado "Estado islâmico". A Alemanha é o único país que suspendeu a regra da convenção de Dublin e que não está a forçar refugiados sírios a regressar ao país de entrada no território da União Europeia.» fonte: Jornal de Negócios de 26 de agosto de 2015.

Mais ainda... Portugal dá igualmente uma imagem muito positiva na ajuda e solidariedade humanitária perante este enorme pesadelo humano.

No princípio do mês de agosto, o Governo aprovou um plano estratégico humanitário que prevê o acolhimento de cerca de 1500 refugiados envolvendo os os ministérios dos Negócios Estrangeiros, Defesa Nacional, Administração Interna, Saúde e Segurança Social. Mas é também a própria sociedade portuguesa que dá mostras de um inquestionável sentido solidário. Segundo a presidente do Conselho Português para os Refugiados, Teresa Tito de Morais, tem vindo a aumentar (são já cerca de três dezenas) o número de empresas e cidadãos disponíveis para acolherem migrantes e refugiados.

(créditos da foto: Alkis Konstantinidis/REUTERS)

Breves notas pré-eleitorais #1

canais tv portugal.jpgA coligação PSD-CDS, "Portugal à Frente", ganhou, à primeira vista, a primeira batalha da campanha eleitoral ao inviabilizar os debates televisivos com todos os lideres dos partidos. Em teoria, os chamados "frente-a-frente" permitem uma melhor discussão programática e evitam, no caso da coligação, uma maior exposição a todo o "fogo cruzado" da oposição.

No entanto, importa realçar que o argumento usado pela coligação PSD-CDS não faz qualquer sentido (a não inclusão de Paulo Portas nos debates). A presença de Paulo Portas iria duplicar a participação da coligação, para além de ser totalmente descabido o confronto discursivo entre Portas e Passos Coelho.

É Verão… isso é que importa.

bombeiros cansados.jpgpublicado na edição de hoje, 16 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
É Verão… isso é que importa.

Somos, definitivamente, um país, um povo, uma sociedade, das mais díspares convicções, das posições mais contraditórias, das mais surreais relações com as realidades.

Passamos horas, dias, a fio a discutir cartazes eleitorais, nem tanto pela questão da sua semiótica, pelo impacto da mensagem política, mas pela sobrevalorização ridícula dos rostos que lá surgem. E andamos nisto há dias, nas mesas dos cafés, nas redes e sociais e, pasme-se, na imprensa/comunicação social. De repente deixaram de existir propostas programáticas ou promessas eleitorais. O país parou a olhar para outdoors. Mas parou mesmo, sendo previsível que tal paragem (alheamento, distracção, apatia, indiferença, marasmo) se agrave com o arranque, já este fim-de-semana, de mais uma temporada futebolística, com toda a capacidade que o mundo da bola tem de provocar a alienação colectiva.

A recuperação económica anunciada, o desemprego/emprego, a balança comercial (importações/exportações), a pobreza, o custo de vida, a saúde, a justiça, a educação, o Estado Social, tudo isto, com o calor do Verão (com mais ou menos sol, com mais ou menos chuva), deixou de fazer parte da vida e da realidade dos portugueses. Nada resiste às férias, a não ser a falta de senso dum fait divers vácuo em plena campanha pré-eleitoral, às portas da rentrée política. Vivemos mesmo o sabor de uma inquestionável silly season. O país foi a banhos.

Ainda há poucos dias, neste mesmo espaço, sob o título “andamos distraídos”, aludi à estratégia política do encobrimento dos números dos incêndios em pleno ano eleitoral: um aumento significativo, no primeiro semestre deste ano, em relação à média da última década, sendo que as últimas semanas têm contribuído, em muito e em demasia, para o agravamento da situação (por exemplo, em Vila Nova de Cerdeira, em Terras de Bouro ou na Serra da Estrela, entre muitos outros infelizmente). O tema tem tido uma expressão reduzida e insignificante na agenda pública, por um lado porque, felizmente, não têm ocorrido episódios trágicos como há dois anos, por exemplo, mas essencialmente por questões eleitoralistas. Mas até nisto se nota o espírito balnear e veraneante dos portugueses.

