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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

antevisão de "Trump e os telhados de vidro europeus".

A presença da historiadora Irene Pimentel as notícias das 21, na SIC Notícias, há cerca de uma hora fez-me antever o texto da edição de amanhã do Diário de Aveiro, sobre a infelicidade dos Estados Unidos e do Mundo em ter na administração Donald Trump.

Dirão alguns, com razão, que é a democracia e que, apesar de tudo (e mais alguma coisa) há que saber respeitar a vontade da maioria dos eleitores que votaram nas últimas eleições presidenciais norte-americanas. Não o nego... mas é a mesma democracia que me legitima o direito à indignação, à crítica, à condenação e a reprovação.

Dizia muito bem a Dra. Irene Pimentel que há um princípio defendido pelos historiadores de que a "história não se repete". E não se repete porque os contextos e as personalidades que a escrevem são únicos e irrepetíveis. No caso de uma terceira Guerra ela não será, de todo e em todo, igual ou idêntica à II Grande Guerra. Obviamente que Trump não é igual a Hitler ou a Mosulini. Mas há um outro elemento que a historiadora refere com total pertinência e relevância: há matrizes que a história repete. A fragilização da democracia, o totalitarismo ou o autoritarismo são realidades perfeitamente repetíveis e que não serão cenários impensáveis numa administração norte-americana que tem Donald Trump na condução dos seus destinos. Já para não falar na concepção xenófoba, racista e sexista da vida e da sociedade, para além da negação de princípios básicos dos direitos fundamentais.

Trump será tudo o que de pior se poderia esperar no pior de George W. Bush. E foi há tão pouco tempo.

Aliás, W.Bush é um menino aprendiz de feiticeiro no populismo e no exercício do pior lado da política.

Donald Trump com a defesa programática do proteccionismo cego acabará por fragilizar a economia americana e a economia internacional, bem como a ordem social interna e externa e condicionará, pela negativa, a geopolítica internacional.

Mas há ainda um senão... esta seria a melhor e maior oportunidade para a União Europeia olhar para si, se rever e se revitalizar, a todos os níveis: sociais, geopolíticos, económico-financeiros e geoestratégicos (defesa). Mas..... são tantos os telhados de vidro na Europa.

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Polémica... "O nosso reino"; Valter Hugo Mãe; a tia e o Pai Natal; o Liceu Pedro Nunes e o PNL

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A polémica está mais que instalada, alargada, difundida, replicada e multiplicada, desde as redes sociais às comunidades escolares, passando pela comunicação social e política.

O livro do escritor Valter Hugo Mãe, "O nosso reino", faz parte da lista de publicações do Plano Nacional de Leitura. Até aqui nada de especial sendo o autor e o livro em causa um entre vários que compõe a referida lista.

Cabe a cada uma das escolas e respectivos docentes a escolha dos livros a recomendar aos alunos para leitura e foi, neste contexto, que o Liceu Pedro Nunes escolheu a obra "O nosso reino" para os alunos do 8º ano (3º ciclo). Alguns pais sentiram-se preocupados, incomodados e indignados com a escolha do livro em causa depois de se depararem com a seguinte passagem, replicada na comunicação social e nas redes sociais, perfeitamente descontextualizada e isolada do resto do romance de Valter Hugo.

(aqui se reproduz para exemplificação e contextualização)

"E a tua tia sabes de que tem cara, de puta, sabes o que é, uma mulher tão porca que fode com todos os homens e mesmo que tenha racha para foder deixa que lhe ponha a pila no cu.”

Estava ateado o rastilho e a pólvora não tardou a estoirar.

Choveram juízos de valor sobre o autor, sobre o seu valor como escritor, sobre a sua obra (como se fosse isso que estivesse em causa).

Choveram críticas sobre a escola e os professores, a ponto da obra se manter no Plano Nacional de Leitura mas desaconselhada aos alunos do 3º ciclo.

Este é o país que grita a todos os ventos "Je suis Charlie" e que tanto lutou pelas liberdades (nomeadamente a de expressão) mas continua sem saber lidar com a sexualidade.

