Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Debaixo dos Arcos

Espaço de encontro, tertúlia espontânea, diz-que-disse, fofoquice, críticas e louvores... zona nobre de Aveiro, marcada pela história e pelo tempo, onde as pessoas se encontravam e conversavam sobre tudo e nada.

Uma liderança "cata-vento"

como liderar um partido ao sabor do vento.

Luis-Montenegro-PSD-1.jpeg

(fonte da foto: in postal.pt)

O cata-vento orienta a sua posições em função da direção do vento. É, por isso, um objeto/instrumento sem "vontade própria", inconstante na sua posição determinada pelo sabor do vento (conforme sopra, intensidade ou direção do momento).

Não poderíamos encontrar, na política de hoje, melhor metáfora ou paralelismo entre o cata-vento e a liderança do PSD.

Há cerca de duas semanas, perante as mais diversas trapalhadas e polémicas no Governo e empresas/entidades públicas (como a TAP); perante a falta de coragem política em assumir e marcar uma posição clara em relação à Moção de Censura apresentada pelo Iniciativa Liberal; perante a crítica de Marcelo Rebelo de Sousa à impreparação do PSD para ser alternativa governativa (o que foi, aliás, assumido pelo presidente social-democrata - não tinha outra alternativa perante o óbvio), Luís Montenegro afastava qualquer cenário que levasse a eleições antecipadas. Os títulos informativos eram, à data (bem recente, diga-se) bem expressivos e explícitos: «não é tempo de abrir uma crise política» (Visão); «não defendemos a queda do Governo» (Visão); «Montenegro concorda com Marcelo: não há nenhuma razão para que o Governo caia agora» (Expresso); «Marcelo faz bem em não dissolver o Parlamento, diz Montenegro» (Jornal Notícias); «PSD alinhado com Marcelo, aponta para 2024» (Público); «Direção do PSD recusa contribuir para a queda do Governo» (Público)... and so one.
Sabia (e sabe, apesar de tudo) da atual fragilidade eleitoral do PSD, a par com a contestação interna (que nem vem da ala "Rui Rio" ou "rionista" - Expresso (17 janeiro), (19 janeiro), (24 janeiro), (6 janeiro) - Luís Montenegro e "companhia" (como Hugo Soares, principalmente) a provarem do próprio veneno. Assim como é inquestionável que os argumentos que levam à insatisfação dos professores têm uma significativa quota parte de responsabilidade política do PSD, seja do tempo da Troika, seja pelas posições/votações em sede parlamentar (nomeadamente quanto à contagem de tempo de serviço). Nem esta turbulência social serve de argumentação para o PSD.

Volvidas poucas horas, escassos dias... o vento muda de direção, sopra com outra intensidade e o "cata-vento político" Luís Montenegro faz excelso jus à expressão "o que hoje é verdade, amanhã logo se vê/será mentira". Sem que, no entanto, a conjuntura política, económica (aliás, o défice de 2022 ficou abaixo do esperado) e social se tenha alterado (a menos que o Palco Tejo das Jornadas Mundiais da Juventude sirva).

No entanto, conhecido o barómetro da Pitagórica para a TVI/CNN Portugal que aponta, neste momento e no mês de janeiro de 2023 (as eleições são apenas em 2026), para o PSD como o partido mais votado (27,4% a 33,8%, contra os 23,8% a 30,0% do PS), Luís Montenegro vir ao discurso som estas "rajada de vento" e posiciona-se no lado contrário. Agora, tudo muda (mesmo que nada tenha mudado): não só Luís Montenegro se transformou no "salvador da pátria", como o PSD tem todo o perfil para ser alternativa em Portugal (neste preciso momento), como todo e qualquer cenário que promova eleições antecipadas já é "ouro sobre azul" (como bem me lembro o que resultou esta ânsia da sede de poder, do ir, sofregamente, ao pote da governação, no tempo de Passos Coelho... que o "altar papal nos salve!").
Nesta quarta-feira, na abertura da reunião do Conselho Nacional, o discurso de Luís Montenegro era claro como a água: "O tempo de António Costa está a esgotar-se. Se não estiver à altura da sua hora, o país terá mecanismos para atalhar o caminho. O PSD é sempre alternativa e alguém que é líder do PSD está sempre preparado para ser primeiro-ministro".

Só que, de facto, tal como afirmava (a 6 de janeiro), Ribau Esteves, não só o PSD não é alternativa a coisa nenhuma (nem para oposição), como Luís Montenegro resolveu problema nenhum.
Para aqueles que rejubilaram, abriram garrafas de champanhe e deram "urras" e "vivas" ao "grande líder" com os valores apontados pela Pitagórica, é importante relembrar depois pequenos grande pormenores.
Primeiro, o país está a 3 anos de novas legislativas e a volatilidade da intenção de voto é abismal, dependente mais das conjunturas do momento do que qualquer intenção precisa e concreta de voto.
Segundo, é lamentável... ou melhor, profundamente lamentável e enfadonho que um partido como o PSD deixe a liderança  da oposição (mesmo que com maior representatividade eleitoral e número de votos) ao extremismo e ao populismo promovido pelo CHEGA (11,8% a 16,6% das intenções de voto), contribuindo - porque contribuiu, e muito - para que esse partido se afigura como a quarta força política nacional. É deplorável... a cobardia política, a incapacidade e coragem para traçar uma linha vermelha (curiosamente, ao contrário do que o Iniciativa Liberal afirmou, pública e taxativamente), de separar as águas em defesa dos valores e princípios da democracia e de um Estado de Direito.

Coerência e dignidade políticas precisam-se...