Caiu a máscara... em "off" ou em "on"
«A Política sem risco é uma chatice e sem ética uma vergonha» - Francisco Sá Carneiro
"Preâmbulo"...
Uma declaração off the record pressupõe uma aceitação de não divulgação de informação. Algo que não será tão linear e tão absoluto.
Primeiro porque, para quem tem décadas de experiência política, declarações off the record são, muitas vezes, usadas para pressionar e condicionar.
Segundo porque, mesmo parecendo contraditório (e não é), face ao teor das declarações e à sua importância ou relevância política podem (e devem) ser tornadas públicas.
Apesar deste contexto, cabe aos jornalistas e aos órgãos e comunicação social a capacidade de evitar, ao máximo, revelações desta natureza, por uma questão de confiança da fonte.
Errou o Expresso?! Face ao contexto que se vive (COVID-19 e a comunidade médica), à fonte de informação (Primeiro-ministro) e ao teor das declarações, não me parece. Antes pelo contrário.
António Costa e o Governo lidam muito mal com realidades complexas e complicadas, com contextos de gestão difícil (recordemos os incêndios de 2017 ou a crise de 2011, só como exemplos), com o assumir de responsabilidades (a culpa é sempre dos outros) e, pior ainda, com a crítica e com a oposição (seja a política, da sociedade ou a própria realidade dos factos). Recordemos, também como exemplo, a necessidade do Governo em terminar com as reuniões com o Infarmed só porque os resultados desses encontros não convinham à política e aos interesses do Governo na mitigação da COVID-19.
O que as deploráveis afirmações do Primeiro-ministro revelam é que António Costa e o Governo têm esta faceta infeliz e condenável de terem duas caras: no mediatismo do palco público reina a retórica e a demagogia... na sombra reina a acusação fácil, o despir as responsabilidades que não se assumem e que deviam ser politicamente encaradas.
Não é, no mínimo, aceitável que um Primeiro-ministro, tenha um comportamento numa entrevista, mesmo em off the record, como se tem numa mesa de um café, numa qualquer esplanada ou tasca deste país. E já não é a primeira vez que este Governo tem este tipo de atitudes políticas. Já na anterior legislatura, o então Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva foi brindado com o comentário do Ministro de Estado e da Defesa Nacional, e actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva (o ministro dos 'bitaites') sobre as negociações em sede de Concertação Social: "parecia uma feira de gado".
Seja em relação a que contexto for, em relação a quem quer que seja, o Primeiro-ministro deve dar-se ao respeito, permanentemente.
Agravada toda esta situação pelos destinatários das declarações.
Quando todo o país (e o mundo) reconhece na classe dos profissionais da saúde (médicos, enfermeiros, auxiliares, bombeiros... etc.) um trabalho e desempenho profissional heróico e inquestionável no combate à pandemia e nos cuidados necessários para salvar vidas e curar enfermidades, é indesculpável que alguém apelide os médicos de cobardes.
Aos mesmos, o Primeiro-ministro deu como prémio (mais que questionado e criticado) uma final da Liga dos Campeões que ainda hoje está para se perceber o impacto real da realização em Portugal.
Aos mesmos, durante anos foi apontado o dedo quando promoviam greves para defesa do SNS e da valorização profissional.
Aos mesmos, António Costa quer agora, porque se sentiu criticado e ameaçado, amordaçar a sua Ordem Profissional, por é incómoda, porque é presente e activa e age perante as realidades.
E já agora... aproveitando o contexto.
É recorrente (demasiadas vezes) o actual Governo Socialista ser mais reactivo do que pró-activo. Só perante os factos, as críticas, a triste realidade é que o Governo actua, faz promessas, apresenta medidas e políticas (mesmo que não as realize na prática).
A situação que se vive em muitos lares deste país já não é nova, infelizmente com impactos negativos na imagem de muitos dos que se dedicam, de corpo e alma, aos mais idosos e vulneráveis, aos que exercem uma verdadeira "acção social" e solidariedade constante, substituindo, quase em tudo, as responsabilidades do Estado Social. Felizmente... são muitos, são a maioria.
E foram os mesmo que, em pleno despoletar da pandemia em Portugal, nos primeiros dias do inferno de março e abril, sentiram-se sozinhos, amparados pelas Autarquias, pelos cidadãos, pelas empresas locais e, pasme-se.... pelos profissionais de saúde, que arriscaram o seu bem-estar, das suas famílias e da sua própria profissão.
Cobardes, off the record ou em "on", são os que politicamente sacodem as suas responsabilidades ou, pura e simplesmente, se fazem de vítimas mediáticas (de uma situação criada pelos próprios) acusando os outros ou a realidade.
(créditos da foto: SAPO)