Este é um país tão indignado com uma frase descontextualizada de um livro sem se preocupar com o seu todo e simultaneamente um país (e inúmeros pais e famílias) tão incoerente que acha normal a imensidade de nudes dos jovens e dos seus filhos partilhados nas redes sociais ou um país (demasiadamente imenso) que "vibra" semanalmente com "santificadas" Casas dos Segredos.

Volta "Império dos sentidos"... estás perdoado.

O peso político da TSU

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Publicado na edição de hoje, 25 de janeiro, do Diário de Aveiro (com o título errado por lapso meu)

Debaixo dos Arcos
O peso político da TSU*

Do ponto de vista técnico poderíamos estar a discutir percentagens de desconto, os impactos na capitalização do fundo da Segurança Social, que reflexos terá a medida no crescimento do emprego, até que ponto é determinante na saúde financeira das empresas, sejam elas de menor ou maior dimensão. Esta seria, obviamente, uma discussão interessante, muito concreta e realista que permitiria retirar ilações interessantes quanto às opções políticas a tomar (ou tomadas). No entanto, a questão da TSU (Taxa Social Única), concretamente no que se refere à parte contributiva da responsabilidade das empresas ou das entidades patronais, está envolta num ambiente muito mais político que técnico ou estratégico.

O Governo conseguiu, no âmbito do aumento do salário mínimo nacional (557€ para 2017), um acordo em sede de Concertação Social, assinado por todos os parceiros excluindo (como hábito) a CGTP, que incluiu a redução da TSU em cerca de 1,25%, sendo que a actual taxa se situa nos 23,75%. Apesar das divergências sentidas nas negociações e expressas publicamente pelos parceiros, Governo, UGT e Entidades Patronais, selaram os termos do acordo que é reconhecido pelas partes como importante para a estabilidade laboral e para a melhoria da competitividade nacional. No fundo, é um acordo importante para a estabilidade social e desenvolvimento da economia. Só que a medida particular da descida da TSU, peça importante no acordo, a par do aumento do salário mínimo nacional, não tem recebido a aceitação política necessária para a sua aprovação no Parlamento, nomeadamente pelo Bloco de Esquerda, pelo Partido Comunista Português e, estranha e incompreensivelmente, pelo PSD. E a posição contra assumida por Passos Coelho afigura-se estranha e incompreensível porquê? Do ponto de vista político e estratégico é um enorme tiro no pé, uma total incoerência política e partidária, um aniquilar de vez os princípios social-democratas que são a génese e foram o adn do partido, agora perdidos e abandonados completamente após a governação de Passos Coelho.

Apesar do BE e do PCP serem dois partidos que suportam parlamentarmente a governação são mais que conhecidas, através do seu braço sindical (CGTP), as suas posições quanto a matérias de concertação social, nomeadamente que envolvam entidades patronais. Até aqui nada de novo, bastando recordar qual o principal objectivo do BE e do PCP no apoio ao Governo PS. Nunca foram políticas, ideologias, pragmatismo ou estratégias de governação. Foi, tão somente, impedir pura e simplesmente que o PSD continuasse no Governo. Não há mais nenhuma outra preocupação relevante que não esta e será com esse objectivo que sobrevirá a “coligação parlamentar”. Já no caso da posição frontalmente contra à redução da TSU expressa por Passos Coelho e que vincula o PSD a um voto contra na Assembleia da República há um impensável surrealismo político e estratégico que não encontra justificação nenhuma. A não ser, por exclusão de partes, a continuação de uma oposição sem impacto significativo, sem que se apresente como verdadeira alternativa ao actual “estado de alma” da governação socialista.

