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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Dia Nacional do Mar: desafios à deriva

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Há um Dia Mundial do Mar (26 de setembro), um Dia Europeu do Mar (21 de maio) ou, ainda, um Dia Mundial dos Oceanos (8 de junho). Faz algum sentido Portugal celebrar o Dia Nacional do Mar (16 de novembro)? Não só faz, como deveria ser feriado nacional. Mais, ainda, como, por exemplo, no caso da mobilidade (e bem), também deveríamos ter a Semana Marítima. Pelo menos teria a virtude de ampliar, por mais dias, a consciencialização política e social (económica, científica e comunitária) para a importância do Mar, vetado à quase irrelevância. Basta recordar que o Mar foi relegado para uma mera Secretaria de Estado.

Não que seja uma condição sine qua non para a sua afirmação, já que a sua óbvia existência mereceria uma excecional relevância. Mas perante uma Europa que virou a leste e desviou, geograficamente, a sua objetividade geopolítica, Portugal, já por si só naturalmente periférico, corre graves riscos de passar a sentir maiores impactos dessa mesma periferia.
O país não pode assobiar para o ar perante esta realidade e continuar a esbanjar a sua maior (e talvez, verdadeiramente, a única) riqueza que sempre possuiu.
O Ministro das Finanças realçou, na semana passada, que a economia nacional não pode continuar dependente de um setor turístico que representa, individualmente, cerca de 20% do PIB. Por mais que o Secretário de Estado do Turismo aspire (irresponsavelmente, por todos os riscos e impactos), a duplicar o valor do lucro do setor para 65 milhões de euros, até 2030.

Portugal tem, na sua história, um vazio inquestionável. Ao contrário da quase totalidade da Europa, passou à margem da Revolução Industrial. Ou, se quisermos, a Revolução Industrial não passou pelo país. Mesmo assim, continuamos a desperdiçar uma clara solução para o nosso desenvolvimento.
Portugal é o 20.º país do mundo e o 5.º da Europa com a maior Zona Económica Exclusiva (plataforma continental e mar), área que se pode fixar perto dos 3,9 milhões de km2 (mais de 40 vezes o continente, sem contar com Olivença) se a pretensão apresentada, em 2009, às Nações Unidas for positiva, ultrapassado o conflito com Espanha em relação à zona das Ilhas Selvagens. Este marco fará com que Portugal suba ao 10.º lugar, na lista mundial, e à 4.ª posição entre os países europeus. O que se afigura completamente incompreensível é que, décadas após décadas, Portugal despreze cerca de 97% do seu território: o Mar.

Aquele que nos trouxe conhecimento e nos deu a conhecer ao mundo, aquele que foi um dos pilares da nossa identidade histórica, tem, hoje, por mais extenso que seja, um peso residual na economia e no desenvolvimento do país. Ao longo de décadas foi retórica política e demagogia eleitoralista. Depois de, na década de 90, termo aniquilado as nossas pescas, ao longo de décadas o Mar foi deixado ao nobre, mas inglório esforço da Academia para o preservar e defender, como é exemplo a recentemente iniciativa promovida pelo CIIMAR (Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto) que apela ao Governo que não permita que a Lei do Restauro da Natureza esqueça (mais uma vez, acrescente-se) o Mar.
Estes 97% da nossa soberania representam um inquestionável potencial económico que serviria para o aumento da sustentabilidade e do desenvolvimento do país, com uma importância acrescida no âmbito da ciência e da investigação, da biodiversidade, da geopolítica e da geoestratégica militar, do turismo, da criação de emprego, da preservação da cultura, história e identidade lusa, do desenvolvimento (e envolvimento) das nossas comunidades costeiras. Não esquecendo a importância ambiental que o mesmo comporta, por natureza, e os desafios prementes das alterações climáticas e da erosão costeira.

E o que o país fez e faz? Menospreza este valor indiscutível, mantém um “cofre cheio”, mas os bolsos vazios, perante uma realidade económica e produtiva demasiado frágil e diminuta.
Não se percebe, de facto, como é que um país empobrece com toda esta riqueza e com todo este recurso natural, não o consegue (ou sabe) explorar, não lhe retira o devido valor com consistentes e sólidas políticas públicas (por mais diversificadas que possam ser).
Mas nem assim o país vê o Mar com olhos de ver, às vezes nem no seu Dia Nacional.

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