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Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Mais de 2.130 km separam Kiev da Faixa de Gaza

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No dia 8 de maio, a Fundação Francisco Manuel dos Santos apresentou um estudo a propósito do Dia da Europa no qual identifica Portugal como um dos países mais europeísta e que mais confia nas instituições europeias (2 em cada 3 portugueses, cerca de 56,3%. Acima da média europeia: 50,7%). O estudo revela ainda que quase 70% dos inquiridos criticam a inação da UE perante Gaza e Kiev, acham que deveria fazer mais quanto à invasão da Ucrânia e à guerra em Gaza. Perante os dados, importa reforçar a relevância do processo eleitoral de 9 de junho e o foco na preservação da coesão europeia e dos valores da democracia e da liberdade.

Na Ucrânia é de liberdade que se revestem os sonhos. A liberdade de escolherem, legitimamente, os destinos das suas vidas, da sua sociedade, da sua democracia e do seu Estado. A liberdade de defenderem o seu território contra a invasão bárbara russa.
Como referi a propósito do segundo ano da Invasão da Ucrânia, falhámos enquanto comunidade internacional e enquanto União Europeia. Criámos expetativas e ilusões aos ucranianos, prometemos sem termos as garantias de conseguir cumprir. Enquanto a NATO não assumir um compromisso no terreno, no respeito pela legitima defesa da soberania da Ucrânia e autodeterminação do povo ucraniano, a Rússia levará de vencido este vil ataque a uma nação livre e à democracia europeia.

É no ponto da autodeterminação que encurtamos os mais de 2.100 quilómetros que separam a Ucrânia da Palestina, porque o contexto assemelha as duas realidades.

O ataque das forças do Hamas em território israelita e a barbárie dos crimes cometidos no dia 7 de outubro de 2023 são inaceitáveis, deploráveis e condenáveis, a todos os níveis. A legitimidade de uma resposta por parte de Israel era expectável e justificável. Uma resposta que se esperava proporcional, cirúrgica e nos limites do Direito Internacional. Mas nada disso aconteceu ao longo destes quase 8 meses de guerra na Faixa de Gaza. O conflito degenerou num extermínio inaceitável de palestinianos, numa crise humanitária sem precedentes, em atentados aos mais elementares direitos humanos fundamentais, numa instabilidade geopolítica regional preocupante. O argumento da eliminação total do Hamas nunca colheu solidez desde o seu início por se saber impossível de concretizar. As dificuldades e a recusa de libertação dos reféns, por parte do Hamas, parece, aparentemente, servir os propósitos de Netanyahu na continuidade do conflito para satisfação da ortodoxia radical judaica.
Criticar a ação de Israel na Faixa de Gaza ou achar legítimo o reconhecimento da Palestina como Estado, como uma solução possível para o conflito (preservando a memória política de Rabin, Arafat e Shimon Peres, há cerca de 30 anos, e a paz quase conquistada em 2006) não significa ser-se antissionista. Significa apenas o apelo e o desejo de Paz e do fim do massacre de um povo.
O conflito Israelo-palestiniano não começou no ataque terrorista de 2023. Resulta de um longo e atribulado percurso que vem, pelo menos, desde a colonização britânica (1920) e da independência de Israel (1948). Ao longo deste caminho, árabes e judeus têm as suas porções de responsabilidade na instabilidade e na insegurança e nos sucessivos fracassos negociais para um acordo final cuja solução parece passar apenas pelo reconhecimento da Palestina enquanto Estado soberano, por parte de Israel e da comunidade internacional, onde se incluem a União Europeia e Portugal. Todo o resto é o extremar de duas posições antagónicas, enviesadas nos seus argumentos e (pre)conceitos, quando o mundo e a realidade em concreto não têm que ser vistos a preto e branco.

No dia 9 de junho também são estes 2.130 km que importa percorrer com uma simples cruz no quadrado certo.

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Publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro (pág. )