Primeiro, o Governo não carece de apoio político prévio para a celebração de acordos em sede de Concertação Social. Em causa estão as relações entre as entidades sindicais (em representação dos trabalhadores) e as entidades patronais. Sempre que há a vontade expressa entre trabalhadores e empregadores de celebrarem um determinado acordo este, pela sua importância social e económica (e porque já tem o Governo à mesa das negociações como balança política) não pode, nem deve, ser a política a colocar um obstáculo à sua concretização pelo risco que tal importa no desenvolvimento do país e na credibilização das instituições (empregados e empregadores e a própria Concertação Social). Mais grave ainda se torna quando há, de uma forma global, um apelo de todos (sindicatos e patronato) à aprovação das medidas que sustentam o contrato assinado. Segundo, é importante relembrar os tempos do surrealismo irrevogável da governação PSD-CDS que aprovou mexidas na TSU pelos mesmíssimos princípios: maior competitividade e sustentabilidade das empresas, assegurar e criar emprego, estancar o desemprego. Já em 2016, com a redução de 0,75% da TSU o PSD, na oposição, deixou passar, também pelos mesmos princípios, a medida do Governo de António Costa sem que tenham havido interacções prévias entre PSD e PS, sendo que o BE e o PCP já eram o suporte parlamentar à sustentabilidade governativa.

O que mudou agora? Nada. Só mesmo um colossal erro político, um total desnorte estratégico que até podia (e devia) resultar num benefício claro do PSD (oposição) face a alguma instabilidade na chamada “geringonça” governativa. Nem isso, Passos Coelho soube aproveitar. Estranho para quem ainda há poucos dias ambicionava regressar ao poder. É grave e triste.

*título corrigido... na edição do Diário de Aveiro o título é do texto da semana passada e o lapso é da minha responsabilidade

De novo… a cidadania e as cidades

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publicado na edição de hoje, 18 de janeiro, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

De novo… a cidadania e as cidades

O assunto foi abordado pelo Primeiro-ministro, em finais de 2016, aquando da realização, na Póvoa do Varzim do XX Congresso da Juventude Socialista. No discurso proferido aos jovens socialistas congressistas António Costa afirmou que «não há futuro para as nossas cidades se o centro dessas cidades não for reocupado pela vossa geração que é a geração que tem de ter oportunidade para viver no centro da cidade que é onde podemos construir o futuro para todos nós». Com esta afirmação surgem de novo as temáticas da degradação social (económica e demográfica, por exemplo) e urbana (edificado, reabilitação) dos centros das cidades e, ainda, questões ligadas às responsabilidades de cidadania e do Poder Local.

Já por diversas vezes foi mote nestas páginas a defesa do princípio de que, mais do que qualquer outra vertente ou válido conceito, a recuperação dos centros das cidades, das chamadas zonas históricas (no seu sentido lato), só faz sentido, só terá impacto e sucesso, se as pessoas voltarem a viver (e a conviver) nesses espaços urbanos. São os casos concretos aveirenses da Rua Direita e suas envolventes, da zona do Alboi, do bairro da Beira Mar e, obviamente, da cada vez mais desertificada Avenida.

Podemos falar do “estado de alma” do chamado comércio tradicional que proliferou durante muitas décadas nestas zonas dos centros urbanos, umas mais típicas, outras mais históricas; podemos acrescentar a esta anterior vertente a maior ou menor quantidade de oferta de serviços (públicos ou privados) e as suas interferências nestes espaços; podemos falar sobre os impactos, positivos ou negativos, do crescimento (em muitos casos excessivos) do turismo local que tem sido relevante para a estagnação de muito do edificado mas que traz alguns problemas à descaracterização social destes centros; podemos, também, abordar a problemática (porque é, de facto, um problema) da reabilitação urbana e do espaço público; podemos, por último, avaliar os impactos que medidas e projectos de socialização, mais ou menos esporádicos e pontuais, possam ter na revitalização dos centros urbanos; mas a verdade é que sem as pessoas, principalmente, sem as pessoas voltarem a habitar e a dar vida, diária e permanente, a estas zonas emblemáticas das identidades das cidades, tudo não passará de exercícios pontuais, esporádicos, ou de medidas de cosmética.

Deste modo, a questão da requalificação urbana tem mais significado e relevância, numa responsabilidade partilhada entre o Poder Local (aplicação de medidas e políticas como os planos urbanos inseridos nos PEDUs e/ou ARUs, no caso concreto de Aveiro os recém aprovados PEDUCA e ARU) e a responsabilidade de cada cidadão, nomeadamente os proprietários de imóveis, investidores e comerciantes. Não basta, a estes últimos exigir que as cidades sejam devolvidas às pessoas se não houver corresponsabilização no seu cuidado, na sua gestão, no seu desenvolvimento.