Uma inqualificável realidade que destrói património colectivo, a natureza e o ambiente, alguma da pouca economia que nos resta, coloca em risco (quando não os consome) a vidas das pessoas e os seus bens, quando tragicamente leva a vida aos heróicos bombeiros, tem impactos na realidade do nosso dia-a-dia de formas tão absurdamente distintas: sobressai a indiferença em relação à quantidade de área que desaparece da nossa floresta e da nossa natureza, cresce a atenção quando surge a tragédia humana ou patrimonial. Numa relação solidária que existe, a nível internacional (nomeadamente europeu), entre as forças de protecção civil, os nossos bombeiros são aplaudidos em plena via pública quando atravessam as fronteiras e se juntam ao desespero dos seus congéneres espanhóis, como foi disso exemplo recente na Extremadura espanhola, na Sierra de Gata, para onde se deslocaram cerca de 100 operacionais e 30 viaturas; em contrapartida os Bombeiros de Braga, Ponte de Lima, Póvoa do Lanhos e Viera do Minho, ainda há poucos dias se queixavam do abandono, da indiferença e da falta de apoio por parte da população, nomeadamente na vertente alimentar. O reconhecimento e o agradecimento público, que, voluntaria e espontaneamente, surgiam no seio das comunidades que se viam protegidas pela intervenção das corporações, esvaneceu. Acresce ainda a desvalorização política e governativa para esta realidade quando diminuem os apoios à Protecção Civil, aos Bombeiros, ao combate, ou quando a Assembleia da República aprovou, em junho, A lei que define os objectivos e prioridades da política criminal até 2017 onde o incêndio florestal deixa de ser prioridade na investigação criminal.

Por último, o burlesco e o grotesco da nossa identidade nacional. A indignação assolou os banhistas da praia fluvial em Caldas de Sangemil, Tondela, que se viram privados do seu banhinho nas belas águas do Rio Dão só porque um helicóptero que combatia o incêndio no Parque Nacional da Serra da Estrela resolveu ter o desplante de abastecer, em dois dias seguidos, naquela praia, sem qualquer aviso prévio (provavelmente em carta registada com aviso de recepção). O descaramento do helicóptero… que se lixem as nossas matas. É Verão… isso é que importa.

(créditos da foto: Maria João Gala / Global Imagens)

Para além das demagogias

eu_DA_debaixo-dos-arcos.jpgpublicado na edição de hoje, 12 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Para além das demagogias

O tema da variação da taxa de desemprego versus criação de emprego, ou, por si só, o próprio desemprego, foi sempre um tema polémico, complexo, capaz das mais diversas leituras, interpretações ou conjecturas. Isto há vários anos e legislaturas, não é só de agora. Os números são lidos, treslidos e manipulados ao sabor da ideologia, da partidarite e da concepção política. Basta recordar as recentes polémicas em torno dos cartazes do PS nesta pré-campanha eleitoral e que provocaram as mais diversas reacções de apoio e crítica. Não há, nesta matéria, ninguém isento.

Daí que (por mais que me custe) tenho de concordar com Marques Mendes. O tema do desemprego deveria ser tratado com o maior cuidado, com a maior cautela e fora da fácil demagogia política e eleitoral, porque mais que os números, as taxas, as variações ou a manipulação estatística, por detrás de cada 0,001% está um rosto, uma vida, uma família, um desespero, a angústia de um futuro ausente, o sentimento de inutilidade e inactividade que em nada dignifica a condição humana. A par da pobreza e dos números cada vez mais preocupantes que a sustentam, a falta de emprego, o desemprego, a necessidade de abandonar a casa e o país, são realidades duras de mais para a maioria dos portugueses a quem “a(s) crise(s)” (e não só nestes últimos quatro anos), infelizmente, bateu à porta.

Afigura-se como mais digno, humanista, e, do ponto de vista político, muito mais ético, que o debate sobre o desemprego e/ou o emprego seja mais centrado nas soluções e no seu combate, do que propriamente no sobe e desce dos números, nos triunfos ou nas responsabilidades, até porque estas são repartidas, infelizmente, há algumas décadas. E é importante que se seja realista e pragmático: os Governos não criam emprego (a menos que engrossem a despesa pública com o aumento dos recursos humanos na Administração Pública) mas os Governos podem gerar desemprego, quando em causa estiver a eficácia e eficiência da gestão governativa face às conjunturas, às políticas e à forma como se combatem as crises.

Por mais foguetes e vivas que se possam agitar, por mais louros e troféus que se queiram apresentar, por mais acusações, críticas e contraposições que se queiram tomar, o desemprego é dos mais graves problemas que vivemos, ao qual não deixará de estar associada, para além da instabilidade social e da pobreza, a complexidade social do agravamento da demografia nacional, seja pelo aumento da emigração, seja pela baixa taxa de natalidade ou pelo envelhecimento do país.

