A importância da liberdade para a democracia
(créditos da foto: ricardo stuckert, in viomundo)
Já há algum tempo que a probabilidade ganhava contornos reais e concretizáveis... após 20 meses de cativeiro, Lula da Silva, ex-presidente do Brasil, foi, ontem, libertado após o Supremo Tribunal Federal brasileiro (STF) ter decidido anular a decisão de prisão, em abril de 2018, do Tribunal de segunda instância.
Neste processo, há 3 ou 4 pressupostos que importa referir.
1. Não tenho qualquer afinidade ideológica com o Partido dos Trabalhadores (Brasil), fundado, em 1980, precisamente por Luiz Inácio da Silva - "Lula da Silva".
2. Por falta de informação completa e aprofundamento dos factos, não tenho uma opinião formada e consolidada sobre o processo "Lava Jato" que levou à prisão do ex-Chefe de Estado brasileiro. Tal como em relação ao processo "Vaza Jato".
Entendo que a Justiça (o poder judicial), seja em que parte do mundo for, deve ter uma forte e total independência em relação ao poder político e à componente ideológica. Nem um processo, nem outro, deveria estar politizado e partidarizado. Sempre defendi o direito à "presunção de inocência" até que um processo transite em julgado e seja apurada toda a verdade.
3. Será pura demagogia e mero populismo, e uma triste presunção altaneira e arrogante, achar-se que a corrupção tem o seu expoente máximo nas regiões sul-americanas ou africanas. Basta olharmos para o nosso umbigo, para a nossa realidade, para os "casos de justiça" nacionais, para percebermos e reconhecermos que Portugal não é exemplo "dos bons costumes da ética política e do serviço público". Seja na política, na governação (nacional, regional ou local), nas empresas, na economia, nas famílias e em cada um dos cidadãos. Basta, por exemplo, ver como, cada um de nós, de forma individual e particular, encaramos o cumprimento das obrigações fiscais (mesmo no simples facto de solicitarmos a mera factura sobre o consumo).
4. Mas infelizmente, perante toda a complexidade conhecida destes dois processos (aos quais se juntarão, inevitavelmente, os que atropelam os mais elementares direitos universais - como o caso "Marielle Franco"), dos seus impactos políticos, esta realidade brasileira mistura, no mesmo saco, a justiça com o poder político, a política e a ideologia. O que, infelizmente, dá sempre muito mau resultado; veja-se o caso actual da Catalunha e a reação à condenação, pelo Tribunal Supremo de Espanha, à condição de 'presos políticos' dos independentistas catalães (Oriol Junqueras, Jordi Turull, Raül Romeva, Dolors Bassa, Joaquim Forn, Josep Rull, Meritxell Borrás, Carles Mundó, Santiago Vila, Carme Forcadell, Jordi Sànchez e Jordi Cuixart).
Há uma questão incontornável na libertação de Lula da Silva (que não significa a sua absolvição): a devolução do sentido pleno da sua liberdade (mesmo que o processo continue o seu percurso judicial) tem impacto na democracia e justiça brasileiras. Algo que deveria ser mais abrangente do que a mera retórica ideológica da esquerda portuguesa (BE e PCP).
Independentemente de se gostar ou não de Lula da Silva, independentemente da maior ou menor proximidade ideológica com o PT, a libertação do ex-Presidente do Brasil é uma manifesta excelente notícia face ao preocupante rumo democrático do país. Mesmo que ainda esteja em suspenso o desfecho final do processo, Lula da Silva em liberdade será sempre um factor de estabilidade da democracia (por óbvia oposição a Bolsonaro), para além da sempre desejada pluralidade para o equilíbrio da qualquer sociedade.