Será, neste sentido de responsabilidade cívica e de pleno exercício de cidadania, sem que os cidadãos estejam constante e permanentemente à espera ou dependentes dos poderes locais e centrais, que se aguarda por uma iniciativa inédita em Aveiro e que será realizada a 4 de Fevereiro: o Aveiro Soup, sob o lema “Mudara a cidade, Sopa a Sopa”. Este recente exercício pleno de cidadania (que teve a sua origem há seis anos nos Estados Unidos, em Detroit) tem como objectivo a apresentação, num jantar simples e informal, de quatro projectos com impacto na cidade e na sua comunidade (previamente escolhidos por um colectivo de personalidades ligadas às áreas científicas, empresariais, sociais e culturais) que serão avaliados pelos presentes e destes seleccionado/votado um que será implementado.

Apesar de desconhecer por completo os quatro projectos a serem apresentados, este poderia ser um excelente e interessante momento para que possam surgir propostas sólidas para se revitalizar os vários centros urbanos da cidade de Aveiro. Que seja uma boa “sopa” de ideias e de cidadania.

Um "calor" esquisito...

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Esta é a expressão mais comum, mais ouvida e proferida, nos mais recentes dias (e provavelmente nos que se aproximam) quanto ao estado do tempo que teimosamente continua (é) de Inverno. Imaginem só a desfaçatez da meteorologia. Enfim...

Mas de facto está frio, tem estado frio e... vai estar ainda mais frio. Pelo menos são essas as previsões e os comunicados proferidos pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (antigo Instituto de Meteorologia) que aponta para uma descida (máxima e mínima) dos termómetros até os -10º C, sendo que as zonas norte e centro serão as mais afectadas por este teimoso inverno frio e seco (e assim deverá ser até ao final do trimestre). Estamos, por isso, debaixo (mesmo que moderadamente) da massa polar fria e seca que tem assolado a Europa, aí sim, com muito frio, muita neve e muito vento.

Os avisos são óbvios, mesmo que pertinentes: agasalhar bem, aquecer bem as habitações, hidratar (sim, com o frio também é preciso), cuidados redobrados com gelo e geada nas estradas, entre outros.

Mas há também avisos que se tornam polémicos e criticáveis. São os avisos que se relacionam com a saúde dos cidadãos. No caso concreto, com o pedido público para que os cidadãos não recorram em massa às urgências devendo recorrer, em primeiro lugar, aos Centros de Saúde.

São, claramente, avisos sem o mínimo de respeito quer pelos cidadãos, quer pelos profissionais de saúde, nomeadamente aqueles que, nestes momentos de maior procura, de maior pico de afluência, dão às vezes o que não têm ou podem, profissionalmente, nas urgências hospitalares.

Pedir aos cidadãos que recorram aos Centros de Saúde quando muitos fecharam portas e se tornaram distantes das populações, quando já não existem os antigos SAP's, quando os horários de funcionamento parecem ser exclusivamente dirigidos aos idosos ou desempregados, é, no mínimo, desrespeitar o cidadão, não ter qualquer consideração pelo bem-estar das populações ou comunidades.

Por outro lado, não repensar ou refazer a rede de Centros de Saúde (agora... Unidades Familiares) e esperar que as urgência hospitalares sirvam para isso mesmo, para as urgências, é não respeitar o trabalho dos profissionais de saúde e a própria Saúde do país.

Deixem-se de tretas... se infelizmente "gripar" e não conseguir parar a gripe, mesmo com horas de espera a fio, é para a urgência que irei. A alternativa não existe, não serve ninguém.

“2017… o ano de todos os perigos”

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publicado na edição de hoje, 11 de janeiro, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
“2017… o ano de todos os perigos”

Importa iniciar com anota de que o título do artigo de hoje é da autoria de Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda. E não é, de todo, menosprezável. Desta forma, o que esperar então de 2017 para Portugal e para os portugueses?

No passado domingo a abordagem centrou-se no marco importante na vida política nacional que serão as eleições autárquicas, entre Setembro ou Outubro, e que terão forçosamente uma leitura nacional, por mais que haja quem não o queira.