E não é fácil olharmos para os mais recentes dados publicados e ficarmos indiferentes porque, para além dos números, também se trata de vidas: a população portuguesa irá decrescer 11% até 2050. Seremos o 18.º país a perder mais habitantes; ou que, em 2030, Portugal será o terceiro país do mundo com a população mais envelhecida (50,2 anos em média), logo depois do Japão (51,5) e da Itália (50,8). Quanto ao número de habitantes, Portugal vai passar dos actuais 10 milhões para 9,845 milhões em 2030, 9,216 milhões em 2050 e 7,407 milhões em 2100. Segundo dados da OCDE.

Um país reduzido a "outdoors"... tristemente.

legislativas2015-cor-web_pequeno.pngComo se não houvesse amanhã, nem nada de mais importante, continua a guerra político-partidária em torno dos cartazes/outdoors da campanha eleitoral. Agora as atenções viram-se para os cartazes da coligação "Portugal à Frente" com as críticas do Partido Socialista a preencher espaço nas redes sociais, como resposta à polémica que surgiu aquando dos cartazes socialistas.

O PS reclama ao eleitorado "Confiança", enquanto a coligação PSD-CDS afirma que, finalizado o processo de resgate,o país está melhor e que "Agora Portugal pode mais". Os chamados "slogans" eleitorais eram, por si só, suficientes para que o combate político e ideológico se centrasse nas propostas programáticas, nas políticas e na ideologia (se é que ela ainda existe).

Mas não...

Tal como aqui referi houve um significativo "tiro nos pés" no arranque da campanha socialista, algo, aliás, observado e criticado internamente. Não vale a pena esconder os factos (datas, números, histórias reais, rostos) mesmo que este tipo de polémica não traga nada de relevante à campanha. Mas o que deixa alguma surpresa é o PS querer entrar pelo mesmo caminho e exercício ao criticar os cartazes da coligação, tentando, em vão, assemelhar as realidades aos cartazes socialistas. Aliás, alguém alertava no twitter: "Mas é pelos cartazes da coligação que a esquerda quer criticar a direita?" (@G_L).
Pensar-se-ia que seria legítimo criticar as mensagens contidas e projectadas nos cartazes. Seria e é. Mas não é isso que acontece. As críticas socialistas ficam-se pelos rostos e pessoas que surgem nos outdoors. Só que há diferenças.

1. Os cartazes da coligação expressam políticas e medidas governativas (correctas ou não, verdadeiras ou não) e não histórias reais como fundamentaram, publicamente, muitos socialistas.
2. As pessoas que surgem nos cartazes da coligação não estão pessoal e particularmente identificadas com a mensagem. Não há, como havia no caso do PS, um "eu" que personificava a mensagem contida (e que veio a verificar-se não ser verdadeiro).
3. Sempre houve, e sempre haverá, em qualquer campanha eleitoral recurso a bancos de imagens ou a figurantes. Não é minimamente relevante se a figura "A" é australiana, a "B" francesa, ou a "C" marciana. A questão, para além da ausência de relação pessoal com a mensagem, passa pela legalidade ou legitimidade no uso da imagem. A fazer fé nas informações posteriores houve quem não soubesse qual o destino da sua fotografia, nem tivesse dado autorização para tal.

Mas a questão dos cartazes é muito mais que este fait divers ridículo e sem qualquer importância para a maioria do eleitorado.

Não há discussão programática, do futuro, da alternativa ou da continuidade, das propostas e das promessas (sim, porque não há, neste mundo e nesta vida, campanha eleitoral sem promessas).

Até se podia discutir porque é que o PS não conseguiu, no meio da crise que o país atravessou e atravessa, uma história real de um desempregado, de um emigrante, de um recibo-verde, de um pensionista. Afinal, o país pode estar mesmo melhor...
Da mesma forma que a coligação PSD-CDS não conseguiu um cidadão português, um empresário português, um jovem ou um sénior português, que testemunhasse o aumento de emprego, as taxas moderadoras, o aumento das exportações, mais igualdade no mercado de trabalho, mais criancinhas nascidas, etc, e teve que recorrer a um banco de imagens. Afinal, o país pode não ter melhorado assim tanto...

E a política nacional é isto... depois admiram-se da imagem que os políticos e partidos criam nos portugueses, e no número de abstenções nas eleições.

É triste... muito triste.

