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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

A propósito do racismo, entre outros

ser intolerante com a tolerância. Um texto contra o racismo e por um jornalismo com identidade.

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Desde o final da semana passa e durante todos estes primeiros dias de junho, a morte do afro-americano George Floyd relegou para segundo plano a "cansável COVID-19".

A agenda pública trouxe, infelizmente pelos piores motivos, a questão do racismo, alargado à xenofobia, à homofobia, à igualdade de género, aos migrantes e refugiados.
Das várias leituras sobre a questão, há três contextos que me mereceram particular atenção: a existência (sempre houve) de racismo e xenofobia em Portugal, não apenas no mundo; o conceito de tolerância; e um jornalismo com rosto, alma e identidade.

No caso de Portugal, já aqui transmiti essa ideia, pelo menos nestes exemplos (aqui, aqui e aqui), sendo que haverá muitos mais e diferenciados: a negação de uma realidade é meio caminho andado para que um determinado problema persista "adormecido", até que algo aconteça e faça despoletar essa realidade.
E isto leva-me à segunda abordagem - A TOLERÂNCIA - depois de ter lido um texto publicado no blogue "Sardinhas em Lata", no dia 29 de maio, sob o título "Morte à Tolerância", e que, em grande parte, subscrevo. Tolerar é um conceito que, infelizmente, torna os nossos comportamentos adormecidos, esconde a verdadeira realidade e tende a ser parte do problema e não da solução.
Ser tolerante faz-me lembrar a questão da caridadezinha: dá-se uma moedinha ou uma esmolinha, lava-se a consciência e desculpa-se a (ir)responsabilidade. E tudo fica na mesma... quem precisa de ajuda mantém-se à procura de apoio e de uma soluação.
Na tolerância é o mesmo... toleramos a côr diferente, as outras crenças (ou quase), a opção sexual de cada um ou (excluindo o abominável André Ventura) até mesmo as etnias e nacionalidades/raças. Mas fazêmo-lo com o sentimento de superioridade, de "façamos lá o jeitinho que eles são 'pobrezinhos e coitadinhos' mas bons rapazes" e serve para mantermos o nosso status social. A tolerância ofusca e obscurece um valor maior e inquestionável dos direitos fundamentais de qualquer ser humano: a igualdade, a forma como olhamos para o semelhante da mesma forma como nos olhamos ao espelho, independentemente da raça, etnia, sexo, crença e nacionalidade.
Enquanto continuarmos por cá, em África, nos Estados Unidos, na Ásia, no Médio Oriente, na Europa, a tolerar quem é afro, asiático, cigano, caucasiano ou negro, migrante ou refugiado, apenas porque somos incapazes de fazer prevalecer a "nossa" supremacia (maioria), nunca irá ser possível encarar a diferença com a mesma igualdade de direitos, liberdades e garantias, nem nunca será possível saber o valor da IGUALDADE. Ficará sempre pela metade a verdade absoluta "ANY Life Matter"... e toda e qualquer vida CONTA.
Tal como dizia Churchill «a democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor». E nada melhor para fragilizar uma democracia do que minar e destruir um Estado de Direito através da "comezinha tolerância" sem responsabilidade, sem igualdade, sem justiça e sem liberdade.

Seria longa a lista de exemplos de exclusão social, racismo, xenofobia, etc. Também não seria, infelizmente, a primeira vez que figuras públicas ou rostos mediáticos sofrem agressões à sua dignidade. Não sendo mais que qualquer outro cidadão violentado na sua condição humana, é natural que uma personalidade publica e socialmente reconhecida sirva como referência mediática e como reflexo de uma realidade que alguns pretendem esconder, por cobardia, por hipocrisia, por medo, por populismo ou, pior ainda, por interesse e convicção.
Não é a primeira vez, e espero que não seja a última, que um jornalista, pela sua exposição pública e pela sua responsabilidade profissionalmente social, é referência e exemplo para a sociedade. Os acontecimentos desta semana trouxeram a público o nome da jornalista da TVI, Conceição Queiroz. Com admiração, respeito e amizade: ENORME!
Desde os bancos da licenciatura que sempre contestei a "escola determinista" que entende que o jornalismo tem que ser isento para poder ser rigoroso; que o jornalista não emite (não tem ou exprime) opiniões, apesar da sua função socializante; que o jornalista não é "notícia", não tem emoções ou sentimentos, como se não fosse, como qualquer outra pessoa, um ser humano (com erros, virtudes e convicções).
Não sendo caso único (não vou listar porque iria, injustamente, esquecer alguém) a Conceição Queiroz, pela sua experiência de vida e percurso profissional, é um espelho da forma hipócrita como a sociedade "tolera" o outro e branqueia as diversas formas de atentar contra os mais elementares direitos fundamentais. Infelizmente, terá, na sua vida pessoal e na profissional, mais exemplos do que aqueles que vieram a público nesta semana. Mesmo que estes sejam mais que suficientes para revelar um Portugal "medieval".
Foi vítima de racismo ainda enquanto estudante do ensino secundário, conforme deu nota no programa "5 para a meia noite" da RTP1.
Vítima de tentativa de assalto, em Lisboa, no início de fevereiro deste ano, não quis deixar de alertar para a criminalidade que existe, principalmente, na zona da capital. Pior que a situação que viveu perante um grupo de 10 jovens, foram os abjectos comentários que recebeu nas publicações (nas redes sociais ou na imprensa online) que tornaram público os factos.
Por tudo isto (e acredito que muito mais) a jornalista Conceição Queiroz não resistiu à natural e compreensível emoção ao noticiar a morte de George Floyd. É tão fácil, em fracções de segundos, trazer à nossa memória tantos e tantos factos que marcam a nossa existência.

Para aqueles que acham (e foram alguns a achar) que isto não passou de uma encenação mediática, os tais que "toleram" e que lavam a consciência à custa da "caridadezinha" de pacotes de arroz ou massa, fica o exemplo do ativismo e do exercício de cidadania da jornalista que marcou presença numa das várias manifestações públicas contra o racismo. Da emoção veio também a ação (em vez da praia e ou da comodidade do sofá).

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Da emoção, da ação, da experiência de vida... fica, acima de tudo, a pessoa e as suas convicções.

 
 
 
 
 
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