Mas este novo ano de 2017 tem muito mais para nos debruçar-nos e, tal como afirmou Catarina Martins, tem muito para ser avaliado e merecedor de reflexão. Comecemos, precisamente, pelo Governo e pelo apoio parlamentar que o sustenta (a chamada “geringonça”, já que foi palavra do ano). Tal como já o referi por distintas vezes e por maior que seja a vontade expressa publicamente de Passos Coelho em regressar ao poder/governo, só um forte abalo interno poderá, eventualmente, criar alguma fissura e rasgar os acordos celebrados entre o PS, BE, PCP e Verdes no final de 2016. Perspectiva-se, por isso, que António Costa possa terminar a legislatura à frente da governação da nação. Mas nem por isso, de facto, o ano de 2017 será um ano fácil para o Governo e para o novo arco da governação à esquerda. A aposta política na falta de justiça fiscal e tributária provocada pelo excesso de recurso aos impostos indirectos (importa recordar que o Governo, em 2016, cobrou mais 516 milhões de euros em impostos, sendo falaciosa a imagem do fim da austeridade) poderá criar, neste ano, alguma instabilidade e conflitualidade social e profissional em alguns sectores da sociedade, já que a reposição salarial e das pensões que foi sendo implementada até agora será facilmente anulada quer pela carga fiscal indirecta, quer pelo aumento do custo de diversos bens e serviços.

Do ponto de vista político alguma instabilidade poderá ser perspectivada na relação entre o Governo/PS e o BE e o PCP. Seja do ponto de vista económico-financeiro, seja a nível político-estratégico ou seja a nível social, a gestão das responsabilidades do Estado nas áreas da saúde, do emprego (por exemplo, das leis laborais) e da educação irá criar desafios significativos à governação e à relação de forças com os partidos da coligação parlamentar. Face ao que é o actual estado da educação em pleno sentido e ao estado caótico da saúde (no início do último trimestre de 2016 - Outubro - a dívida geral do Serviço Nacional de Saúde rondava os 1,7 mil milhões de euros) perspectivam-se alguns conflitos sociais e partidários para o Governo. Por outro lado, o processo polémico da Caixa Geral de Depósitos e de novo o regresso da liquidação ou nacionalização do Novo Banco serão exercícios complexos para o Governo que podem trazer impactos na fragilização das relações políticas com o BE e o PCP e, ainda, significativos impactos também para o cumprimento do défice e para as finanças dos cidadãos. Será nestas áreas que o Governo e a estabilidade da actual conjuntura política nacional possam ser colocados à prova, acrescentando-se o que diferencia, neste momento, substancialmente o Governo e o BE e o PCP: a relação com a União Europeia. Mas também ao Partido Socialista e ao Governo serão exigidas estratégias adicionais de liderança e de governação para que sejam evitadas contradições públicas, como, por exemplo, as de ontem onde o ministro Mário Centeno afirmava a sua prioridade no que respeita à venda do Novo Banco, enquanto João Galamba defendia a sua nacionalização (fonte: jornal ECO).

A afirmação de Catarina Martins do Bloco de Esquerda que serviu de título ao texto de hoje também se estende aos portugueses. A ilusão da reposição salarial, seja no privado, seja no público, e o aumento de algumas pensões, esbarra e perde qualquer efeito com a tributação indirecta (por exemplo, IVA) e com o aumento do custo de vida através do aumento dos preços de bens e serviços. Por exemplo, os transportes estão mais caros, a electricidade sobe cerca de 1,2% (abrangendo quase 1,5 milhões de clientes), o gás natural deverá subir no segundo semestre de 2017, as telecomunicações também serão revistos em alta, aumento de impostos indirectos que se reflectirão no aumento do preço de determinados bens de consumo, aumentam também as portagens e encarece o imposto automóvel de circulação, sem esquecermos ainda a actualização anual das rendas de casa. No âmbito fiscal, a sobretaxa do irs irá terminar mas só no final de ano se sentirá o efeito por força do faseamento da sua abolição, sem alteração dos escalões, apesar de tantos anúncios. Já para não falar no adiamento da bandeira da esquerda (principalmente o BE) sobre alterações aos recibos verdes ou no aumento do valor do subsídio de alimentação que será taxado em sede de irs (não sendo líquido o valor de 4,27 em janeiro e 4,77 euros em julho).