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Nem muros, nem arames farpados

arame farpado.jpgpublicado na edição de hoje, 9 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Nem muros, nem arames farpados

O sentido, o significado e os princípios fundadores de uma Europa que viu, no pós-guerra, há cerca de 70 anos, uma janela de oportunidade para se afirmar nos destinos do mundo, no plano geopolítico e geoestratégico, têm, cada vez mais, os dias contados. Resultado, entre outros factores, da necessária ajuda americana na II Grande Guerra não foi capaz de se tornar auto-suficiente no plano militar e da defesa, bastando recordar a ineficácia de uma resposta isolada no conflito dos Balcãs e a actual incapacidade de resposta no conflito na Ucrânia, com vantagem russa. Apesar de ter conseguido furar a cortina de ferro, fazer cair o muro e unificar as duas alemanhas e ter provocado a queda do Pacto de Varsóvia e da União Soviética, não é menos verdade que não conseguiu, entre as diversidades, encontrar a união e solidariedade, tão presente na sua fundação, entre os seus Estados, nem soube, até à data, apesar da convivência no seio da NATO, encontrar uma resposta para permanente entrave à Turquia. Do ponto de vista económico e financeiro os últimos anos têm demonstrado uma fragilidade e uma conflitualidade internas nas respostas à crise, criando um fosso entre os países periféricos e os do norte, entre os mais ricos e os menos ricos, que tem trazido uma instabilidade política e social preocupante e que tem fracturado a União Europeia. Por outro lado, ao fim de todos estes os anos, após a sua fundação, o euro não se tornou a moeda de referência nos mercados internacionais e a excessiva abertura e permissividade ao mercado asiático tem criado algumas dificuldades à economia europeia. A par disto… Nesta semana registaram-se os 70 anos da tragédia de Hiroshima (a 7 de agosto) e, hoje, precisamente, a 9 de agosto a tragédia de Nagasaki. No balanço imediato, no lançamento da primeira bomba, a “Little Boy” a bordo do bombardeiro “Enola Gay”, estimou-se um número de vítimas na ordem das 80 mil mortes, valor que disparou (mesmo sem nunca se apurar a realidade estatística), por força dos ferimentos e da radiação, para cerca de 140 mil. Dois dias depois, com o balanço trágico de Nagasaki, após o lançamento da “Fat Man”, sobre a cidade que albergava a maior base da Marinha Imperial Japonesa, o balanço final cifrou-se em mais de 250 mil mortos. Ironicamente, a par com o desembarque na Normandia, este seria o contributo para o fim do conflito da II Guerra Mundial. Mas o mundo não ficou melhor… vivemos, no pós-guerra, um período de aparente estabilidade, numa paz podre, que ia mantendo a conflitualidade, embora mais regionalizada, na América do Sul e Central, em África, na própria Europa, na faixa de Gaza, e, no pós-11 de setembro, no Médio Oriente e na orla africana do Mediterrâneo, provocando, para além de todo resultado óbvio da conflitualidade bélica, uma instabilidade política e uma destruição social e económica de dimensão inquantificável. E, neste ponto, de novo a fragilidade e a fraqueza europeia: a explosão da tragédia da migração. A Europa, para além da responsabilidade política, económica e militar, que deve assumir pelas posições tomadas na origem e no foco do problema, e para além da falta de solidariedade com os Estados-membro da faixa mediterrânea (Itália, Grécia, Malta, …), encara a tragédia humanitária da pior forma, agora que o problema também bateu às portas dos “donos da Europa” França e Inglaterra (a par da Alemanha), e da Hungria. É inadmissível, dentro dos princípios europeus, que se encarem as mortes (cada vez de maiores dimensões, ainda na passada quinta-feira mais de 200 mortes) no Mar Mediterrâneo, transformado em enorme cemitério (mais de 2000 mil mortes este ano), e o desespero às portas de Calais, com muros, com arame farpado, com cães, com indiferença, com extremismos. A Europa tem responsabilidades acrescidas neste alimentar de um sonho, de uma esperança, de quem prefere arriscar tudo (até a vida) do que ter a certeza da morte na sua própria terra e casa. A título meramente exemplificativo, a Europa transpôs, ou ajudou a transpor, o inferno para a terra em países da África Subsaariana, do Magreb, do Médio Oriente, do Corno Africano, etc., como a Argélia, Síria, Egipto, Líbia, Iraque, Somália, Afeganistão, Eritreia, Etiópia ou o Sudão.

