Cidadania… mais do que uma mera disciplina
(origem da foto: vídeo do encerramento do 42.º congresso do PSD, in RTP)
Face à realidade polvorosa, importa mais a serenidade pública do que atiçar a conflitualidade (como alguns - os do costume - que deveriam ter responsabilidades públicas acrescidas e não se contêm na boçalidade e no populismo).
Mas também sobre cidadania, poder, direitos e liberdades, regressemos ao encerramento do Congresso do PSD, que decorreu em Braga, há cerca de uma semana.
O anúncio de Pedro Nuno Santos do sentido de voto do PS na apreciação e votação do Orçamento do Estado para 2025 (analisada aqui na crónica anterior) acabou por esvaziar politicamente o Congresso e retirar algum expectável confronto retórico por parte do partido do Governo.
A reunião máxima nacional acabou por se apresentar como mero cumprimento formal de calendário, sem grandes impactos externos ou internos. Um mero encontro de militantes, um desfile de uma ou outra elite partidária, de um ou outro “veterano de guerra”, alguns recados tímidos para a cúpula nacional (como as autárquicas de 2025), a festa e o sentido de pertença ideológica, como em muitas outras circunstâncias, na maioria dos partidos, entre pontos altos da vida política nacional.
Na falta de substância política, desgastado (e despejado) que estava o discurso sobre o OE, Luís Montenegro prevendo que este Congresso - o primeiro da presente era governativa - não iria, por si só, deixar marca na agenda mediática, resolve tirar um “coelho da cartola” no encerramento e apresentar 7 medidas governativas.
E quais são? Num país com problemas a nível dos cuidados de saúde, de insatisfação de vários setores profissionais, dificuldades de respostas estruturais na educação, necessidade de impulsionar a economia e manter a boa gestão herdada das contas públicas… o “soundbite” do Governo centra-se em mais policiamento na rua e na videovigilância (segurança); em 2 centros de acolhimento temporário (imigração); na reabilitação urbana na Área Metropolitana de Lisboa (coesão territorial, mas o resto do país fica a olhar); a saúde e o ambiente, nem merecem comentário. Ressalva-se, e bem, a preocupação com a questão da violência doméstica, nomeadamente contras as mulheres, mas lamente-se a ausência de referência às crianças e aos idosos. E por fim, a cereja no topo do bolo: “revisão dos programas de todas as disciplinas, especialmente a de Cidadania”. Aplaudido e aclamado pelo Congresso.
Não especificando, nem clarificando, o que é que há de errado com as aulas de Cidadania nas escolas, sendo que as liberdades e garantias, a igualdade entre mulheres e homens (não há ideologia de género, isso não existe – os direitos fundamentais não são uma questão cultural ou ideológica… são direitos), a educação da sexualidade e o respeito pelas legítimas e livres opções individuais, as várias conceções de família, o respeito pela diferença, o sentido do acolhimento e a inclusão, a solidariedade, o combate ao racismo, à xenofobia e à violência doméstica, a liberdade religiosa e o laicismo, a importância da defesa da democracia e da vivência política, entre tantas outras questões, também devem estar no centro do papel e da missão da Escola: ensinar, formar e preparar (dar as ferramentas) os jovens para o futuro. E sim… a Escola também educa enquanto a cidadania, a liberdade e os direitos fundamentais forem pilares da democracia e de um Estado de Direito.
Ideologia, formatação e imposição, era o que espelhava a obrigatoriedade (mais tarde facultativa, é verdade) da disciplina de Religião e Moral. Não as aulas de Cidadania.
Então porquê toda esta espuma? A vingança, também a política, serve-se fria. Tal como no caso da segurança e da imigração, Luís Montenegro agitou bandeiras da extrema-direita para encerrar o Congresso para repescar eleitorado do partido que votou mais à direita nas últimas legislativas, tentando, igualmente, beliscar o orgulho narcisista de André Ventura depois de toda a telenovela sobre “as reuniões secretas e as (alegadas) promessas de poder”.
Mas, de facto, sobre o país e os portugueses… nada.