Chegámos ao fim...
Publicado na edição de hoje, 4 de novembro, do Diário de Aveiro.
Entre a Proa e a Ré
Chegámos ao fim…
Desde a nossa adesão à então CEE, decorria o ano de 1986, passando pela entrada, em 1999, no grupo dos países pertencentes à “zona euro”, que é clara a influência política e económica que a União Europeia exerce sobre Portugal, sem que o país tenha qualquer capacidade de contestação ou peso estratégico; apesar de, em algumas circunstâncias (geopolítica e geoestratégica) a nossa posição geográfica poder ter algumas vantagens (ou pelo menos devia ter). O país emaranhava-se nas teias de uma Europa que dificilmente caminhava a um só ritmo, como um todo, sem efectivos sintomas de solidariedade, estruturada na vontade política e económica do triângulo Inglaterra – França e Alemanha, país que, após a II Grande Guerra, depois de beneficiar de todo a apoio internacional (e que rapidamente parece ter, voluntaria e intencionalmente, esquecido), surgiu das “cinzas” e impôs-se como o pilar europeu.
A verdade é que Portugal tem uma dimensão reduzida, uma das mais pequenas populações da Europa, falta de capacidade de produção e baixo desenvolvimento económico. A tudo isto acresce a nossa insignificância política, reduzindo-nos a uma excessiva e quase total dependência externa.
Para sobrevivermos (convém não esquecer a crise do final dos anos 80 e da primeira “invasão” do FMI) vendemos a nossa agricultura e as nossas pescas a troco de uma “eurosubsidiação” que alimentou muitos “cofres”, ergueu muito betão, mas nem por isso sustentou o país.
Por força de uma urgente necessidade de desenvolvimento, a “pressa” em crescer deu origem a erros estratégicos de gestão, quer ao nível do sector público, quer do privado. A esta realidade juntou-se uma conjuntura internacional que fez explodir a economia.
Daí até o país ficar de “tanga” foi um ápice, mesmo que a “festa” tenha durado mais de duas décadas e tenha, inequivocamente, vários responsáveis (ao contrário do que se discursa).
Perante a realidade das contas e da dívida pública, da degradação da economia, da estagnação do investimento, não restou outra alternativa ao país se não o recurso (pela segunda vez após o 25 de Abril) à ajuda europeia e internacional (troika).
Portugal voltava a estar de mãos estendidas para além fronteiras e dependente dos “caprichos” de quem nos empresta dinheiro para não nos afundarmos de vez. Memorando assinado, restava a obrigatoriedade do cumprimento das cláusulas económico-sociais… perdíamos (não sei se apenas temporariamente) a nossa soberania financeira e económica.
Entretanto surgia outro problema e outra realidade. Os sucessivos erros de gestão, os falhanços das políticas e medidas de implementação prática dos compromissos assumidos, o constante agravamento da austeridade (obviamente, inevitável) sem qualquer complementaridade ao nível da estruturação das contas públicas (apenas, ou praticamente, com intervenção sempre ao nível da receita) ou do desenvolvimento da economia, fizeram com que o país tenha ficado sem dinheiro e sem sustentabilidade.
Medida atrás de medida erradas, as perspectivas e cálculos falhados, a incapacidade de cumprir as metas e os compromissos assumidos, provocaram a necessidade de mitigar, repensar e refundar estratégias. O preço a pagar já não é apenas a perda da soberania económico-financeira. Portugal perdeu igualmente a sua soberania política. Perdeu ou “alguém” a entregou.
O recente anúncio da refundação das funções do Estado com a intervenção directa do FMI, sem que o mesmo tenha sido validado no “contrato eleitoral” resultante das eleições de 2011, feito nas costas dos portugueses, dos parceiros sociais, nomeadamente sem qualquer deferência para com o PS (quando veio, já surgiu tarde), sem que se conheça a posição do Presidente da República, é revelador do caminho que foi percorrido e que levou Portugal à rotura total da sua soberania e independência. Já não bastam os sacrifícios exigidos aos cidadãos, às famílias e às empresas. Temos que abdicar e entregar a nossa própria “existência e identidade colectivas”.
A nossa sobrevivência significa, para este Governo, vender a nossa “alma”.
Chegámos ao fim.