Portanto, razão tem Catarina Martins… “2017 será o ano de todos os perigos” e de todas as exigências e dificuldades.

Luzidio 2017...

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publicado na edição de hoje, 8 de janeiro, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos
Luzidio 2017…

Está cumprida a primeira semana do novo ano e estes primeiros oito dias comportaram em si alguns factos e factores que são o espelho do que se poderá esperar deste novo 2017. E em tão poucos dias já muito aconteceu.

A nível externo, este novo ano vai estar carregado de momentos significativamente decisivos e com fortes impactos na geopolítica europeia e internacional. Será o ponto zero do mandato de Donald Trump à frente dos destinos norte-americanos, com toda a incerteza e inquietação que tal realidade contém, seja a nível interno, seja na relação da Casa Branca com os diferentes e exigentes contextos internacionais, como, por exemplo, o mundo árabe e o médio oriente (Israel é já disso um exemplo), com a Rússia e o preocupante “braço-dado” com Putin, com a China e com a Europa, aos quais podemos acrescentar a relação dos Estados Unidos com a América Latina. Pelo meio ficará a relação presumivelmente tensa e conflituosa com a NATO e a ONU. Mas se a governação da maior potência internacional deixa o mundo em suspense e preocupado, também a União Europeia não fugirá a esta expectativa de um ano de 2017 marcante. Primeiro pelo processo de gestão política e jurídico-constitucional do Brexit e dos seus impactos definitivos em Inglaterra e na União Europeia, sendo que o mesmo está longe de estar concluído e de ser definitivo. Segundo, a Europa terá importantes momentos eleitorais que podem marcar o destino de vários países e da própria União Europeia, tal a sua fragilidade e fragmentação, sendo uma incógnita os impactos que terão nos respectivos resultados a questão humanitária dos refugiados, as últimas eleições norte-americanas ou o processo Brexit. São exemplo do “inferno eleitoral” europeu as presidenciais e legislativas na Alemanha (Merkel vai de novo a votos), as presidenciais em França, as legislativas na Holanda e na Bulgária, e, não menosprezando, a fragilidade política em Itália. Terceiro, é notoriamente claro que todos estes processos eleitorais, com mais ou menos peso, terão impactos muito significativos no actual “estado de alma” europeu.

A nível interno, tal como afirmou há dias Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda, quando referiu que “2017 será o ano de todos os perigos”, este novo ano será, de facto, extremamente relevante essencialmente por duas razões (deixando uma terceira para a próxima quarta-feira). A primeira porque será ano de eleições, ao caso, as autárquicas que, por mais que haja quem tente minimizar os impactos políticos nacionais dos resultados que daí possam surgir, terá danos colaterais importantes no futuro político de alguns partidos e na conjuntura política futura do país. Para o PSD é um momento de extrema importância para a actual liderança de Pedro Passos Coelho e para auferir do estado de força do seu eleitorado eleitoral. Mas não será nada fácil. A forma como o PSD tem gerido o seu estatuto de oposição política não tem tido quaisquer resultados relevantes na opinião pública e no confronto com o Governo. Por outro lado, a antecipação da candidatura de Assunção Cristas em Lisboa e a incapacidade de gerir o “obstáculo” Rui Moreira no Porto deixam antever extremas dificuldades nas duas principais autarquias do país. Além disso, ou como se isso não fosse já por si só suficiente, surgirão (tal como em 2013 bastando recordar as inúmeras candidaturas independentes) focos locais de instabilidade e polémica que levarão a inevitáveis conflitos internos, como é disso exemplo a triste forma como em Aveiro está a ser gerida a recandidatura de Ribau Esteves ou o inédito apoio do PSD ao “expulso” António Capucho na sua corrida eleitoral à Assembleia Municipal de Sintra e o apoio à recandidatura de Marco Almeida à Câmara de Sintra depois de toda a polémica de 2013.