Transformar as realidades política, social e económica, destas PESSOAS, em vidas muito abaixo das trágicas condições das favelas ou dos piores bairros de lata; deixá-las num limiar de sobrevivência que as faça olhar para a Europa, do outro lado do mar, como um oásis e a ÚNICA esperança de superar a morte imediata, sem uma resposta eficaz na origem, com a indiferença à legitimidade de reclamar a Declaração Universal de 1948; é assinar a sentença de morte para tantos cidadãos e a declaração de incompetência e impotência da Europa. Sob a capa de um falso humanismo e moralismo, de uma podre bandeira da democracia, de um ausente sentido de responsabilidade política, económica, social e humanitária, a Europa bateu no fundo, com novos muros, arame farpado e cortinas-de-ferro.

Tiros nos cartazes...

e também nos "pés" deste arranque da campanha eleitoral do Partido Socialista.

A controvérsia é mediática e tem ocupado a discussão pública e alguns espaços na comunicação social.

Tudo começou por ser uma mera e dispensável discussão estética sobre o primeiro cartaz da campanha eleitoral do PS para as eleições legislativas de 2015. Apenas e tão somente uma questão estética e de marketing que tinha tudo para terminar em poucos dias. Só que o "pior" estava para vir.

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Poucos dias depois surgiam novos cartazes para a campanha que, em teoria, traduziriam e seriam o espelho da realidade de muitos cidadãos: desemprego, Estado social, emigração, emprego. O objectivo seria o de associar histórias reais a uma frase chave que conseguisse almejar com a da coligação ("Agora Portugal pode mais" ou a da carta que Passos Coelho e Paulo Portas endereçaram aos portugueses projectando o futuro na expressão "depois da recuperação, a construção"). A frase, diga-se, é também ela forte, do ponto de vista político: "Não brinquem com os números, respeitem as pessoas", numa evidente alusão ao que tem sido, nas últimas semanas, a guerra dos números do desemprego/emprego.

Mas nada bateu certo, mais uma vez. E não tem a ver com quezílias partidárias, a conflitualidade discursiva dos períodos eleitorais ou embirração da oposição. É mesmo mau, as críticas são internas e a responsabilidade cabe ao PS.

Primeiro, as datas e os números. A associação de situações de desemprego ainda na governação de José Sócrates; a diferença entre o número de desempregados em 2010 e em 2012, dando a percepção que na actual legislativa foram reduzidos cerca de 133 mil desempregados: ou o cartaz dos recibos verdes em 2011, ano de transição governativa. As criticas não pararam de surgir e eram evidentes os esforços partidários para justificar e sustentar a enorme trapalhada entretanto gerada. Um cartaz, por regra e princípio, deve ser claro, conciso e centrar o foco e a atenção num aspecto relevante. Não pode deixar dúvidas, múltiplas interpretações ou ter a necessidade de um complexo conjunto de explicações programáticas (como se tivesse em "anexo" o programa eleitoral completo). A par disto veio a público a não veracidade das histórias e dos rostos que as acompanhavam, havendo ainda dúvidas quanto a legalidade do uso consentido das imagens: nenhuma das pessoas em causa está desempregada ou é emigrante. E era tudo tão escusado porque nem seria preciso o PS gastar tanto tempo e procurar muito para, nestes últimos quatro anos, encontrar histórias e pessoas reais (e não figurantes). Ou então, fica a dúvida se o país não estará mesmo melhor.

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É evidente que os cartazes, como outros elementos de campanha, são complementos a outras acções mais consistentes como os comícios, as acções de rua ou os debates. Se o tempo que falta para o ponto alto da campanha eleitoral e as eleições fosse maior do que aquele que é nesta data, esta polémica toda não passariam de episódios que a memória fraca dos portugueses acabará por fazer esquecer. Mas a verdade é que o tempo começa a ficar escasso e tão cedo o PS não se livrará da vergonha e da exposição pública.

Mas o verdadeiro problema de toda esta controvérsia não são os cartazes por si só. Para além de alguma descredibilização na campanha do PS, tudo isto serviu para desviar a atenção dos portugueses do essencial: as propostas eleitorais do PS e do PSD contidas nos seus programas e compromissos eleitorais. A bandeira e os temas-chave para os socialistas (desemprego, emprego e Estado Social) para esta camapnha eleitoral ficaram completamente "chamuscados" e perderam impacto visual.

E neste caso, não vale a pena o PS vir com muita demagogia porque a responsabilidade é, em grande parte, apenas sua.

