E + I = Migração
Publicado na edição de hoje, 3 de outubro, do Diário de Aveiro.
Debaixo dos Arcos
E + I = Migração
A Câmara Municipal de Aveiro promoveu, no passado domingo, o Dia Municipal do Imigrante, pelo terceiro ano consecutivo, sublinhando um interessante trabalho que tem sido desenvolvido na área social (sempre complexa e problemática). A iniciativa surgiu em 2010 integrado no programa/projecto “Aveiro + Intercool II” coordenado pela Dra. Emília Carvalho (Centro Social Paroquial da Vera Cruz e Centro Local de Apoio à Integração de Imigrantes – CLAII, com o apoio da autarquia aveirense) e por vontade expressa de um conjunto de associações que se tornariam parceiras. Associações que, na última década, representam um considerável número de cidadãos que escolheram Portugal, e concretamente Aveiro, como segunda “terra” (comunidade de acolhimento), multiplicando culturas tão diversas como as de origem africanas (Angola – recentemente criada a Casa de Angola em Aveiro; Cabo Verde; Guiné-Bissau; São Tomé e Príncipe) ou as que correspondem a países do leste da europa (Rússia; Moldávia ou Ucrânia). Nesta diversidade e multiculturalidade, foram-se entreajudando, superando as óbvias dificuldades de integração (a língua, diferentes culturas, a gastronomia, modos de vida, conceitos, religiosidades, etc.), procurando uma integração plena na comunidade aveirense, sem deixar ou esquecer as suas origens. Aliás, numa perspectiva de integração que corresponda também à partilha cultural e vivencial. Se bem que, apesar de duas das características dos aveirenses ser a liberdade e a hospitalidade, acho que ainda há um caminho considerável a percorrer no que respeita à integração social plena dos imigrantes (e não apenas demagógica), com novos desafios que, garantidamente, se vão colocar nestes tempos de crise agravada que vivemos.
Desde o primeiro momento que “abraço”, de forma espontânea e voluntária, o convite que me é feito para apresentar este Dia Municipal do Imigrante (não sei ajudo mais do que atrapalho, mas pelo menos é com imenso prazer que o tenho feito nestas três edições) sempre muito bem preparado pela equipa da Divisão de Acção Social da Câmara Municipal de Aveiro, personalizado no indiscutível esforço e profissionalismo da Ana Paula Marques e da Sónia Aires, com a responsabilidade política da vereadora Teresa Christo.
Ao cruzar-me com os inúmeros imigrantes que participam, mais ou menos activamente nas actividades e na festa (porque essencialmente é de uma festa que se trata) vou-me apercebendo do que significa, verdadeiramente, deixar tudo para trás e seguir um sonho (muitas vezes próximo do pesadelo), uma esperança, uma nova vida.
E nesta perspectiva, sem querer menosprezar nenhuma das associações parceiras (Mon na Mon, Associação de Apoio ao Imigrante, Parceiros da Amizade, Associação de Estudantes Cabo Verdianos de Aveiro, Associação de Estudantes de S. Tomé e Príncipe, Casa de Angola de Aveiro, Centro Social Paroquial da Vera Cruz), houve duas associações presentes que me fizeram olhar, este ano, para este dia de outra forma. Foram elas a “Escola Profissional de Aveiro” (Centro de Informação Europe Direct) e a associação “Agor@ Aveiro” (não esqueço a Orbis, mas para mim o seu papel ultrapassa toda a fronteira da imigração pela sua relevância na acção social num sentido muito mais alargado). E fizeram-me olhar para esta terceira edição do Dia Municipal do Imigrante precisamente pelo outro “lado da moeda”.
Ao olhar para a realidade de integração comunitária dos imigrantes ali presentes, só me veio ao consciente o espírito emigratório que sempre caracterizou os portugueses, desde longos anos.
O papel formativo (e informativo) do centro “Europe Direct” facilitando o acesso e o conhecimento da realidade da União Europeia e criando/promovendo uma cultura de cidadania europeia, e as acções desenvolvidas pelo “Agor@ Aveiro”, igualmente estruturadas na cidadania activa, numa perspectiva de inclusão comunitária (social e cultural) e de abordagem de realidades intergeracionais, dando a conhecer realidades socio-culturais de vários países (Holanda, Hungria, Croácia, Itália, Sérvia, Turquia, Timor, Polónia, Estónia, Finlândia, entre outros) para além do suporte às actividades TEDx, fizeram-me pensar nos desafios que os portugueses enfrentaram ao “passar fronteiras”, nomeadamente, na década de 60 e 70 (à semelhança do imigrantes que escolheram Aveiro para relançar projectos de vida) e à quantidade de jovens que, face à realidade laboral e económica que vivemos (infelizmente motivados pelos próprios governantes que preferem um país envelhecido a gerar oportunidades) procuram noutras paragens, noutras realidades sociais, noutras culturas, uma integração e oportunidades que, aqui, lhes são negadas.
Segundo dados da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, em 2011, mais de 100 mil portugueses deixaram o país rumo a novas paragens. Obviamente, já não são os mesmos emigrantes de mala e cartão, de passar a fronteira a pé e clandestinamente. Hoje viajam de avião, com portáteis e ipads na bagagem porque já não se escrevem cartas em “sobrescritos” selados. Mas as dificuldades de integração social e cultural estão na mesma presente, mesmo que com outras facetas.
E tal como “cá” (imigração), espera-se que “lá” (emigrantes) haja quem tenha capacidade para acolher e quem tenha coragem para permitir que seja acolhido.