Jornalismo: liberdade, dignidade... mas também responsabilidade. #somosdn
No seguimento da decisão tomada por unanimidade no 5.º Congresso dos Jornalistas (18 a 21 de janeiro), o Sindicato dos Jornalistas convoca a Greve Geral para quinta-feira, 14 de março.
Do pré-aviso de greve, de 28 de fevereiro: “A insegurança no emprego, os salários baixos praticados no setor, a falta de condições de trabalho e de segurança, representam um obstáculo grave ao desenvolvimento pleno da profissão de jornalista e constituem um entrave ao próprio direito dos cidadãos de serem informados livremente”.
Por si só, os pressupostos, os fundamentos e as causas apresentadas são mais que suficientes para a manifestação e para o protesto, que já não acontecia, desta forma, desde 1982 (há 42 anos).
A esta realidade juntou-se, nos últimos meses de 2023 e no início de 2024, a crise que os profissionais do então Grupo Global Media sofreram, não só em termos profissionais, como a nível pessoal: JN, DN, TSF, O Jogo, Evasões, Volta ao Mundo e Notícias Magazine. A luta da Global Media transformou-se numa luta de muitos outros profissionais do jornalismo, num toque a rebate noutros títulos e noutros órgãos de comunicação social, tendo sido um dos focos do 5.º Congresso dos Jornalistas. E na solidariedade e preocupação da sociedade (“#Somos JN” – “A democracia é responsabilidade de todos” – “Quando o jornalismo também é (deve ser) notícia”)
Resolvida, pelo menos tudo indica, a viabilização dessa parte/fatia da Global Media, restou o Dinheiro Vivo e o Diário de Notícias, surpreendentemente, diga-se, já que é o título mais antigo em circulação, em Portugal (160 anos, 1864) e declarado Tesouro Nacional em julho de 2022 (“Sem jornalismo não há democracia. Ponto.”).
E a greve geral volta a ter dimensão renovada após o recente comunicado do Grupo Global Media: “Global Media demite direcção do DN. Redacção repudia “despedimento colectivo” (jornal Público).
E voltam, naturalmente, a soar na memória os gritos de alerta de um DN em plena crise: José Júdice, diretor demitido (“Duas ou três coisas e muitos milhões sobre jornais antes de ir ao fundo”); Margarida Davim (“A fome que passamos deixará todos sem voz”); Nuno Ramos Almeida, editor-chefe (“A luta do DN”); Fernanda Câncio (“Jornalistas e Liberdade” – “Gostaria que este jornal não morresse nas minhas mãos” / Valentina Marcelino – “Carta aos donos da Global Media (sejam lá quem forem)” – “Crónica de uma jornalista sem salário”); ou Daniel Deusdado (“Há um problema global nos jornais. Assinamos?”).
A dois dias da greve, a crise dos jornalistas e a crise do jornalismo volta a ganhar, infelizmente, destaque e foco, e a exigir de todos, profissionais do jornalismo e sociedade, uma renovada preocupação e solidariedade.
Mas há, por outro lado, o reverso da medalha que, diga-se, era dispensável porque retira todas as sinergias necessárias para resgatar o jornalismo.
Para além das legítimas e comprovadas causas que sustentam a luta dos jornalistas e do jornalismo, a verdade é que para que o jornalismo seja um pilar relevante na democracia tem, igualmente, de se tornar forte, de não ser um alvo fácil (algumas vezes justificado), de ser rigoroso, transparente, ético. Tem que saber questionar, investigar, noticiar, mas também tem que saber cuidar da verdade e dos factos. Algo que deixou muito a desejar nestas eleições. O jornalismo foi mais megafone de algumas vontades políticas do que propriamente cumpridor da sua missão e função enquanto construtor da realidade e da opinião pública, com rigor e verdade. E de forma paradoxal, já que a noção e os avisos foram vários, a realidade foi contraditória. De repente, depois da comunicação social ter alimentado “o monstro”, foram muitos os que se revoltaram e criticaram pela forma como o jornalismo se deixou ferir nos seus valores e no seu papel socializador.
Mas valeu muito pouco… houve um partido que ganhou um processo eleitoral; houve um partido que perdeu uma maioria absoluta e ficou em segundo lugar (perdeu as eleições. Mas heis que, mesmo perante o que a extrema-direita significa para a democracia, para o sistema político, para a liberdade e para a garantia dos direitos fundamentais… para a própria liberdade de informar; perante tudo o que André Ventura disse da comunicação social e do jornalismo, a primeira grande entrevista após as eleições na CNN foi, imagine-se, ao Chega.
E é isto que o jornalismo e os jornalistas têm também que pensar quando, na quinta-feira, saírem à rua: não há notícias sem jornalistas, não há jornalismo sem jornalistas e não há democracia sem jornalismo. Mas também é verdade que sem leitores, seu ouvintes e sem telespetadores, sem uma sociedade que acredite nos jornalistas, sem uma sociedade que não tenha confiança nos jornalistas, não haverá, também, jornalismo.