Da série... não nos tomem por parvos #08
do populismo político ao assobiar para o lado (por conveniência)
Na política portuguesa a (infeliz) tradição ainda é o que era (e cada vez mais): "o que hoje é verdade, amanhã... logo se vê".
Nem vale a pena o trabalho e a perda de tempo com os exemplos. São mais que muitos e constantes.
Não foi, por isso, uma surpresa a continuidade na gestão do dossier TAP e o anúncio de mais 1.600 despedimentos (depois de consumados 1.200). E muito menos surpreendente se tivermos em conta o titular do processo: o ministro Pedro Nuno Santos.
O mesmo que, em pleno período de resgate externo (troika), queria fazer tremer as perninhas ao Banco Central Europeu e ao FMI não pagando o que devíamos...
O mesmo que, durante semanas a fio, rasgou vestes no processo da greve dos motoristas de transporte de matérias perigosas, usou e abusou como quis do sindicalismo como arma negocial, para acabar por ceder no final da batalha com o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas...
O mesmo para quem os transportes públicos são imunes à pandemia da COVID-19...
O mesmo que, goradas as suas expectativas de nacionalização da TAP, injectou 55 milhões de euros para permitir à empresa um empréstimo para recapitalização no valor de 1,2 mil milhões de euros...
O mesmo que, após o recurso ao dinheiro público para assegurar 72,5% das ações da TAP, permitindo o controlo público da empresa, entrega a gestão da transportadora a terceiros (Portugal tem o controlo mas não gere a empresa)...
O mesmo que em junho afirmava que eram evitáveis os despedimentos (não havendo necessidade de perdas de postos de trabalho) e que a reestruturação da TAP se faria com os sindicatos; um mês depois, após o Primeiro-ministro lhe ter passado a "rasteira", viria a reboque de António Costa admitindo que a viabilidade da TAP passaria por despedimentos...
Estas deambulações e desvaneios políticos não são, por isso, surpresa no actual Ministro das Infraestruturas... bem pelo contrário.
Pedro Nuno Santos anunciou, há dois dias, que a TAP continuava o seu processo de reestruturação e que o sucesso do mesmo dependeria de mais 1.600 despedimentos colectivos (até ao final deste ano), mantendo, aliás, o argumento duvidoso e questionável da TAP como uma empresa estratégica para o país.
O que surprende (ou talvez também não) é a indiferença - propositada para não melindrar um dos fortes aliados dentro do PS e do Governo - do Bloco de Esquerda, a disparidade de critérios e a falta de coerência, espelhando, mais uma vez (e lá se vai a surpresa) o obtuso populismo ideológico e a demagogia da cartilha partidária.
Os impactos provocados pela pandemia na economia afectam, principalmente, as pequenas e médias empresas portuguesas, mais frágeis e com menos capacidade de choque financeiro face à crise. São estas que necessitam de maior apoio e de medidas extraordinárias para que possam sobreviver, não são as grandes empresas, os papões do grande capital ou os fantasmas das multinacionais.
Só que o Bloco de Esquerda, mantendo esta estranha falta de personalidade política em querer cogovernar sem assumir responsabilidades, surge, no contexto da crise da pandemia, com a bandeira política da proibição (por decreto) de despedimentos e da penalização das empresas "apoiadas" que despeçam trabalhadores. Em relação a estas empresas, as pequenas e médias que constroiem muito da economia e da riqueza (a pouca que há) do país, o Bloco de Esquerda comporta-se como castrador das suas urgentes e necessárias reestruturações para as suas sobrevivências.
Já em relação à TAP, depois de toda a injecção de capital e apoio do Estado com dinheiros públicos, o Bloco de Esquerda nem uma palavra, nem uma linha, nem uma mera indignação perante mais 2.800 desempregos que o Governo criou.
(créditos da foto: Manuel Botelho, in Expresso)