Taxar ou não taxar... a questão do Turismo
(fonte: Dinheiro Vivo de 13 de janeiro de 2024. não contempla o aumento, em 2024, de novas adesões municipais à cobrança da taxa).
As mais recentes notícias têm espelhado a insatisfação, nalguns casos a revolta, de muitos cidadãos e de várias comunidades em relação ao overturism ou à massificação do turismo, os impactos nas localidades e as medidas de contenção ou de resposta a esse ‘sobreturismo’, como, por exemplo, o aumento ou implementação da badalada taxa turística, tão cobiçosa por autarcas, repudiada pelo setor (hotelaria, operadores turísticos, etc.) e abominada pela entidade “Turismo de Portugal”.
O contexto faz-me recuar até à crónica do passado 5 de agosto, "Welcome. Bienvenue. Willkommen… a 12,7% do PIB", uma reflexão sobre a balança entre a receita e os benefícios para a economia e para as contas públicas e os impactos negativos da massificação do turismo ou do excesso de turistas. E tal como em quase tudo na vida, o excesso acaba por ser sempre prejudicial. Tal como diz a sabedoria popular, “o que é de mais cheira mal”.
Portugal precisa de turistas, facto. Não precisa é de um turismo massificado. Aqui é que reside a dificuldade, quando falha o equilíbrio e os custos superam os benefícios. Neste caso, os benefícios são facilmente mensuráveis: mais receitas, mais economia, mais comércio, mais serviços. Os custos, balançam entre o mensurável e o menos quantificável: pior ambiente urbano, pior salubridade, maior segregação comunitária, desertificação dos centros urbanos e dos bairros, aumento dos preços (nomeadamente na habitação, restauração, comércio ou, ainda, na recolha de resíduos, como veio, recentemente, a Sociedade ponto Verde alertar que a fatura do “lixo turístico” é paga pelos residentes). Aos quais podemos ainda acrescentar a realidade social proveniente da precariedade laboral (muito por força da sazonalidade da atividade), e a centralidade do foco económico se desviar de setores mais sustentáveis e mais consistentes financeiramente.
E é nesta realidade que entronca a Taxa Turística ou, pelo menos, devia entroncar.
Presente, há muitos anos, em vários países da Europa, em 2013, Aveiro foi o primeiro e único município em Portugal a implementar, em janeiro de 2013, a taxa turística, abandonando-a em abril de 2014. O fim da medida não teve a ver, como já ouvido, pela Taxa Turística em si mesma, pelos seus objetivos ou fundamentos/princípios, mas sim pelo risco da aplicação inédita no país, pelo isolamento em relação ao resto dos outros 307 municípios, pela dificuldade da sua aplicabilidade e, ainda, pela ineficácia orçamental (receita gerada), já que o volume (à data) de turistas e a permanência na cidade não era, de todo, justificável. Por exemplo, hoje, a média de estadas, por noite, na Região de Aveiro, não chega a duas noites (1,7 são os valores oficiais).
Não é consistente o argumento de estancar ou reduzir o volume de turismo (porque os dados não o comprovam) ou a incapacidade de devolução de bens e serviços a oferecer aos turistas, para que a Taxa Turística não seja aplicada. Antes pelo contrário.
Desde que justificável quanto à capacidade de a executar e à sua rentabilidade, a aplicação da taxa é uma interessante e importante política pública de governação municipal já que permite arrecadar receita orçamental para que (re)investir nas infraestruturas que suportam a pressão de turismo nas localidades, desde arruamentos, passeios, reabilitação e manutenção de espaços públicos, recolha de resíduos, ou, até, a promoção do comércio tradicional e das marcas territoriais municipais ou regionais. Não se espera que a Taxa Turística reduza o volume de turismo, porque não o faz (para isso há outras medidas), mas, pelo menos, minimiza os impactos negativos da pressão turística. Basta vermos que Lisboa, em 8 anos, desde a sua implementação em 2016 (logo após Aveiro), arrecadou mais de 200 milhões de euros com a respetiva taxa e já perspetiva o seu aumento para o dobro e o alargamento aos navios de cruzeiro.
Aqui é que reside o paradoxo da medida fiscal municipal. É que os cerca de 50 municípios que preveem a sua aplicação em 2025 (mais de metade já a aplica ou irá aplicar em 2024) olham para o turismo apenas com a preocupação económica, do lucro, olham para a Taxa Turística como a “galinha dos ovos de ouro” e menosprezam os efeitos que o excesso traz para as localidades e para os seus munícipes. Muito diferente do que seria esperado em sustentadas políticas públicas de governação local.