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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Regeneração histórico-cultural

Publicado na edição de hoje, 11 de agosto, do Diário de Aveiro.

Cagaréus e Ceboleiros

Regeneração histórico-cultural

Há duas semanas a menção neste espaço recaiu sobre o Sal (Salgado Aveirense) como referência do património social e cultural da história de Aveiro. Aí foi focado um dos aspectos mais importantes para a vitalidade e sustentabilidade de uma comunidade: a sua regeneração urbana como factor de preservação da história e cultura dessa mesma comunidade. Embora o conceito de regeneração/reabilitação no campo do planeamento urbano seja bastante abrangente, não recaindo exclusivamente sobre o edificado, o facto é que uma das importantes vertentes da história do Salgado Aveirense reside no seu património edificado – os palheiros do sal, para além, obviamente, das marinhas.

Apesar do Salgado Aveirense, que marcou, juntamente com a cerâmica, o património histórico de Aveiro, ter vertentes ambientais, económicas, sociais e culturais que definiram um passado da cidade e da região e que marcaria o seu futuro, o seu edificado (os Palheiros do Sal), concretamente o que ainda resta na zona envolvente ao Canal de S. Roque é parte importante e relevante desse património e dessa história que construíram Aveiro. A temática tem sido, recentemente, alvo de “atenção” por parte de vários aveirenses após o conhecimento público da eventual perda dos Palheiros do Sal do estatuto de Imóvel de Interesse Público. Curiosamente, para não usar outra adjectivação, após o despacho de homologação do Ministério da Cultura, em 2003, que classificou os “Palheiros do Sal” como Imóveis de Interesse Público que os mesmos, por falta de publicação em Diário da República, mantêm a inqualificável situação de “em vias de classificação”.

É indiscutível que o desaparecimento ou mesmo a transformação dos palheiros significa a perda de uma parte considerável da história aveirense e logo quando é notícia o aumento do número de marinhas (de sete para oito) para a safra deste ano (ver Diário de Aveiro de 26 de junho de 2013). É certo que é apenas mais uma (por enquanto) mas contribui para que uma parte significativa e importante da história e identidade aveirense não desapareça. Para isso já bastam os barreiros, a cerâmica, o azulejo, os moliceiros sem proa e a “raiar o veneziano”, as muralhas, o aqueduto, as várias festas (Sra. das Febres, por exemplo) e feiras (a da cebola). O facto é que a tradição e a identidade se mantém com o “dia da botadela” nas marinhas da ‘Santiaga da Fonte’, ‘Passã’, ‘Troncalhada’, ‘Grã Caravela’, ‘Senitra’, ‘Peijota’, ‘Puxadoiros’ e ‘18 Carbonetes’ (pelos menos de forma conhecida).

Com a promoção e criação em inúmeras localidades e recônditos do país de diferenciados centros de interpretação e educação, tendo a autarquia adquirido e preservado uma das poucas marinhas em safra como ecomuseu (Marinha da Troncalhada), parece ser indiscutível que é desejável que uma parte da história do salgado aveirense seja também preservada: os palheiros. Nem que seja como centro interpretativo ou “museu do sal”, incluindo parte comercial como, por exemplo, da flor do sal, artefactos, trajes ou até moliceiros. Não apenas como mera transformação urbanística ou arquitectónica (não tem qualquer significado ou sentido passar por um bar ou restaurante na zona do Canal de S. Roque e dizer” aqui foi um palheiro de sal”) mas como preservação da cultura e história aveirense.

É um facto que a reabilitação do edificado, concretamente em edifícios degradados e devolutos, tem falhas legais enormes que desresponsabilizam proprietários (sejam privados ou públicos) e as próprias comunidades. E neste caso a especulação imobiliária falou mais alto que a história e a cultura. Ao ponto da autarquia não conseguir reaproveitar o Palheiro do Sal do qual é proprietária. E, neste caso, deveria ser exemplo até para os proprietários privados. Porque o que está mesmo em causa não é o conjunto de “Palheiros” que se situam na zona sudoeste do Canal, até porque estes foram transformados e perderam a sua identidade. O que está mesmo em causa é o conjunto de “Palheiros” na zona nordeste e que, apesar do estado de degradação, ainda representam a história do Salgado de Aveiro.

Com o aproximar de um novo quadro de apoios comunitários, com tantas parcerias público-privadas e memorandos de entendimento, com financiamentos adequados, não será difícil encontrar e captar verbas necessárias para a regeneração e preservação histórico-cultural dos “verdadeiros” Palheiros do Sal e criar um centro de interpretação ou museu interligado com a Marinha da Troncalhada, o Sal e a Ria de Aveiro, conservando a identidade da sua história e das suas gentes.

Uma boa oportunidade para, em ano eleitoral e face aos compromissos que assumirão com os cidadãos, os candidatos à gestão da autarquia aveirense olharem para a importância de se preservar a identidade da comunidade como factor de desenvolvimento e de progresso. Tal como sugere a Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Protecção do Património ao elaborar uma carta de recomendação sobre a reabilitação urbana e a protecção do património dirigida a todas as candidaturas das próximas eleições autárquicas. No “Enquadramento Geral” dos objectivos da carta de recomendação, entre outros, podemos destacar: "a reabilitação urbana é um vector fundamental do desenvolvimento urbano sustentável, inteligente e inclusivo (em sintonia com o postulado na Declaração de Toledo de 2010) e que por isso tem que ser assumida como uma estratégia urbana integrada. Uma estratégia que se legitima por argumentos de natureza diversa: (…); de natureza social (identidade local; qualidade do ambiente urbano e de condições de vida; novas centralidades; coesão e inclusão social); (…); de natureza histórico-cultural (a cidade, nas suas múltiplas dimensões - patrimonial, morfológica, funcional, social, económica, imaterial – como bem colectivo que importa preservar e que contribui para a atractividade das cidades); (…)."

Como aveirense “Cagaréu e Ceboleiro”.

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