É lamentável... e muito.

bruno macaes vs legrain no twitter.jpegA discussão alargou-se nas redes sociais, nomeadamente no twitter, mas também no facebook. Com a controvérsia a ganhar adeptos, posições e comentários, rapidamente chegou à comunicação social. Refiro-me à discussão que o Secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Bruno Maçães, trocou com um ex-assessor económico de Durão Barroso, na Comissão Europeia, o britânico Philippe Legrain, e um jornalista.

Uns acabaram a defender o secretário de Estado português, outros a criticá-lo, alguns a ridiculariza-lo. Em causa os vários comentários feitos pelos intervenientes na discussão, o tipo de argumentos, um “bloqueio” pelo meio, e o nome de Portugal com excessiva exposição.

Não vou, essencialmente por questões de tempo e pachorra, estar aqui a dizer quem é que “levou a taça” e a transcrever (foram demasiados) os vários comentários trocados entre ambos. Importa referir que o tema teve a ver com desemprego, emprego, economia e a crise, onde se incluiu a passagem da Troika por Portugal. Deixo isso para quem quiser andar a atear mais o fogo.

O que eu acho lamentável é um Secretário de Estado, ou qualquer outro membro do Governo ou afins, vir para a praça pública, para as redes sociais, alimentar polémicas sobre temáticas tão importante para o país, esquecendo-se que, para além de cidadão, tem responsabilidades políticas e governativas. Por mais que não o queira, qualquer argumento, comentário ou opinião emitidos estará sempre associado à sua condição de governante. A liberdade de expressão e opinião não deve servir de “capa” para a omissão das responsabilidades, do dever, da ética, do cuidado, do bom-senso, que deve pautar a gestão governativa e a preservação do bom nome do país. Por mais razão e argumentos que possam existir.

Isso é que é lamentável.

Do Portugal (infantil) real...

cantinas escolares.jpgJá aqui falei sobre o que entendo serem os perigos da retórica política ao usarem (os partidos, nomeadamente PSD e PS), como arma eleitoralistas, os dados do desemprego/emprego (embora o assunto não pareça minimamente esgotado, antes pelo contrário). Assim como acho que os programas eleitorais, acrescidos das mil e uma promessas, têm trazido muito pouco de novo ao debate político e ao esclarecimento dos cidadãos eleitores. Mais à esquerda são os discursos de sempre, louve-se a coerência ideológica mesmo que surrealista ou irrealista; mais ao centro e à direita falta o "mea culpa" pelos erros cometidos, o assumir das responsabilidades, a apresentação de dados, planos e acções concretas e quantificadas (sejam de que tipologia forem) das propostas apresentadas e que são mais que óbvias para o comum dos mortais (a consciência crítica, por mais que ainda haja caminho a percorrer, é mais acentuada e mais atenta do que era há uns bons anos).

Qualquer cidadão minimamente interessado e preocupado com a sociedade e o país sabe que é demasiado importante diminuir a diferenciação social e estabilizar a conflitualidade social, com a promoção de emprego, do desenvolvimento económico, com uma resposta eficaz para a diminuição sentida na economia doméstica e familiar, com salários justos e equilibrados, com respostas sociais do Estado eficazes e eficientes na saúde, na educação e na justiça (por exemplo); equilibrar as contas públicas e aumentar a confiança externa; promover a produtividade quer interna, quer externa; dignificar a ética política e a gestão do que é público; potencializar toda a mais-valia que o sector marítimo pode proporcionar. No essencial, as prioridades, com mais ou menos "floreado ideológico", são transversais ao CDS, PSD e PS. A diferença está na forma, na concretização, nas medidas e políticas a serem aplicadas... no fundo: a diferença reside no pormenor, no realismo, no reconhecimento do que é a vida e o dia-a-dia de cada português.

E essa avaliação, essa noção, da realidade e do realismo, esse "olhar" político, bem longe do demagógico, é que urge ser feita, correndo-se o risco, caso contrário, de continuarmos a ter política (e partidos) sem ser com os pés bem assentes na terra e longe do Portugal real e profundo.

E não é preciso grande esforço. Os dados são recentes, mas espelham uma realidade, infelizmente, repetitiva... demasiado repetitiva.

Segundo um relatório recente da OCDE (maio de 2015), "(...) o fosso entre ricos e pobres diminuiu mas Portugal continua entre os países mais desiguais e com maiores níveis de pobreza consolidada. (...) Portugal surge como o nono país mais desigual (0,388 - valor referenciado no coeficiente Gini) entre os 34 da OCDE, acima do índice médio destes países, que é de 0,315".

