Sim ou Não?... antes pelo contrário.
os riscos da democracia
Já dizia Churchill que a democracia é o pior dos modelos de governação, excepto todos os outros.
Nesta, como exemplos, cabem a liberdade, os mais elementares direitos e garantias e a excepcionalidade da conquista cívica do direito ao voto.
Mas nenhum dos pilares e princípios da democracia está isentos de riscos, com maior ou menos gravidade ou complexidade.
Apesar de defensor da liberdade e dos direitos aos mais elementares exercícios de cidadania, mesmo com todo o respeito por todas e todos que, ao longo de séculos, lutaram por o direito ao voto consciente, democrático e, fundamentalmente, livre, tenho algumas reservas quanto à decisão de permitir a quem está em isolamento e confinamento obrigatórios votar no dia 30 de janeiro. Aliás, porquê só no dia 30 de janeiro e não em dois momentos, dia 23 e 30 de janeiro? Ou, porque não, apenas no dia 23 de janeiro?
Mas a dúvida e a dificuldade de tomar um posição sobre a questão não está na(s) data(s). Está mesmo na permissão de "furar" o isolamento e ir votar.
Há uma premissa mais que evidente: não estamos, nem vivemos, num contexto de normalidade, sendo claro o carácter de excepção que as nossas rotinas, as nossas vivências e o nosso dia-a-dia sofrem desde março de 2020. Já quase todos, mais ou menos directamente sentimos os efeitos da pandemia, nomeadamente no que diz respeito à saúde (individual e colectiva) e às restrições que foram sendo impostas e aplicadas.
E, neste caso em particular, torna-se difícil de perceber, de contextualizar e, acima de tudo, de aceitar que, perante cenários com as mesmas medidas e regras, seja, agora, permitido a cidadãos, infectados ou não, em isolamento obrigatório decretado pelas autoridades de saúde (isolamento sujeito a coima e processo judicial em caso de incumprimento) sair das suas casas para votar. Os mesmos cidadãos que estão privados de trabalhar, de ir à escola, de sair à rua, de ir às compras, de estar junto dos seus familiares e das pessoas dos seus círculos sociais. Ou, ainda, ser possível a fruição de espaços públicos e comuns quando há centros hospitalares com as visitas suspensas a doentes internados ou instituições sociais com as vistas condicionadas aos seus utentes.
Depois das anormalidades, surrealismos e afirmações irracionais (e até mesmo irresponsáveis) a que pudemos assistir no debate, ontem, na RTP, com os partidos sem representação Parlamentar, depois do que formos assistindo, ao longo destes quase dois anos, de negacionismos e de comportamentos deploráveis de infracção às regras e normas, não me parece fácil, nem muito justificável, sustentar esta incoerência democrática.