O País em “alerta vermelho”
Publicado na edição de hoje, 20 de janeiro, do Diário de Aveiro.
Entre a Proa e a Ré
O País em “alerta vermelho”
Não é apenas pelas assustadoras condições meteorológicas que o país terminou a semana num preocupante estado de alerta vermelho (máximo na escala da protecção civil). É que para além da intensa chuva, do forte vento e do frio, os portugueses, ao longo da semana, foram-se deparando com outros temporais, estes de natureza (e não “da natureza”) política.
1. Os relatórios (in)suspeitos.
O Governo teve, claramente, um grave problema comunicacional com a tentativa falhada de esconder do país (cidadãos, coligação governamental, parlamento e demais instituições) o relatório do FMI (“Rethinking the State – Selected expenditure reform options”… “Repensar o Estado – escolha de opções de contenção de despesa”) que acabou, graças a uma fuga de informação, por se tornar público e oficial. Como se tal facto não fosse, em si mesmo, grave e inqualificável, a semana seria, a este nível, marcada pela frustração governamental em classificar e justificar um documento que se provou e comprovou ser um embuste, uma falácia e um conjunto de pressupostos ideológicos e programáticos da equipa de Pedro Passos Coelho: dados desactualizados e contraditórios, informação muito específica e própria do país (estranha a algumas percepções internacionais), reformas estruturais que contradizem as mais recentes afirmações públicas e documentais do FMI sobre a austeridade. Como se constatou pelos mais diversos artigos, textos, documentos, opiniões, (e não, apenas, nacionais ou da oposição) tal como aqui referi no último “Entre a Proa e a Ré”, o suposto relatório elaborado pelo FMI (na verdade, apenas validado) serve apenas para sustentar uma série de medidas que terão que (ou deverão) ser implementadas pela evidente falha das políticas de austeridade do Governo, agravando ainda mais as condições de vida dos cidadãos, das empresas e do país. O relatório serve para, sob a capa do resgate externo e da obrigação de responder às eventuais imposições das instituições internacionais, tentar desresponsabilizar o Governo e justificar as suas acções politicas, económicas e sociais.
2. A sociedade civil elitizada.
No seguimento do referido no ponto 1, o Governo decidiu promover um ciclo de debates sobre a “refundação” do Estado, integrados na conferência….. Uma iniciativa que, independentemente da visão que se possa ter sobre as funções do Estado, não deixaria de ter o mérito de iniciar as bases para a discussão do tema. E teria o mérito de, afastadas as guerras partidárias, envolver a sociedade civil e perceber qual a percepção que a mesma sociedade teria sobre o que espera serem os contributos sociais do Estado. Pura ilusão… de pública e de envolvimento da sociedade teve muito pouco (ao ponto de condicionar o papel informativo dos órgãos de comunicação social), serviu apenas como “workshop” e listagem de conceitos para os objectivos do Governo, ao ponto do evento ter ficado circunscrito à propaganda governamental da abertura e do encerramento.
3. A sede do “poder”.
O debate quinzenal na Assembleia da República, com o Primeiro-ministro, teve o seu ponto alto na acusação mútua, entre PS e Governo/PSD, de quem terá direito à “cadeira do poder”. Para Passos Coelho o Governo só deixará de governar quando a coligação não se entender (o que até já esteve mais longe), esquecendo-se completamente (mais uma vez) da Constituição e do papel do Presidente da República, já para não falar da total falta de respeito para com a própria vontade dos cidadãos (a verdadeira sociedade civil). Por outro lado, António José Seguro tinha já manifestado a vontade que o país tivesse uma maioria governativa alternativa, dando a notória imagem de que o PS estará preparado para governar. Esta repentina vontade de “assaltar o poder” tem, no entanto, três questões que importa focar: se os portugueses (e mesmo o eleitorado socialista) se revêem na liderança de Seguro e o vê como alternativa a Passos Coelho; esta vontade de provocar eleições antecipadas é paradoxal com as críticas formuladas em 2011 aquando da queda do governo socialista de José Sócrates; e, não menos importante, há uma evidente pressa de António José Seguro em marcar esta posição e em acelerar um eventual processo eleitoral condicionando a sua oposição interna, nomeadamente em relação a António Costa.
4. Cerco a Aveiro.
Há muito que a sociedade aveirense contesta a colocação de dois pórticos no troço da A25 (o do Estádio e o de Angeja) e outro na A17 (nó Oliveirinha/Moita). Esta realidade faz recordar os livros de história quando, ao retratarem as conquistas e as invasões, descreviam os cercos às cidades e aos castelos como forma de ganharem vantagem através da limitação dos acessos e condicionarem os fluxos de abastecimento. Desta forma asfixiavam as cidades e os castelos impondo as suas forças.
É esta a realidade que Aveiro vive e que volta a ser preocupação com o anúncio do Governo em reactivar o pórtico que limita o acesso entre Aveiro e Ílhavo (Gafanha da Nazaré, Barra e Costa Nova). Para além de todos os condicionalismos em relação à mobilidade e acessibilidade dos cidadãos de e para Aveiro, com alternativa reduzida (imagine-se no Verão o que significa a utilização da antiga estrada entre a ponte da Friopesca e o nós do Marnoto, à entrada da cidade de Aveiro) há ainda um outro pormenor que importa relevar. Com a reactivação deste pórtico fica completamente condicionada a perspectiva dos aveirenses, e em falta as diversas promessas políticas, em ver anulados os outros pórticos na zona que delimita Aveiro, nomeadamente o tão famigerado pórtico do Estádio. Ou seja, Aveiro não só não consegue ver desaparecer três pórticos na cintura à cidade como ganha mais um. A bem da crise.