Também falta ética no jogo político rasteiro da extrema-direita

Sobram páginas e páginas (e mesmo assim, serão sempre poucas) com a descrição dos comportamentos deploráveis no Parlamento, ou melhor, na Casa da Democracia (símbolo mais alto do Estado de Direito democrático) da bancada da extrema-direita portuguesa que, independentemente do distanciamento ideológico (que é abissal e não mensurável), deveria ser exemplo da ética e dos valores da política e da democracia.
Como se isso não bastasse, como raramente basta a esse partido no que concerne ao respeito pela democracia e ao respeito pelos direitos e liberdades, a total falta de moral para propalar a defesa de princípios, que na prática não professa e que são meras narrativas populistas, leva à propaganda de estratégicas políticas manifestamente ilusionistas e pífias.
Exemplo disso é a tão badalada e agitada bandeira política da anunciada Moção de Censura ao Governo, numa total banalização do princípio e do mecanismo democrático, usado sem qualquer critério e sem qualquer sustentação.
Não está em causa a governação, a gestão do país, a ausência de um rumo para Portugal, para o desenvolvimento e para o fortalecimento da responsabilidade social que deve caber ao Estado no garante dos direitos jurídicos, políticos e sociais dos cidadãos (portugueses ou não).
O que está em causa, nesta moção que o Chega pretende levar a plenário, nesta sexta-feira, tem apenas como fundamentação dois objetivos de mero jogo político estratégico, mas claramente falhados.
O primeiro, na tentativa de desviar os holofotes que se têm focado nos inúmeros casos de ética, transparência, comportamento e coerência ideológico-partidária que têm vindo a público sobre o partido, deputados, dirigentes e militantes.
Segundo, sem colocar em causa que o Primeiro-ministro deveria ter vindo, na altura devida (logo nos primeiros momentos do surgimento da suspeição que recaiu sobre si), os devidos e merecidos esclarecimentos (e não por terceiros, mesmo que altos responsáveis do PSD ou do Governo), a contra-estratégica de Luís Montenegro em ignorar as pressões da extrema-direita esvaziaram o objetivo político de André Ventura: provocar, com a ameaça da apresentação da moção de censura, uma resposta do Primeiro-ministro com os devidos esclarecimentos, e retirar daí os louros partidários como o único partido que “obrigou” Montenegro a falar e o único partido preocupado com a “moral, transparência e a corrupção” em Portugal.
Não só não conseguiu nenhum objetivo estratégico, felizmente, e com toda a oposição e bancada do PSD a ignorar todo este circo político populista, como viu a proposta da moção de censura completamente chumbada à “nascença”.
Haverá sempre a esperança que todos estes “tiros nos pés”, todo este descobrir da verdadeira natureza do partido, provoque o “arrependimento” dos experimentalismos eleitorais naqueles portugueses que, em março de 2024, resolveram “brincar” à (e com a) democracia.