Para o PS este será um importante momento para avaliar o estado de governação do país e a forma como os portugueses têm olhado para este primeiro ano de mandato no Governo. Será mais que natural a transposição para o âmbito local de toda a actual conjuntura política nacional.

Por fim, as eleições autárquicas de 2017 têm ainda uma elevada importância para o Partido Comunista Português que sempre se afirmou, em determinadas zonas do país, como um partido com características e adn autárquico significativo. Tal como em relação ao Bloco de Esquerda, que desde a sua existência, apenas geriu uma autarquia (com resultados políticos desastrosos) os dois partidos da esquerda portuguesa têm nestas eleições autárquicas um especial e importante momento para avaliar e analisar até que ponto o fenómeno “Geringonça” tem contribuído para a valorização do seu papel nas políticas nacionais ou se, pelo contrário, acabam por ser minimizados pelo crescimento público do Partido Socialista e do Governo.

A ver vamos o que nos reserva, neste âmbito, 2017.

Morreu o Presidente "Fixe"

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O slogan foi o de uma campanha eleitoral presidencial (as presidenciais de 1986): "Soares é fixe!". Curiosamente, a primeira volta foi realizada em janeiro de 1986 (26 de janeiro), há 31 anos.

Morreu o Presidente Mário Soares.

Não há, na história de Portugal ou em qualquer história de uma outra nação, um único político, governante ou presidente, um único que seja, que não tenha cometido os seus erros, que não tenha despoletado numa ou noutra pessoa alguma animosidade ou indiferença.

O que importa avaliar, independentemente da maior ou menor proximidade político-ideológica, é a importância e o impacto que esse político teve ou não nos destinos do país.

No caso concreto do ex-Primeiro ministro e do ex-Presidente da República, para além de um dos fundadores do Partido Socialista, é inquestionável o papel que Mário Soares teve, a vários níveis, na história democrática de Portugal, sendo inequívoco o estatuto de figura de Estado preponderante no desenvolvimento de Portugal. Basta recordar a algumas vozes críticas da direita, nomeadamente e por exemplo, o papel e a proximidade tidos para com o CDS e para com Freitas do Amaral num período político e social extremamente hostil ao partido (recorde-se o cerco ao Palácio de Cristal). Se houver honestidade na análise histórica e política, o CDS tem um legado de gratidão para com Mário Soares, independentemente da questão partidária, da política e da ideologia.

Não sou socialista (poderei eventualmente ter alguma afinidade política a um PS diferente do actual pela defesa do princípio da social-democracia) e é óbvio que Mário Soares, quer como Primeiro-ministro, quer como Presidente da República, cometeu erros e nem sempre achei que tenha agido, politicamente e na governação, da forma mais correcta. Embora no processo que levou às várias independências na ex-colónias em África, entendo que seria, face a um conjunto múltiplo de diversidades e de conjunturas políticas, económicas e sociais, muito difícil, se não impossível, fazer, naquela altura, melhor ou diferente.

A verdade da história política portuguesa é clara e transparente: a Mário Soares, Portugal e os portugueses, devem, mais que a liberdade (mas também), a democracia que hoje vivemos e temos, concretamente pelo papel que teve entre o 25 de Abril de 74 e o 25 de Novembro de 75; a Mário Soares, Portugal e os portugueses, devem a adesão à, então, CEE, processo do qual o PSD e Cavaco Silva puderam politicamente aproveitar; a Mário Soares é inquestionável o reconhecimento do seu papel de estadista e de político de excelência.

Isto é que o fica na e para a história contemporânea política e social de Portugal neste período da democracia.

Levantem-se as vozes que quiserem criticar ou acusar Mário Soares... são pormenores, gotas de água, numa vida cheia de vivência política, partidária, governativa e democrática.

No fim, resta inequivocamente o gesto de gratidão, de reconhecimento: Soares foi mesmo fixe.

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(crédito da última foto: Daniel Rocha - jornal Público)

O país do "vale tudo"...