Um artigo de opinião (com toda a subjectividade da legitimidade da liberdade de expressão e opinião) publicado no Público de 9 de junho passado e assinado, colectivamente, por um grupo de membros do núcleo do "Manifesto para um Mundo Melhor (Manifesto Internacional de Cientistas Sociais), tem, a propósito do referido relatório da OCDE, esta expressão "nunca houve tantos recursos no mundo. Como permitimos que tantas crianças continuem a crescer na pobreza? (...) As assimetrias profundas em que crescem as crianças e jovens, uma parte significativa delas sem acesso a condições consideradas básicas, colocam em causa os direitos humanos e o desenvolvimento, tanto pessoal como social".

Ainda a este propósito da pobreza e a fatalidade social da obrigatoriedade do cumprimento do programa de ajustamento a que Portugal esteve sujeito nestes últimos anos, o Expresso de 5 de junho de 2015, sob o título "Pobreza aumentou para níveis do início do século", relata a opinião do professor universitário do ISEG, Carlos Farinha Rodrigues: o período de ajustamento das contas públicas e do programa da Troika traduziu-se "num recuo dos principais indicadores sociais. Entre 2009 (último ano pré-crise e pré-medidas de austeridade) e 2013 (último ano de que dispomos dados do INE), a taxa de pobreza aumentou de 17,9% para 19,5%. Este valor reconduz-nos aos níveis de pobreza registados no início do século".

Mas se os os dados sobre a pobreza, distribuição de rendimentos, desigualdades e prestações sociais reflectem o agravamento da pobreza e das desigualdades sociais, bastava um olhar atento à realidade para percebermos o que se passa, verdadeiramente, com o país. Uma notícia como esta ("Cantinas escolares abertas nas férias"), apesar de louvável do ponto de vista da iniciativa, só serve como lamento e tristeza pela contestação da realidade: há crianças que não fazem duas refeições diárias. Mal vai um país que precisa de manter abertas as cantinas escolares em período de férias.

 

A onda de choque

eu_DA_debaixo-dos-arcos.jpgpublicado na edição de hoje, 2 de agosto, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
A onda de choque

Já lá vão quase seis anos quando, em novembro de 2009, se começou a avistar no horizonte do Beira Mar dias muito cinzentos, face ao agravamento das condições de subsistência do clube (até atingir o ponto zero), face ao que era (e continuou a ser) o início da conflitualidade judicial. À data questionava, neste mesmo espaço (“Fundamentalismos e Extremismos”), a necessidade de se rever o projecto desportivo e o futuro da clube, definir realismos e não embarcar em desígnios desmedidos, nem que para tal tivesse que abdicar de tudo e recomeçar do zero.

Em novembro de 2010, nova crise se instaurava no clube com o agravamento da situação da gestão do clube e a usa ingovernabilidade: salários em atraso, contas e receitas penhoradas, dívidas à Segurança Social, etc. Dava-se conta da demissão do presidente Mário Costa e a conferência de imprensa dramática do vice-presidente António Regala. Pelo meio ficava a pairar uma SAD que em vez de se tornar “salvadora” do clube era, a olhos vistos, mais um dos seus carrascos. Importa realçar que a SAD não foi imposta, não tomou de assalto o clube (embora mais tarde, tomadas de assalto fossem mais do que notícia constante), não houve nenhum golpe de Estado; foi decisão livre e democrática dos sócios (ou dos que estiveram na Assembleia Geral e votaram). De novo as mesmas questões, as mesmas interrogações levantadas, as mesmas necessidades de se apurarem responsabilidades escondidas sob a capa da gestão colectiva, como se as responsabilidades (cíveis ou penais) surjam apenas no desempenho de acções individuais. A gota de água surgia no último trimestre do ano passado quando o velhinho pavilhão do Alboi (Santos Mártires) fechava, definitivamente, as suas portas, mesmo que esse fim estivesse mais que anunciado e não tivesse sido acautelado, nem encontrada alternativa. E novamente o mesmo questionar e interrogar (como foi aqui eco em “Um fim mais que anunciado”, a 29 de outubro).

A machadada final surgiu este mês: o Beira Mar bateu no fundo (campeonato distrital da II divisão) apesar dos alertas, dos sintomas, da crescente indiferença e da falta de esperança. O resultado prático é o mesmo do tantas vezes sugerido e apresentado; só é pena que este (re)começar do zero seja tão tardio, tão conflituoso, sem a dignidade da vontade própria do clube (gestão e sócios) mas sim por imposição e por ter sido empurrado para a lama.