É frequente ouvirmos quem se queixe do direito português e do universo judicial pelo facto de ser relativamente fácil o recurso à difamação e à acusação sem provas (boato) através do anonimato, a título meramente exemplificativo. Sobre o acusado é que recai a prova de inocência e não sobre quem acusa. Isto de forma muito linear e, obviamente, simplicista. Mas é a percepção do comum dos mortais sobre a justiça em Portugal.

Mas podíamos ir ainda mais longe nesta realidade. Face ao que são hoje os mecanismos comunicacionais, a globalização da rede de informação e de socialização virtual, acusar e difamar é um processo demasiado básico e simples no dia-a-dia. Exemplos? Não chegava este espaço, nem tempo.

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É inquestionável que uma das funções e um dos papéis institucionais de um Bastonário de determinada ordem Profissional seja o de olhar e revelar o "estado de alma" do sector profissional correspondente à sua Ordem. Olhar, analisar, criticar, denunciar e, também, promover ou louvar. Até aqui... "a Leste nada de novo".

A questão está para além desse contexto.

O princípio tem que ser o da transparência, da verdade e da clareza, seja das intenções, seja dos factos ou dos anúncios públicos.

Recentemente, a Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, veio afirmar e denunciar publicamente (em "praça pública"e através da comunicação social) que «há doentes sem comida e medicação nos hospitais». A denúncia tinha sido concretizada num programa da SIC, na noite do dia 12 de dezembro, num debate sobre o Serviço Nacional de Saúde. Na SIC a Bastonária dos Enfermeiros afirmou que «faltam pessoas para dar de comer a estes doentes e portanto, infelizmente, chegam-nos relatos de doentes que estão em observação e que não comem há dois dias. Ou há serviços que estão com uma afluência tão grande que não há ninguém para trazer os medicamentos. Isto é próprio de um país de terceiro mundo» (sic... fonte Jornal de Notícias).

As declarações e a denúncia em concreto são naturalmente de um gravidade significativa, têm impacto na sociedade e carecem de responsabilização política e na gestão do serviço de saúde.

Só que a atitude da Bastonária da Ordem dos Enfermeiros é, no mínimo, criticável e condenável. E já não é novidade...

1. Em vez do alarmismo adjacente a uma afirmação pública desta natureza teria sido mais sensato e, porque não dizê-lo, ético se tal fosse transmitido directamente à tutela: ao ministro da Saúde.

2. Mas tendo, apesar de tudo, a legitimidade e o direito da livre opinião e expressão a Bastonária dos Enfermeiros não podia ter ficado por aqui. Afirmar simplesmente o que referiu, sem concretizar, sem referir factos ou provas, sem dizer, claramente, quando, quem e onde, fica tudo isto sujeito ao arbítrio da opinião pública, à natural e legitima sensação de mera demagogia, difamação ou populismo, e de uma enorme irresponsabilidade cívica. E neste caso concreto razão tem o ministro da Saúde para ter afirmado que as denúncias feitas por Ana Rita Cavaco "foram de uma grande intensidade dramática". Tão somente isso.

Aliás... "intensidade dramática" repetida e reiterada na Comissão Parlamentar de Saúde da Assembleia da República. E se a sua intenção de formular queixa no Ministério Público sobre esses eventuais factos se concretizar só espelha que as afirmações públicas serviram apenas para fazer recair sobre si os holofotes (cada vez mais fáceis) do mediatismo e do populismo.

Mesmo que sejam verdadeiras as denúncias proferidas, Ana Rita Cavaco, Bastonária da Ordem dos Enfermeiros foi eticamente irresponsável e esteve muito mal no seu papel.

A palavra de 2016

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Era mais que expectável a escolha de "Geringonça" para a palavra do ano de 2016, no inquérito promovido pela Porto Editora.

Num total de cerca de 28000 votos, perto de 9800 portugueses (representando cerca de 35% dos votos) escolheu a palavra, que entrou no léxico comum português pela mão de Paulo Portas de de Vasco Pulido Valente, tendo definido e marcado o discurso político nacional durante 2016.

Pessoalmente e espelhando o que foi um sentimento generalizado em relação ao ano de 2016 a palavra que melhor espelha o ano que terminou teria sido a expressão anglo-saxónica "RIP" (Rest in Peace - Descansa em Paz).

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