E se ainda há vontade (e esperança) em fazer renascer o clube é imperativo que se acabem com as ilusões e com a emotividade que tantas vezes cegou a necessária e urgente racionalidade. Não houve nenhuma onda de choque em Aveiro. Deixem-se disso e parem para pensar. Isso é a emoção de um número, cada vez mais reduzido, de aveirenses ainda ligados ao que restava do Beira Mar. Já lá vai bem longe o tempo da conquista da Taça de Portugal. O clube foi-se esvaziando (mesmo em termos de património que não tem nenhum, zero), foi perdendo a sua identidade e a ligação a Aveiro. Os aveirenses (do concelho e não só da cidade) foram-se afastando do Beira Mar porque este foi deixou de ser referência e quebrou a ligação emotiva às pessoas. E isto não é uma questão geracional, é transversal. Os aveirense, mesmo os mais novos, sabem o que é o Beira Mar (infelizmente, pelas razões menos nobres face ao historial recente) mas já não se identificam com o clube e a sua história. Uns têm outras referências (Recreio Artístico, Galitos, Esgueira, Sporting de Aveiro, CENAP, Estrela Azul, os clubes de remo e canoagem de Cacia, Taboeira, Eixo, entre tantos outros) e outros, mesmo antes dos tempos da crise, deixaram de embarcar em “futebóis”. É que, por mais que algumas vozes (cada vez menos) “gritem aos sete ventos” por socorro, o Beira Mar afastou-se dos aveirenses. E isso é que importa questionar, analisar e projectar, se houver verdadeiro interesse em “salvar” a Instituição.

E de novo, ao fim de seis anos, as mesmas questões: Já alguém analisou as razões do afastamento do Clube em relação aos aveirenses?! Já se apurou quantos, dos cerca de 70000 aveirenses (concelho), são aqueles que se sentem identificados com o Clube e vivem a sua realidade actual? Já se questionaram as gestões anteriores?! Já se repensaram projectos e debateram opções tomadas? Já se repensaram os modelos de gestão? Já se discutiu o insucesso desportivo e a incapacidade de afirmação no futebol nacional?! Porque não se ouviram as mesmas vozes de hoje aquando da construção do novo estádio municipal e todas as implicações que teria no futuro do clube? Porque é que o Clube não consegue encontrar sinergias no tecido empresarial aveirense?! Se é que ainda há tempo e a quem interessar…

Para além das demagogias

envelhecimento.jpgO tema da variação da taxa de desemprego versus criação de emprego, ou por si só o próprio desemprego foi sempre um tema polémico, complexo, capaz das mais diversas leituras, interpretações ou conjecturas. Isto há vários anos e legislaturas, não é só de agora. Os números são lidos, treslidos e manipulados ao sabor da ideologia, da partidarite e da concepção política. Não há, nesta matéria, ninguém isento.

Daí que (por mais que me custe) tenho de concordar com Marques Mendes. O tema do desemprego deveria ser tratado com o maior cuidado, com a maior cautela e fora da fácil demagogia política e eleitoral, porque mais que os números, as taxas, as variações ou a manipulação estatística, por detrás de cada 0,001% está um rosto, uma vida, uma família, um desespero, a angústia de um futuro ausente, o sentimento de inutilidade e inactividade que em nada dignifica a condição humana.

Por mais foguetes e vivas que se possam agitar, por mais louros e troféus que se queiram apresentar, por mais acusações, críticas e contraposições que se queiram tomar, o desemprego é dos mais graves problemas que vivemos, ao qual não deixará de estar associada complexidade social do agravamento da demografia nacional, seja pelo aumento da emigração, seja pela baixa taxa de natalidade ou pelo envelhecimento do país.

E não é fácil olharmos para esta notícia do Expresso e ficarmos indiferentes, porque tal como em relação ao desemprego, também aqui de vidas se trata:

A população portuguesa irá decrescer 11% até 2050. Seremos o 18.º país a perder mais habitantes. Lá fora, a Índia está a caminho de ultrapassar a China como país mais populoso do mundo.
Em 2030, Portugal será o terceiro país do mundo com a população mais envelhecida (50,2 anos em média), logo depois do Japão (51,5) e da Itália (50,8). Quanto ao número de habitantes, Portugal vai passar dos actuais 10 milhões para 9,845 milhões em 2030, 9,216 milhões em 2050 e 7,407 milhões em 2100.